setembro 27, 2013
O outro lado da picareta
O desbocado parece merecer todos os castigos possíveis em matéria verbal. Tens a mania que podes falar com o coração? Nesse caso pega lá mais esta pancada nesse sítio onde mais te dói. Ou no orgulho, embora dê menos luta porque, lá está, o desbocado tem sempre uma mania qualquer, um complexo de superioridade ou assim, que o leva a acreditar-se livre para falar demais. E é fácil desequilibrá-lo por aí, com uma rasteira do mesmo veneno, com uma ferroada valente no lombo quando a ocasião se proporciona porque quem fala sem prudência tem (que ter) bom lombo para acolher umas bandarilhas.
Por isso o desbocado é alguém menos explosivo do que o esperado pela maioria dos observadores. Ou já disse ou está para dizer (ou fazer) algo de que tenha que se arrepender depois, talvez no momento em que lhe explodem nos tímpanos e no peito as palavras irreflectidas de outra pessoa a quem, por acaso, até já lançou granadas iguais. Ou ainda piores.
Depois acaba por ter que calar, perde sempre a razão por ir longe demais e no fundo até percebe, ou intui, que as outras pessoas também merecem o seu momento sem travões. Ouve e engole em seco enxovalhos ou simples desconsiderações, enfia a viola no saco e sorri amarelo ou baixa a crista em sinal de deserção de parte de si próprio que entende amordaçar para não se ver de novo em maus lençóis de uma cama que faz a toda a hora para nela o deitarem. Como no cliché da sepultura, a do próprio, que se cava quase sem perceber a natureza do trabalho executado.
É essa a cruz do desbocado. Nunca mete na cabeça que só ladra alto o cão a quem podem dar nozes porque tem dentes para morder. O outro rafeiro, desmotivado pelas coças do passado ou apenas sem solo firme debaixo das patas para defender qualquer argumento ou posição, refém da conjuntura ou da situação, ladra sempre baixinho.
junho 02, 2013
Noutra cela
março 03, 2013
A posta que o futuro imediato é uma desconcertante incógnita
fevereiro 19, 2013
A posta num beco sem saída
outubro 11, 2012
A posta no Wikileaks pay per view
setembro 15, 2012
A posta na prudência de activista de sofá
maio 01, 2012
É que os sindicatos não fazem desconto em cartão...
março 06, 2012
A posta que o que faz falta é acordar a malta
fevereiro 12, 2012
A posta que eu acho (em tons laranja e laivos rosados)
julho 04, 2011
A posta muda para melhor
A maior ameaça para a coerência, essa aparente bitola da idoneidade e até da inteligência de uma pessoa, é a passagem do tempo.
Claro que podemos equacionar um cenário de absoluta imobilidade e ausência de comunicação por parte de alguém maníaco da coerência, quem não tem a sua (a mania)? Mas aí temos a coerência tão posta em causa, filosoficamente se quiserem, pela incoerência óbvia entre a humanidade de quem liga a essas coisas e a postura inerte de um vegetal, como pelos efeitos da dinâmica de qualquer existência sobre as melhores intenções e as mais firmes convicções de que sejamos capazes.
A coerência é um ideal utópico, como qualquer outro dos que abraçamos para podermos manter viva a luta pelo absurdo a que chamamos perfeição.
É uma cenoura como outra qualquer para nos obrigar a combater a preguiça mental, bute lá ser coerentes para alguma coisa nesta vida feita de incógnitas e de imprevistos fazer sentido.
E a malta entretém-se assim, nem que seja a debater a incoerência dos outros para reforçarmos a fé na que julgamos dominar mesmo quando os factos nos obrigam a inventar desculpas para as falhas inevitáveis.
Ah e tal, virei à esquerda quando devia ter virado à direita mas foi só para não atropelar a velhinha que ia atravessar na passadeira. A incoerência esbate-se assim na obrigação de arrepiar caminho por força das circunstâncias, mesmo que a tal velhinha estivesse apenas a espreitar a montra do outro lado da rua e sem qualquer intenção de atravessá-la.
São as nossas decisões tomadas em função das conjunturas que muitas vezes nos obrigam a reconhecer (nem que seja pela crueldade de todos os outros a identificá-la) a incoerência que nos faz sentir tão desorientados por constituir um dos pilares da nossa estrutura de funcionamento básico. Digamos que se fossemos um barco à deriva a coerência funcionaria como uma espécie de farol à vela e com um GPS programado para estar sempre à nossa vista mas sem que alguma vez o pudéssemos alcançar.
A tal cenoura que referi acima...
Não julguem que não tenho a noção de que estando desse lado que é o vosso, a ler os dislates de um marmanjo qualquer que nesta ocasião sou eu mesmo, pensaria de imediato: olha o cabrãozinho a tentar dar a volta à coisa a ver se passa despercebido nas toneladas de incoerências que este mesmo blogue regista...
É essa a nossa reacção instintiva contra qualquer ameaça à coerência pela qual tanto pugnamos e nos permite, por exemplo, apanhar os intrujas com a boca da mentira na botija da estupidez. Sim, a coerência é valiosa também como mecanismo de defesa contra a incoerência que possa trair quem nos queira ludibriar. E por isso, há que defendê-la a todo o custo mesmo que isso possa revelar-se incoerente relativamente à nossa firme disposição de confiar no próximo e assim.
Lá está, a legítima defesa sobrepõe-se à coerência como aliás qualquer pretexto o consegue tendo em conta a tal necessidade imperiosa, visceral, de garantirmos a tal luz que nos guia ao fundo de um túnel sem paredes que atravessamos quase às escuras numa existência minada por pontos de interrogação que, de resto, são outra ameaça letal para a coerência.
Se ninguém perguntar nunca corremos o risco de responder errado, da forma incoerente que, como todos sabemos, é meio caminho para a pessoa, mais depressa do que o coxo, ser apanhada a (des)mentir.