Olá,
Espero que esta carta te encontre de boa saúde, aí pela capital. Nós por cá vamos indo, se não precisarmos de recorrer às urgências.
De vez em quando vejo-te na televisão, mas é claro que tu não me vês. Ser visto e não ver é um efeito do poder. Olha, isto podia até ser um provérbio popular.
O que me leva a escrever-te é que preciso de desabafar: houve agora a mudança de hora de Verão e faz-me sempre confusão. Com estas mudanças, durante os primeiros dias, no Inverno dá-me fome quando ainda não é hora de comer. No Verão, ao contrário, tenho que comer quando não tenho ainda fome. Os meus sonos ficam todos trocados. O mesmo acontece com os relógios: usamos tantos que há sempre algum que escapa, com as confusões que isso gera. Faz-me confusão, no Verão, ser de dia às tantas da... noite. Felizmente as minhas filhas – estão lindas, havias de as ver – já não são pequenitas. Mas quando eram bebés, tantas vezes desesperámos porque não entendiam que alterássemos os horários para a mãe lhes dar peito, para dormir, para mudar a fralda...
Ontem à noite foi o tema de conversa no café Pielas. A Mariazinha, que já é advogada, disse que tem de ser, porque a Directiva comunitária 2000/84/EC estabelece esse regime para todos os países da União Europeia. O Dadinho, que lê muitos jornais, explicou que a mudança de hora é para as empresas industriais pouparem energia, para ajustar as horas de ponta do consumo energético para iluminação aos períodos em que haja sol e para uniformização de procedimentos. Ninguém entendeu...
O doutor Salgueiro disse que o sono e o repouso são fundamentais para a saúde. E que as mudanças de horas provocam perturbações no ritmo biológico das pessoas. Concordámos todos com o Chico Padeiro: o que dizem que se ganha em poupança perde-se em produtividade. O Betes queixou-se logo que não eram só as pessoas: os animais também não entendem mudanças de horários de ordenha. Claro que há sempre quem brinque: o Alex Lampião acabava com a hora de Verão... "mas mantinha a de Inverno, que sempre durmo mais uma hora". O Diogo Nal defendeu que merecíamos um louvor, "porque num país em que ninguém cumpre horários isto da mudança de hora até devia passar despercebido."
O Zé Papas, que está a estudar em Coimbra e veio passar as férias da Páscoa, disse que foi Benjamin Franklin que começou tudo isto, quando em 1784 escreveu um artigo humorístico para o «Journal de Paris», em que criticava os parisienses por se deitarem tarde e não acordarem antes do meio dia. Sugeria que a vida começasse uma hora mais cedo, calculando uma poupança anual de 29 mil toneladas de cera de vela.
Como disse ontem lá no café o Jorge Orca, "interessa que o ser humano seja capaz de sentir o pulsar da Terra e, com ela, das estações do ano". Não achas que devia ser mesmo assim?
Bem hajas – por aqui, felizmente, ninguém agradece obrigado – pelo tempo que dispensaste a ler esta carta.
Manda cumprimentos meus a toda a malta que aí por Lisboa trata de nós com tanto esmero e carinho. É uma injustiça, o que se fala mal aqui pelos cafés a vosso respeito.
E recebe um abraço forte deste que te estima e se assina
Espero que esta carta te encontre de boa saúde, aí pela capital. Nós por cá vamos indo, se não precisarmos de recorrer às urgências.
De vez em quando vejo-te na televisão, mas é claro que tu não me vês. Ser visto e não ver é um efeito do poder. Olha, isto podia até ser um provérbio popular.
O que me leva a escrever-te é que preciso de desabafar: houve agora a mudança de hora de Verão e faz-me sempre confusão. Com estas mudanças, durante os primeiros dias, no Inverno dá-me fome quando ainda não é hora de comer. No Verão, ao contrário, tenho que comer quando não tenho ainda fome. Os meus sonos ficam todos trocados. O mesmo acontece com os relógios: usamos tantos que há sempre algum que escapa, com as confusões que isso gera. Faz-me confusão, no Verão, ser de dia às tantas da... noite. Felizmente as minhas filhas – estão lindas, havias de as ver – já não são pequenitas. Mas quando eram bebés, tantas vezes desesperámos porque não entendiam que alterássemos os horários para a mãe lhes dar peito, para dormir, para mudar a fralda...
Ontem à noite foi o tema de conversa no café Pielas. A Mariazinha, que já é advogada, disse que tem de ser, porque a Directiva comunitária 2000/84/EC estabelece esse regime para todos os países da União Europeia. O Dadinho, que lê muitos jornais, explicou que a mudança de hora é para as empresas industriais pouparem energia, para ajustar as horas de ponta do consumo energético para iluminação aos períodos em que haja sol e para uniformização de procedimentos. Ninguém entendeu...
O doutor Salgueiro disse que o sono e o repouso são fundamentais para a saúde. E que as mudanças de horas provocam perturbações no ritmo biológico das pessoas. Concordámos todos com o Chico Padeiro: o que dizem que se ganha em poupança perde-se em produtividade. O Betes queixou-se logo que não eram só as pessoas: os animais também não entendem mudanças de horários de ordenha. Claro que há sempre quem brinque: o Alex Lampião acabava com a hora de Verão... "mas mantinha a de Inverno, que sempre durmo mais uma hora". O Diogo Nal defendeu que merecíamos um louvor, "porque num país em que ninguém cumpre horários isto da mudança de hora até devia passar despercebido."
O Zé Papas, que está a estudar em Coimbra e veio passar as férias da Páscoa, disse que foi Benjamin Franklin que começou tudo isto, quando em 1784 escreveu um artigo humorístico para o «Journal de Paris», em que criticava os parisienses por se deitarem tarde e não acordarem antes do meio dia. Sugeria que a vida começasse uma hora mais cedo, calculando uma poupança anual de 29 mil toneladas de cera de vela.
Como disse ontem lá no café o Jorge Orca, "interessa que o ser humano seja capaz de sentir o pulsar da Terra e, com ela, das estações do ano". Não achas que devia ser mesmo assim?
Bem hajas – por aqui, felizmente, ninguém agradece obrigado – pelo tempo que dispensaste a ler esta carta.
Manda cumprimentos meus a toda a malta que aí por Lisboa trata de nós com tanto esmero e carinho. É uma injustiça, o que se fala mal aqui pelos cafés a vosso respeito.
E recebe um abraço forte deste que te estima e se assina
Paulo Proença de Moura
jpcpmoura@gmail.comnatural de Caria, de trás da serra da Estrela,
é autor do livro «Persuacção – o que não se aprende nos
cursos de gestão», das Edições Sílabo
A última página da revistajpcpmoura@gmail.comnatural de Caria, de trás da serra da Estrela,
é autor do livro «Persuacção – o que não se aprende nos
cursos de gestão», das Edições Sílabo
Este artigo
Página on-line da revista «Perspectiva»
Gostei de ler a tua carta/artigo.
ResponderEliminarNormalmente não compro o Público,mas à sexta-feira vou passar a comprar.
Foi a Clarinha que me cedeu o desta sexta, mas não tinha a revista.
Um abraço extensivo ao Pedro Laranjeira.
Fazes bem em comprar o jornal, mas olha que a Perspectiva é mensal (com o Público da última sexta-feira de cada mês).
ResponderEliminarNascer uma nova revista que nos acene com um quotidiano feito de sangue, suor e lágrimas, mas de sorrisos , alegrias e venturas, também, é um desafio que colhe sempre o meu aplauso.
ResponderEliminarAinda para mais este com vérios nomes conhecidos envolvidos.
Basta de frioleiras, mais ou menos foleiras, com que se inundam as bancas dos jornais. Há mais vida para além dos interesses de cama e mesa de meia dúzia de siliconados da nossa praça.
Felicidades para a revista, pois.
E, a ti, reitero o agradecimento pela oportunidade de ter participado no seu primeiro número pela tua mão atenta.
Um abraço.
Mas olha que esteve lá a Rita Egídio...
ResponderEliminarNão a viste do ângulo da foto que o Pedro Laranjeira distribuiu e que o Paulo Moura publicou no post em baixo?