julho 22, 2014

«Zink, impotência sexual, má língua, SNS e sexismo anti macho velho» - Jaime Ramos

No passado sábado, na SIC, foi recordado o programa "Má Língua", com uma edição especial.
Com muita ironia, Rui Zink admitiu a impotência recordando a forma carinhosa como a mulher o consolou: também acontece com os outros...
Recordei-me de, há décadas, uma Senhora célebre me ter surpreendido com a frase: não há mulheres frígidas, há é "má língua"... Não se referia à da SIC.
O que é que isto tem a ver com sexismo anti macho velho?
O SNS, Serviço Nacional de Saúde, comparticipa medicação destinada a corrigir os sintomas, o "sofrimento" e as incapacidades que a menopausa origina nas mulheres.
Os "calores", os "rubores", a "secura", a "atrofia" e o envelhecimento vaginal são tratados com medicamentos comparticipados pelo SNS. As mulheres sabem que o SNS se preocupa com a sua vida sexual... A pílula é mesmo gratuita nos centros de saúde durante a vida fértil das mulheres...
O SNS investe parte do seu orçamento para garantir que a "serventia" das mulheres esteja disponível, sem risco e em bom estado, para os homens.
Mas não para todos os homens...
A andropausa vai fazendo vítimas, dificultando desempenhos e causando impotências. O "envelhecimento" sexual dos homens foi uma inevitabilidade que a industria farmacêutica enfrentou com algum sucesso.
Hoje há diversos "viagras" capazes de transformar um sénior num jovem cheio de vigor.
Só que são caros. Alguns destes medicamentos são mesmo muito caros, exigindo um orçamento mensal/anual que não é acessível a homens "pobres".
Estes medicamentos salvadores do acesso dos velhos (ou dos doentes cujas mazelas e terapêuticas originam impotência) ao prazer não são comparticipados pelo SNS. Quem quiser sexo que o pague, diz o SNS aos homens...
Esta desigualdade de tratamento dos dois sexos, promovida pelo SNS, é muito curiosa...
Os homens com rendimentos médios ou altos podem comprar os comprimidos milagrosos que lhe dão o acesso à eterna juventude... Se sempre puderam gastar dinheiro em prostituição e pecar, por que deve o Estado comparticipar no seu bem estar sexual quando somam mais décadas de vida...?
E os homens de baixo rendimento, com pensões reduzidas, desempregados...? Quem se preocupa com o prazer destes machos velhos com menores recursos?
E as suas mulheres, também elas condenadas a coabitar com seniores incapacitados, perguntar-me-ão, não têm direito ao prazer sexual?
Pois é, dizem os responsáveis pelo SNS: em sociedades injustas, aos desfavorecidos pela má sorte, só resta mesmo a língua, a má língua!

Jaime Ramos

A história do banco do meu avô

Acabadinha de receber, sem autoria... Eu sei que este texto é comprido até dizer chega e peço mil desculpas à vossa paciência. Mas é de leitura leve e esclarecedora. Outra vez serviço público, claro...

Vamos IMAGINAR coisas…
Vamos imaginar que o meu avô tinha criado um Banco num País retrógrado, a viver debaixo de um regime ditatorial.
Depois, ocorreu uma revolução.
Foi nomeado um Primeiro-Ministro que, apesar de ser comunista, era filho do dono de uma casa de câmbios.
Por esta razão, o dito Primeiro-Ministro demorou muito tempo a decidir a nacionalização da Banca (e, como tal, do Banco do meu avô.
Durante esse período, que mediou entre a revolução e a nacionalização, a minha família, tal como outras semelhantes, conseguiu retirar uma grande fortuna para a América do Sul (e saímos todos livremente do País, apesar do envolvimento directo no regime ditatorial).

Continuemos a IMAGINAR coisas…
Após um período de normal conturbação revolucionária, o País entrou num regime democrático estável.
Para acalmar os instintos revolucionários do povo, os políticos, em vez de tentarem explicar a realidade às pessoas, preferiram ser eleitoralistas e “torrar dinheiro”.
Assim, endividaram o País até entrar em banca-rota, por duas vezes (na década de 80.
Nessa altura, perante uma enorme dívida pública, os políticos resolveram privatizar uma parte significativa do património que tinha sido nacionalizado.
Entre este, estava o Banco do meu avô.

E, continuando a IMAGINAR coisas…
A minha família tinha investido o dinheiro que tinha tirado de Portugal em propriedades na América do Sul. Como não acreditávamos nada em Portugal, nenhum de nós quis vender qualquer das propriedades ou empatar qualquer das poupanças da família.
Mas, queríamos recomprar o Banco do meu avô.
Então, viemos a Portugal e prometemos aos políticos que estavam no poder e na oposição, que os iríamos recompensar (dinheiro, ofertas, empregos, etc…) por muitos anos, se eles nos vendessem o Banco do meu avô muito barato.
Assim, conseguimos que eles fizessem um preço de (vamos imaginar uma quantia fácil para fazer contas) 100 milhões, para um Banco que valia 150.
Como não queríamos empatar o “nosso” dinheiro, pedimos (vamos imaginar uma quantia) 100 milhões emprestados aos nossos amigos franceses que já tinham ganho muito dinheiro com o meu avô.
Com os 100 milhões emprestados comprámos o Banco (o nosso dinheiro, que tínhamos retirado de Portugal, esse ficou sempre guardado). E assim ficámos donos do Banco do meu avô.
Mas tínhamos uma dívida enorme: os tais 100 milhões.
Como os franceses sabiam que o Banco valia 150, compraram 25% do Banco por 30 milhões (que valiam 37,5 milhões) e nós ficámos só a dever 70 milhões (100-30=70).
Mesmo assim era uma enorme dívida.

Continuemos a IMAGINAR coisas…
Tal como combinado, viemos para Portugal e começámos a cumprir o que tínhamos prometido aos políticos (dinheiro para as campanhas eleitorais, ofertas de vária espécie, convites para todo o tipo de eventos, empregos para os familiares e para os próprios nos momentos em que estavam na oposição, etc…)
Como ainda tínhamos uma grande dívida, resolvemos fazer crescer mais o Banco do meu avô.
Assim, fomos falar com uma nova geração de políticos e prometemos todo o tipo de apoios (dinheiro, ofertas, empregos, etc…) se nos dessem os grandes negócios do Estado.
E eles assim fizeram.
E o Banco do meu avô, que tinha sido vendido por 100, quando valia 150, valia agora 200 (por passarem por ele os grandes negócios do Estado).
Mas, mesmo assim, nós ainda devíamos 70 milhões (e tínhamos de pagar, pelo menos uma parte dessa dívida, caso contrário, os franceses ficavam com o Banco do meu avô).

E, continuando a IMAGINAR coisas…
O meu tio, que era presidente do Banco do meu avô, reformou-se.
Nessa altura a família estava preparada para nomear um dos meus primos para presidente.
Eu queria ser presidente e prometi à família toda um futuro perpétuo de prosperidade se me nomeassem a mim como presidente.
E assim foi.
Fui, finalmente, nomeado presidente do Banco do meu avô.
Mas era preciso pagar uma parte da dívida aos franceses.
Podíamos vender uma parte do Banco em Bolsa, mas deixávamos de mandar (logo agora que eu era presidente – não podia ser assim). Então desenhei um plano:
Criei uma empresa, chamada “Grupo do meu avô” (em que a minha família tinha 100% do capital) e passei os nossos 75% do Banco (25% eram dos franceses) para essa nova empresa.
Assim, a família era dona de 100% do “Grupo” que era dono de 75% do Banco.
Falei com os franceses e combinei mudarmos os estatutos do Banco: quem tivesse 25% mandava no Banco (e os franceses não se metiam, a não ser para decidir os dividendos que queriam receber).
Assim, como o Banco agora valia 200, vendemos 50% na Bolsa por 100 (metade dos 200).
Com 50 capitalizámos o Banco.
Os restantes 50 tirámos para nós (37,5 para a família e 12,5 para os franceses).
Demos também os nossos 37,5 aos franceses e assim ficámos só a dever 32,5 milhões (70-37,5).
Ainda era uma grande dívida, mas continuávamos a mandar no Banco do meu avô (apesar da nossa empresa “Grupo do meu avô” só ser dona de 25% - os franceses tinham outros 25% e os restantes 50% estavam dispersos por muitos acionistas).
Ainda tínhamos uma enorme dívida de 32,5 milhões.
Mas, a verdade é que continuávamos a mandar no Banco do meu avô e tínhamos transformado uma dívida inicial de 100 em outra de 32,5 (sem termos gasto um tostão da família – o nosso dinheiro continua, ainda hoje, guardado na América do Sul).
Convenci-me, nessa altura, que era um génio da finança!

Continuemos a IMAGINAR coisas…
A certa altura, o crédito tornou-se uma coisa muito barata.
Eu sabia que tínhamos um limite original de 100 milhões e já só devíamos 32,5 milhões.
Assim, a empresa “Grupo do meu avô” voltou a endividar-se: pediu mais 67,5 milhões (voltámos a dever 100 milhões) e desatei a comprar tudo o que fosse possível comprar.
Tornei-me assim, o dono disto tudo (o Banco do meu avô, a Seguradora do meu avô, a Meu avô saúde, a Meu avô hotéis, a Meu avô viagens, a Construtora do meu avô, a Herdade do meu avô onde se brinca aos pobrezinhos, etc…).
Entretanto fui pagando as minhas promessas aos políticos (dinheiro para as campanhas eleitorais, ofertas de vária espécie, convites para todo o tipo de eventos, empregos para os momentos em que estavam na oposição, etc…).

E, continuando a IMAGINAR coisas…
Mas havia agora uma nova geração de políticos.
Fui falar com eles e garanti que os apoiaria para o resto da vida (dinheiro, ofertas, empregos, etc…) se eles continuassem a fazer passar os grandes negócios do Estado pelo Banco do meu avô.
Mas, tive azar: houve uma crise financeira internacional.
Deixou de haver crédito.
Os juros subiram.
Os credores queriam que o Grupo do meu avô pagasse a dívida.
E, além disso tudo, deixou de haver os grandes negócios do Estado.
Mas eu, que me achava um génio da finança e que já estava habituado a ser o dono disto tudo, não queria perder a minha posição de presidente do Banco do meu avô.
Tinha de arranjar uma solução.
Fui à procura, e encontrei em África, quem tinha dinheiro sujo e não se importava de investir e deixar-me continuar a mandar e a ser dono disto tudo.

Continuemos a IMAGINAR coisas…
Resolvi então criar uma nova empresa: a “Rio do meu Avô” que passou a ser dona de 100% do capital da “Grupo do meu avô”, que era dona de 25% do “Banco do meu avô”.
E eu que era dono disto tudo passei a ser o presidente disto tudo.
Fiz uns estatutos para o “Grupo do meu avô” que diziam que quem tivesse 25% mandava na empresa.
Vendi 20% aos Angolanos e 55% na Bolsa.
A “Rio do meu avô” ficou assim dona de 25% do “Grupo do meu avô” (mas mandava como se tivesse 100%).
A “Grupo do meu avô”, dona de 25% do “Banco do meu avô” (mandava como se tivesse 100%).
Assim, a minha família já só tinha 5% (25% de 25%) do “Banco do meu avô” (mas eu continuava a mandar como se tivéssemos 100%).
Já não havia dúvidas: eu era mesmo um génio da finança.
Com os 75 milhões da venda do “Grupo do meu avô” (aos Angolanos e na Bolsa), paguei uma parte da dívida.
Mas, na verdade, ainda tínhamos uma dívida de 25 milhões (e continuávamos a não querer mexer no nosso dinheiro – esse continua bem guardado na América do Sul).

E, continuando a IMAGINAR coisas…
Mas as coisas continuaram a correr mal. Se calhar eu não sou assim tão grande génio da finança.
Todos os nossos negócios dão prejuízo (até mesmo o Banco do meu avô).
Raio de azar.
Ainda por cima, a crise não acaba.
Fiz então o meu último golpe de génio.
Convenci todos os bons clientes a comprarem ações do Banco do meu avô, para aumentar o capital sem ter de endividar mais a “Rio do meu avô” (e sem ter de tocar no dinheirinho da família, que continua bem guardado na América do Sul).
Mas os franceses queriam o dinheiro deles.
Então, como presidente do Banco do meu avô, emprestei dinheiro deste ao Grupo do meu avô e à Rio do meu avô.
Assim pagámos aos franceses.
Mas ficámos com um problema: o Banco do meu avô está completamente arruinado.
Tinha de arranjar uma solução!
Fui falar com os novos políticos com uma proposta: reformo-me, dou lugares de Administração a uma série de políticos do partido do Governo e eles que resolvam o problema do Banco do meu avô.

Continuemos a IMAGINAR coisas…
Os políticos aceitaram a minha proposta (aceitam sempre que se fala de lugares de Administração).
Finalmente, reformei-me.
Ainda somos donos de 5% do Banco do meu avô e de uma série de outros negócios (sustentados pelas dívidas ao Banco do meu avô).
Tudo isto sem termos gasto um tostão (o dinheiro da família continua todo guardado na América do Sul).
E, tomei a última medida antes de me reformar: atribuí a mim próprio uma reforma de um milhão de euros por ano (para as despesas correntes).
E, assim, acabou a história IMAGINADA do Banco do meu avô.

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Se alguém teve a paciência de ler este texto até ao fim, deixo uma pergunta: Se esta história em vez de ser IMAGINADA, fosse verdadeira, que fariam ao neto?

julho 21, 2014

ESTE PAÍS NÃO É PARA INGÉNUOS

Com aviso de 5 dias (mas apenas 3 dias úteis), são marcadas as provas de avaliação de professores que não puderam ser feitas na primeira leva, a 18 de dezembro. O diploma rege que a marcação deverá ser feita com 20 dias de antecedência e, até 5 dias antes, os professores são notificados do local onde prestarão provas. Pois bem, nada disso se cumpriu. Ao não respeitar estes prazos, o MEC inviabilizou a possibilidade de convocação de greves. Apareceu depois um SecEst com ar muito ingénuo a desmentir que a redução do prazo não tinha nada a ver com a sonegação do direito à greve. Então, os sindicatos (FENPROF) reorganizam uma forma de boicote: plenários sindicais para a manhã de amanhã. Ninguém é ingénuo e todos sabemos que o objetivo é boicotar a realização (vigilância) da prova. Os sindicatos também não tentaram sequer parecer ingénuos: assumiram que seria uma forma de boicote. Vem depois a disposição do MEC de impedir a realização das reuniões da parte da manhã. Caiu a máscara da ingenuidade e os tiques de ditador vieram à tona. Parece uma alimária de cabresto a quem a ingenuidade disse adeus se foi para outras praias onde a democracia floresce. Não podemos consentir que maquiavelicamente se mexam nos direitos para se entortarem ao serviço do despotismo nada iluminado e ignorante. Freud dizia que o Homem é dono do que cala e escravo do que fala, mas ele tinha um complexo; eu digo que se calarmos e não falarmos, seremos em breve escravos do e pelo silêncio. Hoje eles; amanhã nós. Definitivamente, este país não é para ingénuos!

julho 18, 2014

SERRANO





A terra esventrou-se e dela saiu o homem da serra. A mesma pedra que é chão também é teto, parede e contraforte. A terra é mãe-madrasta, mas ensina a amar o pouco que dá. Só vergastando ela chora um pouco do sustento que à míngua o filho lhe pede. E assim dançam por largos anos até que, num dia marcado no calendário do filho, outros abrem uma cova e nela o depositam. Incestuosamente ele desce até lá e, com aviso, vai fecundá-la, fechando o ciclo do filho e perpetuando os ciclos da mãe. Este é o fado do homem filho da serra.


julho 17, 2014

O acordo plural – serviço público

É nisto que dá o facto – temível! – de grande parte da nossa abordagem à cultura ocorrer através da televisão, com ou sem cabo, quando, tantas e tantas vezes, o único cabo de que aqui se poderá falar é o cabo de esquadra…

Já agora e para quem não saiba, esta expressão «de cabo de esquadra» provém de um tempo, não muito remoto, em que o cabo de qualquer esquadra, como o elemento menos graduado que era, não primar pelos seus conhecimentos académicos; saber ler e escrever lhe bastava para o desempenho da função, pelo que a expressão, que ainda hoje muito se utiliza, provenha também dos disparates proferidos por quem, tendo autoridade, não tinha, entretanto, sapiência em adequada conformidade, fenómeno que, aliás, volta a registar-se com profusão.

Isto tudo porque não há reunião de amigos, profissional ou outra, programa de rádio ou de televisão onde, proferido até por gente de onde tanto abismo não se esperaria, o termo «acordo» no seu plural não seja pronunciado «acórdos»… No mínimo, pressente-se alguma hesitação, um ah-ah-ah… constrangido, mas lá se soltam os «acórdos», expelidos sem apelo mas muito agravo, permanecendo no ar um certo cheiro a enxofre e a animal morto.

Por mim, um pouco cioso e zeloso destas coisas ligadas à nossa querida Língua Portuguesa, encetei de há longos anos uma campanha em favor dos acordos, mas com a sua identidade própria, isto é, pronunciados «acôrdos». É pois nesta cruzada que volto à baila, respigando como auxiliares, mais duas dicas que apurei na net. Vejam lá:

Instituto Superior de Educação http://linguamodadoisec.blogspot.pt/2010/08/qual-o-plural-de-acordo-acordos-ou.html:
30 Agosto 2010
Qual o plural de acordo? Ac[ô]rdos ou Ac[ó]rdos?
O plural de acordo é ac[ô]rdos – com ô fechado.
E porquê?
Porque esta é uma palavra formada por derivação regressiva a partir do verbo acordar, cuja vogal o se pronuncia /u/.
Quando se formou a palavra acordo (já no século XIV), o som da vogal o passou a /ô/, por ter a vogal passado a pertencer à sílaba tónica. No plural, naturalmente, a vogal mantém-se fechada (/ô/): ac[ô]rdos.
A regra mantém-se, por conseguinte, para outras palavras: a vogal o da sílaba tónica das palavras terminadas em o formadas por derivação regressiva de outras cujo radical tinha esse som fechado pronuncia-se /ô/ e, como regra geral, mantém essa pronúncia no plural: adorno, adornos (de adornar), consolo, consolos (de consolar), encosto, encostos (de encostar), acordo, acordos (de acordar)!

Também no Ciberdúvidas da Língua Portuguesa (http://ciberduvidas.pt/pergunta.php?id=777)pode ler-se e confirmar-se:

/Acôrdo/, /acôrdos/
[Pergunta] Somos frequentemente confrontados, sobretudo nos noticiários televisivos e radiofónicos, com diferentes pronúncias do plural das palavras acordo (acôrdos; acórdos) e molho (môlhos; mólhos). Qual a «opção» correcta?
Paulo Luís de Castro :: :: Portugal
[Resposta] O plural de acordo (côr) é acordos (côr).
Em molho, temos duas palavras:
a) Molho (/môlhu/) a significar aquele líquido que se põe nas iguarias para lhes dar determinado sabor. O plural é /môlhos/.
b) Molho (mó) significando braçado, paveia: um molho de palha. O plural é /mólhos/.
José Neves Henriques :: 01/05/1997

Claro que ninguém pronuncia (ainda) «consólos» ou «encóstos» ou «adórnos», assim a modos como quem pronuncia «córnos»… mas, por razões que a razão e o saber desconhecem, o que há mais é opinadores a proferirem desbocadamente os malfadados «acórdos».

Se calhar, é por isso que a grande maioria dos «acórdos» não passa de letra morta…

julho 15, 2014

O BES e a táctica de Deu-la-Deu Martins


Recentemente encetaram os Bancos o processo de reembolso ao Estado relativo ao empréstimo de emergência que  para esse efeito tinha sido colocado à sua disposição.
No essencial o processo consistiu no adiantar de umas volumosas quantias para que estes não ultrapassassem - como se disse - uma determinada margem de segurança. Note-se, no entanto, que durante vários anos e sucessivamente, os Bancos tinham sido sujeitos aos chamados "testes de stresse", os quais tiveram como resultado o revelar de situações na região do confortável, capazes que estariam, ao que transparecia, de aguentar os embates resultantes da crise, facto que não obstou a que a Banca aproveitasse o balão de oxigénio subitamente disponibilizado.
Podemos especular se os testes são dignos de algum crédito e os Bancos apenas aproveitaram para uma melhoria dos seus rácios, ou se os testes são uma treta e anda tudo com o credo na boca e  a varrer o lixo para debaixo do tapete, enquanto os fatos impecavelmente engomados escondem  camisas cheias de buracos, vazias portanto de tecido, com a excepção convenientemente visível dos punhos e colarinhos.
Da tragédia do sistema Bancário sacudido para cima dos contribuintes no caso BPN e afins, e aflições de Banifs, a servir de aviso aos outros que recorreram ao empréstimo, sobressaiu como referência de estabilidade o BES. O BES não precisou do dinheiro. O BES estava acima da crise.
Sobe agora ao cimo a verdade do azeite.  A máquina financeira da qual o BES faz de fachada  limpa enquanto nas traseiras o negócio anda a trabalhar com a lama (eufemismo) pelo pescoço, está falida.
Não há outro nome, está FALIDA.

A táctica do BES, a da simulação da fartura, faz lembrar a de Deu-la-Deu Martins, a heroína de Monção, que sitiada pelos Espanhóis e, já quase sem farinha, decidiu fazer com ela uma última fornada de pão que atirou aos sitiantes, estes também a braços com a mesma crise de escassez de alimentos. Este acto fez com que os Espanhóis julgassem que Monção tinha vastas provisões, não valendo a pena arrastar penosamente o cerco e assim levantaram os acampamentos e retiraram-se, pondo fim ao longo estado de sítio...
Se História, se súmula de metáforas,  o BES ter-se-á certamente inspirado nela. Andando com  a mesma, ou se calhar ainda maior falta de provisões, recusou a ajuda, transmitindo assim provisoriamente uma imagem de liquidez e vantagem competitiva para o mercado financeiro, enquanto esperava que a inversão da crise o pusesse de novo os negócios no bom caminho. No entanto, e diferentemente do cerco a Monção, os sitiantes não arredaram, a crise não se foi embora, e a fome fez os ratos a pouco e pouco abandonar os armazéns até à debandada que subitamente emergiu com o caso de Angola.
Percebe-se agora muito melhor a razão principal pela qual o BES teria recusado a ajuda: as ajudas  aos outros Bancos foram precedidas de auditorias e acompanhamentos que relativamente ao grupo BES de imediato teriam fazer soar os alarmes dos técnicos
Podemos argumentar que o BES não tem nada a ver com as outras empresas do grupo, mas o argumento tão fraquinho tem o  mesmo teor de ingenuidade do devedor tranquilo que tendo um fato com quatro bolsos, não paga as contas A, B. e C,  porque os bolsos A, B, e C dessas contas estão vazios enquanto o bolso D, onde guarda as receitas está bem muito obrigado!
O sistema é o dos vasos comunicantes, os bolsos são do mesmo fato, e o fato do mesmo dono. O bolso dos trocos não dá para pagar as contas dos outros bolsos, e por mais voltas que se dê ao assunto, uma urgente injecção de capital está  provavelmente a ser equacionada para muito breve. Para evitar outro BPN, ou se calhar já o temos para a gente pagar. Mas a farinha, meu Deus! Deu-la-Deu, e agora só se fizermos pãezinhos de bosta, senhores, Pãezinhos de bosta, uma questão de Prudência, que a pouca farinha que resta, é como diz o outro, para mim...

julho 02, 2014

"Desculpe, esta é a fila para o Panteão?"

Há há uns meses atrás. escrevi algumas linhas sobre este assunto. Hoje, dia em que se trasladam os restos mortais de Sophia de Mello Bryner para o Panteão Nacional ficaram a saber-se muitas coisas que nos estranham. O Panteão já só dispõe de mais uma vaga e parece que já tem dono, pelo menos o parlamento já assim decidiu. E agora, o que fazer a tantos outros eméritos e egrégios seres que no passado, no presente ou no futuro "por obras valerosas se vão da lei da morte libertando"?
Em primeiro lugar, a ignorância política assusta e ninguém se lembra de que Panteão é onde o homem quiser. A Igreja de Santa Cruz de Coimbra, o Mosteiro da Batalha, o Mosteiro dos Jerónimos e outros monumentos acumulam funções e são também Panteões Nacionais. Por isso, não venham falar de falta de vagas, porque isto não é um concurso de professores!
Será diferente se pensarmos que talvez se esteja a vulgarizar esta homenagem e se tenha baixado a fasquia daquilo que se considera teito notável para o país e para a humanidade. Amália está porque foi o expoente máximo de uma forma musical de folclore urbano lisboeta chamado fado? Se calhar não merecia. Como diz Carlos do Carmo, 50% dos portugueses não gosta, não ouve fado, 30% tolera-o e 20% adora-o. É em nome desses que Amália repousa no templo memorável?
Eu sei que já não se deve devolver à sepultura simples quem já se encontra lá, mas não se pode decidir a quente atribuir tão distinta homenagem. Com Sophia o tempo foi bom conselheiro e sem dúvida que merece. Mas com ela, e acima dela, talvez esteja um Aristides de Sousa Mendes, cuja "obra valerosa" libertou milhares da lei da morte física, aniquilando-se a si próprio e tornando-se miserável aos olhos do poder salazarista. Parece, pois, curial pensarmos que a vaga seria sua; só que os políticos da pelota, os parlamentares do fora de jogo moral já reservaram o lugar para outro, figura importante, mas não enquadrada nos ditames de tal homenagem.
Por esta razão, o diálogo possível e imaginável é simples:
_ Desculpe, Aristides, esta é a fila para o Panteão Nacional?
_ É sim, Eusébio!
_ Então deixe passar à frente, que tenho lugar reservado.