junho 29, 2011

Em jeito de epitáfio: - Não devia ser para tão pouco que uma mulher pare um filho…

E, de repente, quase voam.
E, de repente, a vida é um sempre-a-abrir.
E, de repente, tudo é elementar e o mundo curva-se à sua passagem.
E, de repente, nem há regras, nem contenções, nem limites.
E, de repente, a altíssima cilindrada de um motor surge como um destino proposto pelos deuses da glória fácil.
E, de repente, a vicissitude.
E, de repente, o imprevisível.
E, de repente, o nada.

No mesmo espaço temporal, uma menina de oito anos, num outro recanto do mundo, é feita explodir, sozinha num meio de rua, por grosseiro erro de cálculo – que seria sempre grosseiro, mesmo sem erro –  de quem lhe rodeou o corpo frágil de bombas cruéis e cegas, a que aquele frágil corpo não poderia estar alguma vez afeiçoado.

E, de repente, o nada.

E fica-me tão só uma espécie de sensação de desperdício. De imenso desperdício… De tão diverso e gratuito desperdício…

junho 22, 2011

«Debtocracy (Dividocracia)» - legendado em português

"Documentário que revela a crise econômico-social pela qual passam os países periféricos da União Europeia, em especial a Grécia. Vemos como as políticas económicas neoliberais impostas pelos agentes financeiros da UE levam à bancarrota os países de sua periferia e os deixam manietados às decisões das grandes corporações financeiras supranacionais. Este documentário expõe a crueldade que move o neoliberalismo em seu afã por ganhar cada vez mais às custas do sacrifício de todos os demais sectores da população. Também deixa claro que, com a decidida mobilização das maiorias populares, o monstruoso aparato financeiro pode ser derrotado."

Parte 1 (45 minutos)


Dividocracia (Debtocracy) - Parte 1 - Legendas... por Josespa

Parte 2 (30 minutos)


Dividocracia (Debtocracy) - Parte 2 - Legendas... por Josespa

Poder ou não poder de compra

Dos jornais de hoje: o Eurostat acaba de informar que cada português obteve um rendimento equivalente a 81% da média dos vinte e sete países europeus (UE).

Atrás de nós apenas a Eslováquia (74%) e a Estónia (65%). Na «liderança» o Luxemburgo, com uns espantosos 283%, ou seja, e se a aritmética mais elementar não me falha muito, aí umas três vezes e meia o nosso poder de compra – pois é disso que se trata – cerca de quatro vezes o da Eslováquia e por aí fora…

Claro que, falando em médias, temos de ter sempre sob apertada atenção a velha história da galinha: eu como uma galinha, tu não comes nenhuma, logo, cada um de nós comeu meia galinha. Este comezinho exemplo para dizer que aqueles 81% portugueses, sendo uma média e sendo Portugal o país da Europa com maior agravamento do fosso de rendimentos, adaptado a nós o exemplo da galinha, deve rondar aí pelas nove galinhas para um e uma galinha a dividir por nove, para termos a média de uma galinha por cabeça, que enforma aqueles 81%…

Passando, então, por cima desta circunstância de menor relevância, parece-me bem andar por aqui a resolução dos problemas e desequilíbrios europeus de curto e médio prazos: durante uns mesitos, os luxemburgueses – por directiva comunitária, claro – só poderiam adquirir produtos de origem portuguesa…

Em princípio, nada a dizer. Estamos a falar da zona euro.  

Sim, porque fazermos apelos à aquisição dos produtos nacionais em Portugal é uma excelente intenção… Mas comprá-los com quê ou como? E, por vezes até, onde? Para revitalizarmos nós a NOSSA Economia através da aquisição dos NOSSOS produtos mas sem dinheiro para o fazer, ou recorremos a financiamento externo – o que é muito mau, como se sabe… - ou não funciona.

Eis pois, o que me parece uma medida altamente solidária, politicamente correctíssima, altamente integradora e até nada proteccionista, se virmos bem.

Depois, já com o equilíbrio das finanças em todo o espaço europeu, partiríamos para o mesmo esquema em direcção a África, por exemplo… e por aí fora, até atingirmos um mundo de paz e harmonia, afectiva, efectiva e eficazmente solidário e equilibradíssimo.

Tudo sempre pago a preços justos e universalmente definidos, claro.

Por vezes, essa coisa monstruosa a que chamam Economia até me parece, afinal, um elementar brinquedo artesanal, como o cavalinho de pau que os meus pais me compravam nas feiras…

junho 21, 2011

Carta de Intenções

...ciclicamente e de forma especial em alturas de crise, surgem homens, sonhadores, utópicos, voluntariosos, loucos, ou antes, avançados demais para o seu tempo...
Este post que escrevi em 2008, talvez se adapte a todos os tempos mas certamente e de forma especial a estes momentos dificeis que atravessamos. Cuidado, peço a todos, cuidado com os Messias...
Carta de Intenções

Faz já um bocado que lá fora, após a passagem duns vultos brancos, as luzes se apagaram e é à luz de um coto de vela que secretamente escrevo estas linhas.
Levantei-me esta manhã com a certeza de ter nas mãos
o passo seguinte, o mais importante talvez, da Humanidade.
Durante anos li, estudei, comparei as evoluções das Sociedades e as suas degenerações.
Interiorizei como tantas vidas, em vez de cumprirem o destino elevado da sua condição humana, se perderam inutilmente em miséria e sofrimento.
Em vez de amor, poesia e uma existência dirigida ao crescimento interior, apenas o seu contrário: a perpetuação da escravidão, corrupção e prepotência, ódios e guerras derivadas dos interesses quase sempre de minorias de que resultou o Homem espartilhado, limitado, prisioneiro entre fronteiras.
As fronteiras... Essas fontes desnecessárias de permanente tensão, quando afinal somos todos homens e mulheres do Mundo que apenas desejam ser felizes e cuja única fronteira natural é o limite da vida em felicidade sempre pronta a ser expandida mais além.
Por isso, reflectindo esta ânsia da Humanidade que tem sido mantida quase subliminar, e bem ponderadas as acções a empreender, tomei a firme decisão de dar este passo.
Sei que durante os primeiros tempos terei de usar a força para impôr tão elevados princípios, e quiçá fazer uso disto que mais detesto: a Guerra! Mas não vejo outro meio de, no espaço curto de uma vida, produzir um resultado tão importante e pelo qual toda a Humanidade aspira desde os seus primórdios.
O fim justifica amplamente os meios!
Arrancarei ainda este ano com as minhas Forças, destruindo fronteiras, derrotando exércitos, e num arraso desta podre Ordem antes instituída, levarei por todo o lado os grandes e generosos ideais que farão o Homem finalmente cumprir o seu destino.
Quando todo o Mundo estiver conquistado, por cima dos maiores monumentos olharei o Sol de frente e sob a minha coroa de Imperador abrirei as mãos num gesto generoso de abnegação do poder e em completa dádiva. Finalmente um coro de milhões de seres, numa fraternidade humana ciente da sua igualdade, elevar-se-á aos céus em hino de alegria e liberdade.
A Humanidade entrará numa nova etapa, as artes florescerão, os amantes serão os novos Senhores da Terra e o sorriso será o rosto de cada ser humano. Finalmente começará a ser escrita a nova e eterna página gloriosa da sua História colectiva.
É esta a minha missão. A missão da minha vida.
Agora vou pousar a caneta, apagar a vela e as sombras dançantes que projecta no corredor e deitar-me, pois amanhã cedo encetarei todo o processo que levará a Felicidade à conquista do Mundo.
Esperem por mim, pois em breve estarei ao vosso lado.
Ah...quase que me esquecia de apresentar-me.
Vosso servidor, sou
de meu nome abaixo assinado:

Napoleão Bonaparte, o Corso...

Charlie

junho 20, 2011

Ena, pá, tanta água em Mangualde…!

Há coisas que se passam em Portugal que, como nos exclamaria o grande guru Marcelo, não lembram ao careca.

E falo de quê? Ora, muito bem, pois falo do complexo balnear marítimo de Mangualde (!?).

Passeio-me interneticamente por essa interessante localidade do interior do país em busca de confirmação de uma notícia alucinada com que deparei em canal televisivo e que me dava conta da existência de um complexo «marítimo» em Mangualde, muito recentemente inaugurado, e qual não é o meu espanto quando deparo, antes de mais, com OUTRA existência de um complexo de piscinas municipais, de recentíssima inauguração - http://www.cmmangualde.pt/index.php?option=com_content&view=article&id=169&Itemid=200 -, também em Mangualde… e quedo-me, pasmo e abismado.

Escarafunchando um pouco nesta realidade, concluo que as tais piscinas municipais, coisa sofisticadíssima e, como o nome indicará, construídas sob a égide da autarquia e, provavelmente com recurso a algumas parcerias privadas tal a dimensão da coisa, de repente tropeçam com a ainda mais recente realidade de um complexo balnear com água salgada (?) - http://www.tvi24.iol.pt/sociedade/mangualde-areia-praia-artificial-agua-salgada-tvi24/1260569-4071.html -, com níveis de sofisticação ainda mais extraordinários… que, obviamente, retirará às primeiras todos os eventuais clientes/utilizadores, pois sofisticação por sofisticação, quanto mais sofisticada melhor. E até parece que o preço de entrada é idêntico…

«Projecto único, em Portugal e na Europa», claro, que para megalomanias idiotas destas estamos cá nós…

Para além de uma imensa quantidade de especulações que podemos erigir sobre a necessidade/conveniência/utilidade de uma praia artificial marítima (!) em Mangualde, cujos habitantes hão-de ter – benza-os e bafeje-os qualquer deus das coisas pequenas – o conhecido direito universal à existência e usufruto de praias em qualquer recôndita parte do mundo, ainda para mais marítimas, Tibete incluído, uma dúvida temível me sobressalta:

- e, agora, as piscinas municipais vão servir para quê? Talvez para viveiro de batráquios, cobras de água e quejanda fauna e flora fluviais, pois que não estou a ver quem lá haverá de pôr o distinto e mangualdense traseiro de molho, perante uma oferta, ali à mão de semear, que até dá na televisão e tudo! E com água salgada, que até se sai de lá já temperadinho e tal…

E os investimentos que poderemos imaginar que tenham sido feitos para as primeiras piscinas, serão recuperados como?

E se as piscinas são municipais como é que o município autoriza a construção de OUTRA piscina – e porventura também lá investe –, esta agora até com água salgada, em absoluta concorrência a si mesmo?

Será algum desidério de concurso ao Guiness das piscinas ou teremos Mangualde na crista da onda para os próximos campeões mundiais de natação?

Admitindo que isto seja caso de miopia minha e que uma piscina monumental de água salgada seja uma prioridade ali para aquelas bandas, por favor e muito encarecidamente, alguém sabe explicar-me o que se passa neste país e, no caso, mais propriamente, em Mangualde?

É que podia ter-lhes dado para melhor… Para pior parece-me difícil.

junho 19, 2011

Verdade ou Consequência

Um gajo chamado Paulo Morais que, fiquei agora a saber, foi vice-presidente da Câmara Municipal do Porto afirmou perante outras câmaras (as de televisão) que o principal centro de corrupção deste país chamado Portugal é nada mais nada menos do que a Assembleia da República.

Ou seja, o indivíduo aponta para um dos principais pilares do sistema democrático como um dos seus principais cancros, com o beneplácito, entre outros, do Bastonário da Ordem dos Advogados (também presente na ocasião).

Das duas uma: ou o Paulo Morais sabe do que está a falar e pode prová-lo e estamos perante um assunto demasiado sério para ser remetido para o momento fait divers dos noticiários ou, assim seja, trata-se de mais um papagaio irresponsável dos que minam a credibilidade da democracia por lhes prestarem demasiada atenção.

Em qualquer dos cenários possíveis acima, ou eu estou mesmo a tornar-me num outsider disto tudo ou deveriam produzir-se consequências.

Começo pelo cenário aparentemente menos grave para o país.

Podemos então pressupor que o tal Morais é um daqueles fala-baratos que se empoleiram num qualquer palanque de circunstância e manda umas bocas para chamar as atenções.

Bom, nesse caso, o tal Morais é uma ameaça para a Democracia porque ao enxovalhar os seus órgãos representativos está, por inerência, a enxovalhar o sistema no qual pelos vistos até já protagonizou um cargo com alguma relevância mesmo em termos nacionais. E então será normal prever que o fulano vai ser chamado a uma comissão parlamentar de inquérito para fazer prova das suas alegações e, neste cenário, ter que desmenti-las e sofrer as consequências legais das suas difamações de um todo que engloba centenas de potenciais suspeitos.

Mas existe a hipótese sinistra de o Paulo Morais ser afinal um homem que sabe demais e por algum motivo entendeu tornar públicos os seus conhecimentos na matéria, embora sejam sempre de desconfiar as acusações atiradas a eito para uma plateia sem nomes que as possam consubstanciar.

Se esta for a realidade factual estamos perante uma acusação da maior gravidade pois a corrupção ainda é um crime e trata-se de um problema de consequências imprevisíveis pelo que pode representar.

Nesse caso, julgo eu, impõe-se na mesma chamar o Paulo Morais perante um qualquer mecanismo da Justiça que lhe imponha a concretização das suas insinuações, nomeadamente pela nomeação directa das pessoas envolvidas e dos exemplos concretos da tal corrupção que estará sediada num, senão no, mais importante dos mecanismos de defesa desta Pátria e da sua população.

O que me assusta no meio disto tudo é a reacção relativamente indiferente da Comunicação Social ao teor de uma acusação tão séria à Assembleia da República. Relegando um facto destes para um plano secundário só podemos concluir que ou os jornalistas são todos uns imbecis (o que alguns até parecem comprovar) ou estão de alguma forma coniventes com o tal fenómeno de corrupção que um tipo que nem é um ilustre desconhecido alega, não é o Coelho da Madeira ou assim, e assobiam para o lado de forma displicente e que os torna suspeitos de cumplicidade num esquema organizado de destruição do país (sim, é esse o efeito da corrupção por onde ela passa).

Seja como for, eu sou um cidadão português e preciso de acreditar em duas coisas: que a Assembleia da República é constituída pelos representantes eleitos pelo povo de que faço parte para falarem e agirem por mim (e eu não pactuo com a corrupção) e é uma instituição na qual posso depositar a minha confiança e, a segunda coisa, que a Justiça deste país possui os meios ao seu alcance para averiguar de imediato a veracidade das alegações do Paulo Morais e, uma vez apurados os factos, dar início à punição dos (alegados, eu sei) prevaricadores.

Se falhar qualquer das duas convicções acima enumeradas resta-me optar entre a emigração, a apatia cobarde ou a luta armada.

junho 17, 2011

Se calhar o Lex Luthor é de Olhão...

Quando nós, sociedade, confiamos a alguns de entre nós os super-poderes realistas que julgamos necessários para combater os diversos males gerados pelas sinergias negativas de grupo, coisas que não sendo equivalentes a uma força sobre-humana ou à visão de raio X constituem uma entrega efectiva da custódia e mesmo da aplicação prática dessa vantagem sobre os restantes, por exemplo a decisão de punir ou de libertar pessoas acusadas de crimes e assim, nós, sociedade, pressupomos que existem mecanismos sérios de filtragem ao longo do caminho a percorrer por esses super cidadãos.

A ideia é impedir que esses super-poderes caiam em mãos erradas, pelo risco que implicam de subverter qualquer sistema pela raiz, pelo próprio fundamento que o sustenta. Por isso, quando uma magistrada é apanhada a conduzir embriagada e em contra-mão ou dez candidatos a juízes são apanhados no copianço nós, sociedade, sentimos uma estranha necessidade de ver essas pessoas privadas dos tais atributos que devem utilizar a nosso favor, o da sociedade, mas podem preferir contra.

Uma das formas mais estupidamente simples de avaliar o carácter desses futuros ou presentes super cidadãos é a observação dos seus actos. Se alguém é apanhado a cometer um crime ou apenas uma fraude, não precisamos de ter um canudo para ficarmos com a ligeira impressão de estarmos perante alguém sem qualidades para exercer as funções tão vitais que precisamos bem cuidadas.

Ao decidirem passar uma esponja sobre o ilícito moral da dezena de trafulhas, permitindo-lhes o acesso ao arsenal, os responsáveis por tamanha ignomínia comprovam-se eles próprios incapazes para o seu papel de barreira de protecção contra os medíocres que possam atingir esse patamar tão elevado do qual, depois de munidos da força e da imunidade que nós, sociedade, pretendemos entregar a uma elite de gente boa, inteligente e honesta, podem tornar-se uma séria ameaça.

Não sei quantos cúmplices por inerência, os que decidiram dessa forma ignóbil, se aliaram ao gang xerox quando ignoraram a responsabilidade que lhes foi, indevidamente, atribuída.

Mas por mim nem um dos intervenientes nesta farsa sem juízo e sem vergonha merece a confiança necessária para fazer parte directa ou indirectamente da Justiça.

Depois de infiltrados no sistema são eles a krypnonite que o enfraquecerá de forma sistemática até outros o poderem liquidar.


junho 16, 2011

Copia, futuro magistrado, e serás recompensado.

Ora parece que no Centro de Estudos Judiciários vale copiar.
Mais: copiar dá direito a tirar positiva. Um reles 10, mas positiva.
Moral da história? Vale a pena ser sacana.
E quando um Bastonário vem apelar ao justo castigo para os prevaricadores (que não são meros intrujões, são burlões que pretendem, um dia, zelar pela justiça deste país), aqui d'el rei que o homem também deve ter copiado (falácia, senhores, FALÁCIA!!!!) e que se limita a perseguir a classe profissional dos magistrados.

Às vezes, mais do que a conta, só me apetece desatar à estalada.

Isto já é de Maio de 2010...

... mas, vá-se lá saber porquê, hoje é que me deu para publicar aqui um excerto de um teste da cadeira de «Pensamento Crítico» da Escola de Direito do Porto da Universidade Católica, em que a professora Ana Andrade utilizou uns pequenos cálculos matemáticos meus, publicados neste blog em 12 de Maio do ano passado, para uma das perguntas opcionais:

Perdidos

Sejam que horas forem (exceptuando a manhã), estão ali.
Avisto-os aqui da secretária, se esticar o pescoço e olhar para a direita: são sempre entre dez e quinze, têm todos entre 16/17 e vinte e (muito) poucos anos, ar de gunas e nada que fazer. Passam infindáveis horas repartidos por dois dos bancos do enorme jardim à frente do meu prédio e vão repartindo o tempo entre o jogo da sueca, os cânticos que insultam um clube de futebol e muita cerveja. Quando partem, deixam vidros no chão e os bancos vazios: nunca vi mais ninguém ocupá-los.
Moram dois ou três quarteirões acima, num bairro (não no sentido portuense do termo, de bairro social, mas de bairro enquanto zona de uma localidade) que ali estava muitas décadas antes de estes prédios terem ocupado o lugar de campos de lavoura. São filhos de ninguém: desconhecem regras, horários ou a necessidade de fazer pela vida. São mal-educados, falam alto, sujam tudo mas fazem festas aos cães.
Um dia, pu-los em debandada porque deram pontapés num caixote do lixo até o fazer cair do poste onde ele estava agarrado (surpreendentemente, a vizinhança age como se eles fosse invisíveis e silenciosos, ignorando-os e passando ao largo); voltaram mais tarde, vi-os aqui da janela do escritório, para o pôr no sítio. Não sei se foram eles que me riscaram a porta do carro, mas tenho a certeza que lhes ganho o respeito de cada vez que passo rente ao grupo e não me importo que a Petra se aproxime.
Não gosto deles nem do barulho que fazem nem da indolência que personificam. Mas não posso deixar de me compadecer com o ar quase feliz com que vêem passar uma vida que não têm capacidade de agarrar. E, só por isso, quase me apetecia mandar deitar a Petra, sentar-me com eles, jogar uma cartada, partilhar uma mini e perceber como é que se acabou assim, sem sequer se ter começado.

junho 14, 2011

Tradução das máscaras

Todos sabemos o que temos de fingir para que nos levem a sério.

Outra vez a mulher de César, agora com os votos já contados.

Um exercício que me parece democraticamente interessante, em período de «novo» ciclo governativo, havia de ser o levantamento dos bens patrimoniais dos elementos do elenco governativo cessante e correlativa comparação com esse mesmo património antes do nobre exercício de governação da coisa pública.

Dir-me-ão que não é bonita esta prática, porventura com laivos persecutórios e, sobretudo, de ética muito discutível, porquanto teria de ser levada a cabo pelo novo poder na governação ou, no mínimo, sob o seu alto patrocínio, o que, perante a evidência da «alternância democrática», levaria a que, frequentemente, os cessantes fossem escrutinados pelos mais recentes adversários.

Ora, com tais pruridos, estaremos apenas a contrariar a transparência democrática com os panos negros do preconceito, alimentando assim as mais vis suspeitas e, inquinando, outra vez, o regime.

Fartos que estamos de ouvir as queixas dos «pobres sacrificados» governantes que abrem mão, com notável espírito de sacrifício, das suas promissoras ou efectivas vidas privadas a bem dos superiores interesses da nação, e se articularmos esses lamentos com outra evidência consabida que é o relativamente baixo nível remuneratório de quem integra qualquer governo, estou em crer que o apuramento que aqui se propõe até deveria ser bem acolhido por cada cidadão honesto, desses tais que tanto se sacrificam pela coisa pública.

E seria bonito de ver, até, um adversário político no exercício do poder louvar e, mesmo, agraciar com eventual comenda aquele que, em boa verdade, viu o seu anterior património exaurido pelo exercício de governação do interesse público.

Agora, atenção a um elemento decisivo no apuramento a fazer: ele teria de ser extensivo a familiares próximos do círculo de gravitação de cada um dos envolvidos…

E isto porque as malhas que o império tece são, geralmente, muito mais entretecidas do que à primeira vista se vislumbra.

Perguntar-me-ão a que propósito vem isto num momento em que o País tanto se aflige com problemas tão momentosos e complexos.

Ora, muito bem, exactamente porque esses problemas advêm do facto de que aquilo com que se compram melões andar de paradeiro incerto, mas que se presume que deve andar «por aí»…

E, em maledicência pura e dura, remato com a circunstância que me suscitou esta reflexão:

- muito estranho que alguém que acabou de ser despedido, ainda que com justa causa,  e sem que se lhe conheça actividade produtiva consistente nos anuncie, de sorriso alvar, que agora sim vai ser feliz. Como? Com o subsídio de desemprego ou a vender fatos de alta costura em segunda mão na Feira da Ladra…?

Receio bem que não seja esse o motivo de tal contentamento e felicidade. Mas se todos temos de pagar os desmandos de alguns, porque não haverão alguns de ter de prestar as contas que (quase) todos prestam?

junho 13, 2011

A posta numa justiça menos cega


Sou propenso à adopção de um Código Penal mais severo para os crimes que a todos enojam. Nisso, Lei alguma deveria contrariar a voz do povo a quem visa proteger . O que sentimos, o grau de repulsa, deveria determinar a medida da compensação que as punições representam, a par com a necessidade de preservar a sociedade de algumas aberrações que preferimos enclausuradas.
Contudo, e em perfeito antagonismo com o espírito da coisa acima descrito, tendo a dedicar alguma solidariedade para com aquele tipo de criminoso que em nada nos intimida porque não magoa seja quem for nem lesa os interesses de quem é mais vulnerável às perdas.
Mais concretamente, falando dos três piratas informáticos que foram agora presos acima de tudo pela ameaça que representam em termos de propagação do apelo à desobediência civil e de payback relativamente a grandes corporações e poderes políticos que cada vez mais percebemos estarem na origem de quase todos os males do mundo, não consigo sentir-me, enquanto cidadão, hostil a esses três marginais que o são (considerando as opções milionárias possíveis para gajos tão bons nisto da informática) por opção própria e porque acreditam que é preciso alguém tomar iniciativas para despertar as gentes da letargia que é o seu maior inimigo nesta guerra em que somos cada vez mais os perdedores.
Nesta perspectiva vejo os três homens agora apanhados como vítimas do desequilíbrio de forças que tentaram combater com a sua sabedoria num domínio onde se podem explorar as escassas vulnerabilidades do sistema montado para nos transformar a todos em escravos camuflados de uns quantos poderosos, como no passado aconteceu com diferentes contornos e protagonistas mas idênticas motivações.
São presos políticos aos meus olhos e não passam de vítimas, de prisioneiros de guerra num conflito para o qual ainda muitos não estão mobilizados porque não perceberam a dimensão do problema que nos afecta a (quase) todos por igual e que é a perda de controlo do sistema financeiro devido ao erro de construção de base do sistema capitalista que faz depender a respectiva sobrevivência de um ritmo de crescimento impossível de garantir sem perdas significativas de regalias por parte daqueles que o sustentam, a multidão dividida para que continuem a reinar os responsáveis por todos os excessos que nos ameaçam.
Não é de ideologias que se trata, mas da constatação óbvia da falência do modelo em que investimos a maior quota das nossas existências, afastados daqueles que mais amamos e daquilo que mais gostamos de fazer com o tempo curto de que dispomos.
É essa verdade que arrasta homens como aquele trio agora detido para uma luta que só assusta aqueles que julgam terem mais a perder e nos tratam a todos como crianças de colo incapazes de sobreviver sem os brinquedos que a máquina se esforça tanto para tornar indispensáveis nas nossas consciências moldadas de acordo com a voracidade mercantil.
É essa a realidade que me leva a criar empatia com estes zés do telhado a quem acredito que um dia, num futuro não muito distante, iremos homenagear como heróis de uma revolução que está a acontecer à revelia da esmagadora maioria daqueles a quem ela mais pode interessar e da qual ainda nem se deram conta.

junho 12, 2011

«A Sustentabilidade da Segurança Social» - por Diogo Oliveira - 2ª parte

A Sustentabilidade da Segurança Social

Capítulo I
Questões e uma resposta

Capitulo II


1. Introdução

No primeiro capítulo analisámos a sustentabilidade do subsídio de desemprego e da pensão de reforma. A tese apresentada defende, entre outros, que o valor pago a título de pensão de reforma ou subsídio de desemprego devia ser igual ao salário mínimo nacional.
Tal facto é sustentado com o facto de, tanto num caso como noutro, haver uma mudança radical na actividade desenvolvida. Também tem como base o princípio de que todos os cidadãos deverão ter um tratamento igual pelo Estado.
No presente capítulo vamos analisar os restantes esquemas de protecção e benefícios atribuídos pela Segurança Social.

2. As duas vertentes da Protecção Social

A Segurança Social faz a protecção dos seus beneficiários de acordo com dois esquemas:

A) Um esquema individual e personalizado – Os cidadãos poupam para consumir num momento futuro; falamos essencialmente na pensão de reforma. Ao longo da sua vida activa, cada indivíduo acumula um dado capital que lhe vai garantir uma pensão até que a morte ocorra. O cálculo do prémio a pagar tem a ver com o valor da pensão que se pretende obter e com a esperança média de vida da população. Isto implica que, se um cidadão desconta durante 20 anos, não pode ter direito ao mesmo valor do que um que desconta durante 40. Atenção, é uma lógica puramente objectiva, não se está a defender que quem não descontou não vai ter direito a uma pensão de reforma ou sobrevivência, esse tema será analisado posteriormente.

B) Um esquema mutualista – Os cidadãos pagam um prémio para cobrir um risco incerto. Cabem neste esquema, fundamentalmente, o subsídio de desemprego e o subsídio de doença.

A Segurança Social ainda administra outros benefícios. São subsídios discricionários, ligados à política económica e que pretendem influenciar as decisões individuais ou melhorar a situação económica de classes mais desfavorecidas. Falamos de subsídios como o abono de família, inserção no mercado de emprego, de sobrevivência, etc.

3. O subsídio de doença

A doença é uma fatalidade que ocorre inesperadamente e que obriga a uma interrupção involuntária e temporária na actividade de um indivíduo. Constata-se desde logo a diferença entre o subsídio de doença e o subsídio de desemprego: embora os dois não dependam da vontade individual, um é uma interrupção temporária e outra é definitiva.
Além do carácter temporal da doença, deveremos entrar em consideração que normalmente a doença obriga a um acréscimo da despesa, independentemente dos actos médicos e curativos serem suportados pelo SNS ou um qualquer esquema de protecção privado. Logo, os prémios a pagar devem estar indexados aos rendimentos individuais.
Tendo em consideração o exposto, conclui-se que neste caso a TSU deve também incluir, além de um valor fixo que cobre a pensão de reforma e o subsídio de desemprego, uma percentagem do ordenado para cobrir o subsídio de doença.

4. O cálculo da Taxa Social Única

A tese que de seguida se apresenta continua a basear-se em métodos quantitativos puros e no rigor das estimativas efectuadas, à imagem do que é feito pelas companhias de seguros.
As companhias de seguros criam fundos autónomos para cada risco que pretendem cobrir. Se criam um fundo de reforma, esse fundo é exclusivo do que se pretende cobrir e não é misturado com outros fundos. Presume-se que a Segurança Social fará o mesmo:
Fundo de reforma – Calcula-se o valor da poupança mensal de cada individuo, com base no cálculo actuarial (presumo que todos os leitores sabem o que é o calculo actuarial, para os menos familiarizados, aconselho uma rápida pesquisa na internet). Os valores acumulados permitirão criar um fundo que garantirá o pagamento da reforma quando o cidadão atingir a idade que lhe permite obter esse benefício.
Fundo de desemprego – Calcula-se o valor para cobrir a taxa de desemprego considerada normal, adiciona-se o factor de risco para situações económica desfavoráveis em que a taxa de desemprego seja superior e calcula-se o montante mensal a pagar por cada indivíduo abrangido. Quando a situação económica é favorável e a taxa de desemprego inferior à normal, existirá um superavit do fundo que será utilizado em situações desfavoráveis.
Fundo de doença – Com base no passado calcula-se o índice normal da população que estará de baixa e, em consequência, calcula-se a taxa que se deve aplicar a cada rendimento para cobrir esse índice. Esta taxa deve sempre incidir sobre o rendimento bruto, porque quando o cidadão está de baixa devem continuar a pagar-se os impostos e a alimentar o fundo de reforma e de desemprego.
ConclusãoA actual Taxa Social Única deve ser dividida em duas: uma taxa fixa que se destina a pagar as protecções que são iguais ao salário mínimo e uma taxa percentual que se destina a cobrir as protecções associadas ao rendimento bruto. Com os computadores actuais todos os cálculos implícitos nesta tese são relativamente fáceis de realizar assim como a divisão da taxa em duas. Também não se vislumbra qualquer dificuldade adicional nas organizações que actualmente se substituem ao Estado na cobrança das taxas.

5. O cálculo das protecções sociais

Como enunciado no ponto 2, a Segurança Social também tem mais duas componentes, uma de solidariedade social para com os mais desfavorecidos e outra de política económica que pretende influenciar as vontades individuais através da discriminação criada pelos subsídios. A meu ver estas vertentes não têm nada a ver com a Taxa Social Única e, se dependem de uma decisão pública ou da vontade pública, então o seu financiamento deve vir do Orçamento Geral do Estado.
E então como é que se garante a sustentabilidade da Segurança Social?
É relativamente simples, e vou dar apenas um pequeno exemplo prático. Imagine-se que um dado governo decide atribuir um abono às famílias com filhos até aos quinze anos de idade. Devemos neste casos seguir os exemplos das companhias de seguros: calcula-se a responsabilidade actual dessa política e o Estado deve entrar imediatamente com o capital necessário para cobrir o fundo criado para esse efeito.
Por protecção social entende-se um leque variado de protecções, inclusive a pensão de reforma ou sobrevivência para aqueles cidadãos que, por motivo devidamente justificado, se viram impossibilitados de contribuir para a sua reforma.
Qual a a vantagem da criação destes fundos?
Demonstra-se matematicamente que a criação deste fundo é economicamente indiferente: se a responsabilidade está assumida, o seu pagamento torna-se obrigatório, é só uma questão de alocar desde já os meios financeiros necessários ou alocá-los na altura do pagamento. A criação do fundo implica desde logo que a geração actual tem de ter o capital necessário para aplicar as suas políticas e não deixar para as gerações futuras um compromisso que elas não decidiram.

6. Os custos administrativos

A Segurança Social necessita de trabalhadores, gestores e equipamentos dispendiosos, hardware e software topo de gama. Aqui também há muito trabalho a fazer. A Segurança Social deve efectuar o cálculo do custo de administração de cada fundo.
Como dividimos a actual TSU em duas, cada uma destas taxas, além dos pagamentos a efectuar para a cobertura dos riscos e dos benefícios, terá um pequeno suplemento para os gastos de administração.
O Estado também terá de pagar o custo administrativo por implementar políticas sociais (nunca se esqueçam que o Estado somos nós, e que o dinheiro que o Governo utiliza é o “meu” e o” teu” dinheiro).
Como vivemos numa sociedade capitalista e a iniciativa privada também faz a cobertura de riscos similares, o custo administrativo da Segurança Social nunca poderá ser superior a um custo idêntico que seja efectuado pelas seguradoras privadas. O rigor e a competência exige-se e impõe-se.

7. Notas finais

Nestes dois capítulos tentou-se afastar a subjectividade e as opiniões pessoais. Nem sempre foi fácil ou possível. No entanto, penso que se conseguiu atingir o objectivo proposto.
Uma das críticas que será de imediato feita a esta tese é que retrata um cenário ideal sem aplicação prática porque não existe dinheiro para assegurar a transição do modelo actual para um modelo sustentável. Além disso, estamos em crise e como tal devermos aguardar que a economia esteja em expansão.
A resposta é:
Qualquer mudança exige sacríficios. Quando a economia estava em expansão também nunca houve dinheiro nem vontade para mudar. Aproveitemos então a crise para mudar.
Finalmente um pouco de subjectividade:
Uma ajuda ao actual Governo: queremos baixar a TSU para sermos mais competitivos? Então acabem com os 23.75 % de descontos da entidade patronal, calculem qual o valor dos descontos a efectuar pelos trabalhadores tendo como base um modelo semelhante ao aqui proposto. Obriguem a entidade patronal a aumentar os salários no montante do novo desconto e depois cobrem esse valor directamente ao trabalhador. Consegue-se o mesmo objectivo de aumentar a competitividade do país pela diminuição do factor trabalho e alocam-se correctamente os custos e as receitas das políticas sociais.

Figueira da Foz, 11 de Junho de 2011.
Diogo Oliveira

junho 08, 2011

Falácia 'ad hominem', Dra. Ana Gomes!!!

Se eu me chamasse Ana Gomes e fosse deputada europeia pelo PS e tivesse uma bocarra maior do que o bom senso, neste momento estaria a pensar seriamente em inscrever-me num dos Cursos de Verão da Católica, designado por Pensamento Crítico e Argumentação e leccionado por esta vossa criada, onde eu teria todo o prazer em ensinar-lhe que atacar alguém (no caso, o Dr. Paulo Portas) em termos pessoais e de forma gratuita (dando à coisa os contornos da insinuaçãozinha barata que não especifica e fazendo comparações insultuosas que não fundamenta), pode ser uma bela forma de tentar deitar abaixo alguém de quem não se goste, mas não passa disso mesmo: uma tentativa não só reles e desesperada mas, mais ainda: falaciosa. E se a senhora, ainda assim, não percebesse, convidaria os meus alunos da licenciatura que, em coro, lhe diriam como é frágil o discurso que recorre à falácia: se o interlocutor estiver atento (o que não é difícil, quando a ad hominem é tão clarinha), não só não convence como nos reduz à nossa (sua!) insignificância e é vergonhoso.
Claro que, para perceber isto, era preciso que possuísse a capacidade de ter vergonha na cara, mas não se apoquente, para a próxima elaborarei e proporei um curso rápido de Ética elementar que, ao que vejo, seria muitíssimo útil.

junho 07, 2011

Proposta no programa do PSD... e algumas propostas minhas

No programa do PSD, consta uma proposta de "entrega de uma factura virtual a quem use o SNS (Sistema Nacional de Saúde), de modo a sensibilizar os cidadãos para os custos dos cuidados de saúde".


Acho bem. Já agora, proponho eu que:
  • Haja estas facturas virtuais para todos os serviços prestados pelo Estado;
  • E, para ser tudo completo, que seja passada também uma factura virtual aos contribuintes por tudo o que pagam aos beneficiários de benesses do Estado (ajudas de custo, pensões, carros de serviço, combustíveis, cartões de crédito, despesas de representação, viagens, alojamento, etc.)
  • Passem a estar disponíveis, para consulta dos cidadãos, todos os relatórios e contas anuais das fundações com capitais públicos, institutos públicos e empresas públicas;
  • Seja criada uma entidade que responda de forma pública a questões e pedidos de esclarecimento colocados pelos cidadãos, também de forma pública.

Reflexões pós-eleitorais – dos eleitores às sondagens

Tendo ainda bem presente o incontornável quantitativo de 41,1% de abstencionistas, neste mais recente processo eleitoral para a Assembleia Legislativa, quantitativo tão avassalador que retira, na minha mais do que modesta opinião, alguma legitimidade democrática, em sentido estrito, a qualquer força política que não tenha obtido votos de idêntica proporção, é com a maior perplexidade que ouço, da boca do primeiro magistrado da nação, Cavaco Silva, a emissão pública da sua própria dúvida relativamente aos números em presença.

Segundo ele, as listas de votantes, a nível nacional, carecem de expurgo de inúmeras situações obsoletas, adiantando que o número total de eleitores não deve exceder os oito milhões e quinhentos mil… ou por aí.

Ora, sabendo nós que os números «oficiais» apontam os nove milhões e quatrocentos-e-tal mil, estamos em presença da perturbante realidade de existir cerca de um milhão (!!!) de eleitores «desaparecidos em combate» e que se encontram a sobrecarregar indevidamente os cadernos eleitorais.

Esta ocorrência, a confirmar-se, subverte de forma dramática todas as contabilizações eleitorais a que vamos assistindo, bem como as decorrentes análises e, até, consequências políticas inerentes. Uma minudência de uns 15% de eleitores que não existem…

Percebe-se mal, de facto, ou não se percebe de todo o que se vai passando nesta terra, quando é o próprio Presidente da República que, com bonomia, o transmite informalmente à nação.

Não me parece curial, na verdade, esta queda para o vale-tudo, logo seguida do faz-de-conta em que somos useiros e vezeiros. Ainda se isto fosse um jardim ou parque de diversões infantis, vá que não vá… Mas, se o fosse, também o senhor Presidente não seria mais do que um mero animador de crianças, vulgo palhaço, o que – ainda estou em crer – não será o caso.

*

As sondagens! Essa coisa execrável que tomou conta de todas as televisões e demais órgãos de «informação»… Pessoalmente, se se desse essa temível ocorrência de eu ter poderes para tal, a sua divulgação pública seria liminarmente proibida e submetidos a pesadíssimas coimas todos aqueles que violassem essa proibição.

Na verdade, mesmo admitindo que elas tenham interesse para os diversos aparelhos partidários a fim de delinearem e adaptarem as respectivas campanhas; mesmo admitindo, ainda, a cientificidade na recolha de opiniões – que é profundamente discutível – a sua divulgação ANTES de as eleições terem lugar mais não são do que uma descarada acção de condicionamento de decisões individuais.

A sua divulgação mais não é do que tentativas – pelos vistos cada vez melhor sucedidas – de condução do rebanho que se quer que sejam os eleitores, criando «lógicas aritméticas» de onde o chamado voto útil, esse filho bastardo da democracia, se transforma em «príncipe primogénito», numa estapafúrdia ilação, a que todos podem rapidamente chegar, de que se são tão «certas» as sondagens, às duas por três, já nem será preciso votar…

Se isto não é uma depravação orwelliana, é o quê? Ou, colocado de outro modo, alguém me sabe explicar, nesta incomensurável burrice de que me sinto possuído, qual é o benefício que essa divulgação de resultados de sondagens pode trazer para o cidadão, contribuinte, eleitor?   

junho 06, 2011

«A Sustentabilidade da Segurança Social» - por Diogo Oliveira - questões e uma resposta

José Luís Cardoso - "Ah, «grande Diogo»... aparentemente é o «ovo de Colombo»! Partilho totalmente dos pressupostos, mas será que haveria dinheiro para pagar subsídios à % da população que nunca desconta coisa nenhuma (porque não trabalha ou não quer descontar) ao longo da vida? continuando o teu raciocínio talvez se chegue a uma solução mais justa mas que garanta também a sustentabilidade do sistema... a «economia subterrânea e informal» dificulta e desvirtua todos os modelos."
Paulo Moura - "Finalmente, temos alguém que possa rivalizar com o Bagão Félix neste tema! E agora que já me passou o efeito das eleições, uma perguntita: Diogo, tu assumes que a TSU é para a pensão de reforma e para o subsídio de desemprego. Mas... e a componente de saúde e apoio na doença?"

Diogo Oliveira - "Paulo, esse seria o segundo capítulo da tese.
Continuas a pensar dentro do actual quadro legal. A minha tese rompe com esse quadro. A constituição defende uma saúde tendencialmente gratuita. E eu pergunto: O que é a saúde? É ir ao hospital levar uma pica? E um cidadão quando está em convalescença, não será saúde? E então o apoio na doença deve estar debaixo da Segurança Social ou do SNS?
A tese que eu apresento começou por se aplicar apenas à reforma, mas depois apercebi-me que a poderia alargar ao subsídio de desemprego, porque temos para ambos como rendimento o salário mínimo. Tanto no subsídio de desemprego como na reforma existe a mudança radical de situação de vida, que é a perda do emprego. Na doença é uma paragem repentina dentro do mesmo emprego, não faz sentido indexá-lo ao ordenado mínimo, especialmente quando talvez ainda seja necessário um acréscimo de rendimento.
Não há hipótese de a SS ser sustentável se o valor dos descontos é 34.75 do teu ordenado e tu com isso queres pagar tudo e mais um par de botas. Há coisas que terão de ser pagas via IRS. O Estado está cheio de esquemas Ponzi, este é o mais gritante, e quando a bolha rebentar ninguém vai ficar ileso."

Legislativas 2011 - venceu a abstenção...
o resto já se previa

41,1% do universo eleitoral português considera que, porventura, a vida rupestre pode ser um desígnio de futuro a considerar. Dito de outra maneira, três milhões oitocentos e setenta e cinco mil e vinte e dois portugueses não sabem (ou não querem saber) que o são. Mais do que aqueles que votaram nos dois partidos com maior número de votos (PSD e PS).  

Enquanto, em metade do mundo, pessoas (como nós) dão a vida para poderem alcançar esse direito/obrigação de exercício de cidadania, 41,1% dos portugueses eleitores consideram que o mais indicado é estarem-se nas tintas e amanharem a vidinha… ou deixarem-se emaranhar por ela, que vai quase dar ao mesmo.     

A verdade é que esta malta não vota. Ou porque o seu sentido de nação se encontra diluído numa miríade de deformações filosóficas ou por mera incapacidade de estabelecerem meia-dúzia de ligações neuronais que provem, a si e aos outros, que ainda vivem, ainda mexem, ainda respiram e que o ser humano – qualificação ou epíteto em que eles ainda se integram, é um ser eminentemente social.

Ora, ao não querer assumi-lo, está voluntariamente a ostracizar-se, de onde decorrerá, por elementar evidência, que não andará cá a fazer nada, pelo que o seu suicídio poderá ser não mais do que a confirmação factual de uma realidade que de há muito os vitimou e sempre «desamparam a loja» para quem ainda busque oportunidades.

Confesso, por estas eventualmente duras palavras, que não consigo compreender esta atitude de demissão. Nem a aceito.

Poderei condescender, em exercício de cidadania, que o abstencionismo o seja por razões de saúde, de sanidade mental, de idade, até. Mas, nos dias que vão correndo, nem as razões profissionais podem ser invocadas.

Porque, em boa verdade, como pode o abstencionista – para quem é irrelevante ou indiferente quem presida aos destinos do SEU país – esperar que o carro-patrulha da PSP vigie a sua área de residência, ou pretender qualidade no ensino que é transmitido aos seus filhos, ou esperar o aconchego que lhe deve ser garantido na doença, por parte da sociedade em que se integra… se ele se demite e abdica dessa sociedade e, a fazer alguma coisa – como seja o pagamento de impostos – apenas o faz por obrigação e com constrangimento?

Como poderá esse presumível eremita – ainda que mantendo, tantas vezes, um notável sentido das conveniências, mormente as que lhe são convenientes… – esperar algo do Estado, quando abre, assim, mão desse derradeiro exercício da sua cidadania?

Esta é, para mim, uma manifestação de puro egoísmo exacerbado, uma «vingança» idiota porque vitima os que já são vítimas, a que só mentes tortuosas podem atribuir adjectivação de «rebeldia» ou «descontentamento».

A rebeldia ou descontentamento consubstanciam-se em actos. Ora, o que estas almas fazem é não-actos, se assim podemos chamar-lhes.

E amanhã? Mantêm a coerência e pespegam-se no meio da vida com algum estandarte que lhes confira dignidade de atitude e coerência e razão de ser de postura ou, muito ao contrário, correm ao postigo da primeira repartição pública em busca de algum ansiado subsídio, pelo qual estendem a mão bajuladora?

Rebeldes sem causa ou «não-me-comprometa» militantes, que querem eles da vida e dos outros?

Por estas e por outras é que eu considero que o voto deveria ser obrigatório ou, no mínimo, que fosse tornada pública, em cada freguesia, a lista de nomes dos não votantes e que alguma medida (ou conjunto delas) coerciva fosse assumida e contemplasse estes «rabos-enterrados-no-sofá».

«- Ah, nem sei em quem hei-de votar… Eles são todos iguais…». Mas, ó criatura, tu votas é em ti, na tua consciência, na expectativa de que, em determinado momento, tenhas de um mundo melhor, para ti, para os teus, mesmo que o «resto» não te interesse. E, nessa expectativa, o teu voto traduzirá o teu sentir.

E até poderá ser o voto branco ou anulado – houve 148.050 dos primeiros e 75.280 dos segundos, nestas eleições; como vês não estás sozinho… –,  ou nos defensores dos cães ou nos perseguidores dos gatos, mas vota, porra!   

Agora, que irredutivelmente não votaste, diz-me cá uma coisa, assim do fundo do coração: esse teu não-gesto serviu ou vai servir para quê?

junho 05, 2011

«A Sustentabilidade da Segurança Social» - por Diogo Oliveira

A tese empírica que agora se apresenta provavelmente não é nova mas ganhou actualidade perante a discussão da redução da Taxa Social Única, como pólo mobilizador do crescimento económico e da competitividade nacional.

Pressupostos:
1 – Todos os cidadãos são iguais perante o Estado.
2- Todos os cidadãos devem ter um nível de vida digno. O salário mínimo nacional deve garantir essa dignidade

Introdução:
As perguntas que se fazem e as respostas possíveis:
Se todos os cidadãos são iguais perante o Estado, porque é que este paga mais pensões de reforma e subsídio de desemprego a uns cidadãos que a outros?
A resposta que todos darão é: Porque há cidadãos que descontam mais do que outros.
Então porque é que não descontam todos o mesmo?
Porque por um princípio de justiça e solidariedade quem ganha mais deve descontar mais!
Então mas a TSU é uma taxa ou um imposto?

Proposta:
Os cidadãos só devem contribuir para uma pensão de reforma e um subsídio de desemprego equivalente ao salário mínimo nacional. O Estado, para ser justo para com todos os cidadãos, deve pagar exactamente o mesmo subsídio de desemprego e pensão de reforma a todos os seus cidadãos.
Um dos principais objectivos de um Estado actual é garantir um salário mínimo nacional digno a cada cidadão e não pagar mais a uns do que a outros só porque uns podem descontar mais do que outros.
Se um cidadão ganha mais do que o salário mínimo nacional é da sua responsabilidade e não do Estado poupar para uma velhice ou um desemprego involuntário mais desafogado.

A ilusão económica dos descontos da entidade patronal:
Uma das ilusões mais perniciosas da actual TSU é o desconto da entidade patronal. A TSU é unicamente um benefício esperado futuro exclusivo do trabalhador e os descontos que são feitos são sobre o seu salário ou rendimento, logo, mesmo a parte que a entidade patronal desconta é de facto um desconto do trabalhador. Ao dividir esse desconto em dois, um da responsabilidade do trabalhador e outro da entidade patronal, apenas se cria distorção e ilusão económica.

A Tese:
A TSU deva ser calculada com base em princípios actuariais puros, isto é, exclusivamente matemáticos e com base nas melhores estimativas disponíveis. O cálculo deve ser feito para garantir uma pensão de reforma e um subsídio de desemprego equivalente ao salário mínimo nacional.
Deve ser o trabalhador a pagar, em exclusivo, esta taxa.
Deve-se manter o princípio de que só recebe a pensão completa quem tenha 40 anos de descontos e 65 anos de idade. Não existem reformas antecipadas. Todas as excepções a esta medida devem vir do Orçamento Geral do Estado, isto é, dos impostos sobre o rendimento e não da TSU.

Implicações imediatas:
- O salário mínimo nacional iria aumentar de imediato no equivalente ao que a entidade patronal desconta.
- Como a TSU vai incidir unicamente sobre um valor equivalente ao salário mínimo nacional, o actual desconto da entidade patronal deve ser transformado em salário. O trabalhador fica de imediato com um rendimento disponível superior e com a responsabilidade de o aplicar na sua reforma ou consumir. Para quem não confia nas entidades privadas o Estado pode manter o actual PPR da Segurança Social (devidamente modificado para que cada um descontasse o que julgasse mais conveniente) e isenções de IRS que incentivem a poupança para a reforma.
- Simplifica todos os cálculos porque o valor a descontar seria sempre único e igual para todos os trabalhadores, incluindo os trabalhadores independentes. Harmoniza-se desde logo os descontos entre estes dois tipos de trabalho e mais uma vez desmonta-se mais uma ilusão económica.
- Os cidadãos teriam um tratamento verdadeiramente igual perante o Estado no que concerne à protecção na velhice e no desemprego.
- Passava a existir um verdadeiro compromisso intergeracional. A geração actual teria de trabalhar para garantir um salário mínimo nacional superior à geração futura porque isso lhe iria garantir uma velhice mais desafogada. E não, como sucede actualmente, onde a geração actual apenas consome os rendimentos das gerações futuras.

A transição do modelo actual para o modelo futuro
O Estado, como qualquer entidade responsável, deve cumprir os compromissos assumidos. Se prometeu à actual geração pagar uma pensão de reforma equivalente ao seu salário deve cumprir esse compromisso, pelo menos até à data em que esse compromisso é alterado, ou então, devolve a diferença entre o que cobrou e o que deveria ter cobrado se a TSU incidisse unicamente sobre o salário mínimo.
Como o Estado não tem disponível dinheiro no imediato para cumprir com este compromisso, a única solução possível será aplicar os princípios actuariais. Isto é, se uma pessoa que descontou sobre o salário mínimo nacional tem direito a uma pensão igual ao salário mínimo nacional, vamos calcular o valor equivalente a quem andou a descontar um valor superior na fase de transição e aplicar a respectiva equivalência.
Para evitar uma crítica imediata a esta tese, todos os tributos e valores indexados ao salário mínimo nacional deverão ser ajustados à nova realidade, como o IRS ou o pagamento de horas extraordinárias.

Diogo Oliveira
Figueira da Foz, 5 de Junho de 2011

junho 03, 2011

Mas votem!

Votem, por desgosto, por convicção, melancolicamente ou por desfastio, por amor ou por cidadania, por revolta ou por afecto, porque consideram que cada vez se vive pior ou, pelo contrário, porque cada vez se vive melhor, pela transcendência da vossa individualidade ou pela subjectividade do superior desígnio do concerto do universo, votem!

Votem pelos netos, pelos filhos, pelo vizinho, mas principalmente por vós próprios e por todos os demais, sem os quais pouco ou nada somos, votem!

Votem, também, pelos impostos que se pagam; façam ouvir as vossas vozes cuja intensidade deixará aos governantes passados e futuros a noção mais clara de que, afinal, a impunidade talvez não fique tão impune por desmandos praticados, votem!

Votem, pois se não o fizerem a vossa responsabilidade por omissão é tanto ou mais gravosa do que a daqueles que nos têm preenchido a vida de desconsolo. Votem!