abril 30, 2012

Como Mexia teve acesso ao estudo

... divulgadas imagens esclarecedoras(?!) de como o "estudo sobre as rendas excessivas" chegou ao gabinete de António Mexia poucas horas depois do Governo ter tomado conhecimento do mesmo.

III “Estupidez de espécie”

Uma ´”espécie inteligente” é uma espécie em que os indivíduos a par dos seus interesses individuais consideram os interesses da espécie, quando não, põem os interesses da espécie acima dos seus. Numa ”espécie inteligente” os indivíduos não põem os seus interesses acima dos da espécie, nem nunca vão contra os interesses da espécie, e se algum falha, os outros caem-lhe todos em cima. No caso da nossa espécie, que não é de todo “inteligente”, os indivíduos nem percebem o que sejam os interesses da espécie. Nem sabem que isso existe. E não é agora porque temos telemóveis, e automóveis, e aviões, e satélites, e internet, e muitos livros, que nos tornamos mais “inteligentes” nem enquanto indivíduos e muito menos enquanto espécie. O Homo sapiens sapiens de hoje é igualzinho ao Homo sapiens sapiens de há dois mil anos, ou de há dez mil anos. A Natureza é muito vagarosa para a escala de tempo das nossas vidas. Ninguém pense que lá porque fomos à lua, acordamos todos mais inteligentes. Isso é um disparate. Nós acordamos todos foi mais estúpidos e mais perigosos que nunca!

Se alcançamos coisas extraordinárias, como é o caso da tecnologia, foi à conta das nossas ambições individuais somadas (e cada um a lixar o próximo à força toda!). É por isso que é o poder e o dinheiro que movem isto tudo. Sem dinheiro ou poder, sem cenoura à frente de cada animal (ou grupo de animais), o avanço tecnológico parava já. Enquanto “espécie” nunca fizemos nada de jeito… excepto unirmo-nos para lutarmos (muitas das vezes com muito sangue) contra um inimigo comum (Natureza pura). Avanços tecnológicos que favoreçam a espécie, mas não favoreçam os interesses individuais, não vão nunca para a frente. O que quer que seja que seja bom para a “espécie”, mas não favoreça o “indivíduo”, não avança. Pelas mesmas razões, em lugar nenhum do mundo se conseguem encontrar indivíduos capazes de pôr “o bem da espécie” acima do seu. Porque é contra a Natureza da nossa espécie!! O que há são alguns indivíduos (poucos) capazes de o fazer mediante um grau satisfatório de abundância. Ou seja, o que existe são alguns indivíduos (poucos) capazes de conter os limites da sua ambição. O que existe, me parece, são alguns indivíduos (poucos) com uma “inteligência de espécie” um pouco mais desenvolvida. A Natureza também está dentro de nós. Nós também somos Natureza. Como é que não conseguimos entender isto?? Não se pode ir nunca contra a Natureza, no que quer que seja! Não se pode! Tudo o que seja contra a Natureza está votado ao fracasso. A Natureza é muito forte. A Natureza é perfeita! Não temos condições mínimas para desafiar a perfeição. Isto é evidente, ou não? A única hipótese que nos resta é a da tentativa de nos juntarmos a ela.

É por isto que o capitalismo funciona muito melhor com a nossa espécie que o comunismo. E também é por isto que os modelos liberais funcionam muito melhor com a nossa espécie que os modelos socialistas. E também é por isto que as nossas “democracias” degeneram muitas vezes em “ditaduras”, tanto de forma assumida como de forma dissimulada. Se nós fossemos só um bocadinho inteligentes enquanto espécie, púnhamos isto a funcionar, dando liberdade ao indivíduo para produzir e para criar, e corrigíamos a nossa “estupidez de espécie” com leis gerais que impedissem os problemas que dela advém… as acumulações desmedidas de poder e de riqueza, a destruição massiva do planeta e o crescimento populacional desenfreado. Até que nem era assim tão difícil de fazer…

  … e quem sabe com o tempo arranjássemos maneira de inventar deste “barro” realmente um “Homem”.

abril 29, 2012

Prémio Américo Thomaz

Não sei quem foi o autor, o que é uma peninha. Ainda assim, aqui vai...


PRÉMIO AMÉRICO THOMAZ – Encontrado o vencedor do mês de Abril

Fazendo uma retrospectiva da história portuguesa, mais concretamente da batalha dos Atoleiros, Aguiar-Branco, o nosso inteligentíssimo ministro da Defesa, considerou importante copiar a atitude positiva registada no passado e aplicá-la aos tempos de crise que agora se vivem. E então, disse:

«É preciso criatividade e inovação, tal como aconteceu à época para conseguirmos ultrapassar essas dificuldades e, quando nós dizemos que é preciso fazer o que nunca foi feito, esse exemplo passado mostra que é preciso fazer, muitas vezes, o que não foi feito até então para ultrapassar essas dificuldades.»

Que maravilha de retórica!!

É a primeira vez que tento perceber o que este gajo tem na cabeça desde a última vez que tentei perceber o que este gajo tem na cabeça – e em ambas não consegui perceber o que este gajo tem na cabeça. O defeito deve ser meu...

abril 28, 2012

Abstenha-se igualmente de pensar


Foto: Shark

«O novo surto de emigração» - Jaime Ramos

Não só não atraímos imigrantes como estamos a aumentar a saída de naturais. De 1998 a 2008, 697.963 portugueses foram para o estrangeiro. Desde 2000 o número anual de novos emigrantes tem vindo a crescer. Em 2007 e 2008 foram mais de cem mil por ano. Os cinco maiores destinos foram por ordem decrescente Suíça, Espanha, Alemanha, Angola e Reino Unido.
Este aumento da emigração é mais um contributo para a descida do número de residentes, baixa natalidade e envelhecimento da população. Provoca também uma baixa do PIB embora tenha um efeito positivo sobre a balança externa.
A redução do número de pessoas residentes em Portugal permite uma redução da despesa com as importações. Somos menos a comer, logo gastamos menos. O aumento das transferências graças aos novos emigrantes irá melhorar o défice externo, pois entram nas contas nacionais aumentando a receita.
Perante o deficit da balança externa, decorrente fundamentalmente do facto de termos mais importações que exportações, há duas soluções simples e evidentes.
Uma, reduzir os salários em 20 ou 30% como foi defendido por alguns economistas internacionais e alguns tolos nacionais. A redução dos salários imporia uma diminuição brusca do consumo pois as pessoas e as famílias só poderão adquirir o que é mesmo essencial. O corte nos consumos supérfluos, devido à descida dos salários, provocaria uma descida drástica no PIB e um aumento brusco no desemprego.
A subida generalizada do desemprego e a baixa no poder de compra originariam uma forte convulsão social e aumentariam a disponibilidade para os portugueses emigrarem.
Este aumento da emigração reduziria ainda mais o PIB e o número de postos de trabalho, provocando uma imediata e longa recessão económica. Teria efeito positivo na importação de moeda, pelo aumento das transferências por parte dos trabalhadores no estrangeiro, reduzindo a necessidade de importações, favorecendo a recuperação do défice externo.
Uma redução da população, seja provocada pelo envelhecimento e pela não reposição por baixa natalidade, seja originada pelo êxodo devido ao aumento da emigração, provocará sempre redução do PIB, empobrecimento do país e melhoria compensadora das contas externas.
Desde há quinze anos que em vários artigos, entrevistas e declarações públicas, fui alertando para o facto de Portugal correr o risco de se “Alentejenizar”. O Alentejo, sendo um território português que sempre beneficiou da mesma moeda, foi perdendo população e possibilidade de criar riqueza. Nas últimas décadas também todo o interior centro e norte sofreu o êxodo populacional, envelhecimento e empobrecimento regional. Nos EUA há estados centrais, possuidores das grandes pradarias, historicamente fortes na agricultura de gado e cereais, que se têm despovoado.
Portugal ao aderir ao euro e melhorar o seu contexto no espaço europeu não garantiu o seu desenvolvimento e enriquecimento, ao contrário do que pensou a larga maioria de portugueses e alguns reputados economistas. Portugal pode, se não cuidarmos do território e dos nossos interesses nacionais, comportar-se na Europa como estas regiões ( Alentejo, interior norte e centro, estados do interior dos EUA) que continuam a empobrecer e a despovoar-se.
Mesmo sem a redução salarial, a divergência arrastada da nossa economia relativamente ao crescimento médio europeu, provocará um aumento da emigração e perda da população, embora de forma mais lenta. Nos últimos anos esta evolução começou a ser evidente.
Numa primeira fase deixámos de atrair imigrantes, nomeadamente do Leste, ao contrário do que acontecera no final da década de noventa e início de 2000. Nessa época, todo o país foi invadido por imigrantes, facto que se deixou de verificar à medida que a nossa divergência de crescimento se veio a sedimentar.
Numa segunda fase passámos novamente a ver crescer a nossa emigração, devido à falta de emprego razoavelmente remunerado no nosso país.
Portugal tem história de emigração, tem tradição, tem comunidades espalhadas pelo mundo que são porta de entrada para a América e Europa, temos países de expressão portuguesa, como o Brasil e Angola, cujas economias vão crescer pelo que, a manter-se a crise nacional, a consequência vai ser uma aceleração da emigração.
De imediato nada podemos fazer para a contrariar e podemos afirmar que é um dado positivo pela melhoria que permite na nossa balança externa, diferença entre o total de entrada de moeda pelas exportações, turismo e transferências de fundos europeus e dos emigrantes, e o total da saída de moeda para pagar as importações, adicionadas ao pagamento de capital e juros da dívida do Estado e da banca (intermediária da dívida das empresas e famílias) ao estrangeiro.
Perante esta evidência, uma hipótese é nada fazer, mantendo a realidade económica e social do país, continuando o nosso empobrecimento relativo, tal como vem a acontecer há cerca de 15 anos.

Jaime Ramos
Excerto do livro «Não basta mudar as moscas»

Rumba Catalana - «Isto não é crise, chama-se capitalismo»

"Pensar não é ilegal (ainda)".
Acção numa agência do banco La Caixa em Barcelona a 8 de Fevereiro de 2012:

abril 27, 2012

II Epitáfio: “Não aprenderam a aprender com a Natureza”

A Natureza é perfeita. Não sei se me estou a fazer entender: a Natureza é… perfeita! “Topam”? Onde é que se pode estudar como fonte segura de conhecimento? Na Natureza. Claro! Não existe mais nenhuma “fonte segura de conhecimento”. Quais são as únicas leis em que se pode confiar cegamente? As da Natureza, como é evidente! Tudo o mais é de desconfiar…

Sejam quais forem as perguntas, as respostas estão todas na Natureza! A Natureza nunca falha. Nunca erra. Nunca! A Natureza tem sempre razão. Sempre! A Natureza é perfeita! Absolutamente perfeita!

Não se percebe como é que a malta não aprende mais com a Natureza… A Natureza está farta de nos ensinar, por exemplo, que: “tudo aquilo que não funciona deve ser excluído”. Outra coisa que a Natureza nos ensina é que tudo o que funciona é estético e harmonioso (todas as coisas têm que ter o seu lugar perfeitamente certo). E mesmo que a gente não tenha cabeça ou conhecimento para perceber porque é que é assim, como “a Natureza é perfeita”, parte-se logo do princípio de que: a estética e a harmonia são fundamentais (ponto), (não pode ser tudo de qualquer maneira, a ordem e a ligação entre as partes é fundamental). Alguma vez a Natureza se enganou? Alguns dirão que sim… que aconteceu connosco… que somos aquele caso bizarro da criatura que destrói o Criador… mas não! Nós só ainda não fomos excluídos. Ainda!! Mas também ainda passou muito pouco tempo. Isto do Homo sapiens sapiens, em número que se veja, só tem uns milénios… e ainda só estamos a passar completamente das marcas há umas décadas… O Ginkgo biloba é uma espécie que se estima ter duzentos milhões de anos! Conviveu com os dinossauros e convive agora connosco. Depois desta Natureza da qual fazemos parte e que estamos a destruir avidamente, outra virá, corrigida deste “erro” desta espécie que não funcionava por ser demasiado imperfeita e com isso causar um tremendo desequilíbrio ao sistema. A Natureza não tolera a imperfeição. Quanto mais o erro grosseiro!! (É outra coisa que ainda não aprendemos…)

Porque é que acham que nós temos os governantes que temos e etc.? Porque não aprendemos a aprender com a Natureza. Porque é que acham que os nossos modelos sociais, políticos e económicos não funcionam? Porque não aprendemos a aprender com a Natureza. Porque é que tudo leva a crer que o futuro da nossa espécie esteja irremediavelmente comprometido? Porque não aprendemos a aprender com a Natureza. E etc.. A resposta é sempre a mesma. A nossa inteligência nunca foi suficiente (ou a nossa vaidade sempre foi excessiva) para aprendermos a ler e a copiar o único modelo perfeito que existe (ao nosso alcance), e por azar foi a bastante para fazermos uma data de “brinquedos” perigosos que nos convencem a todos de que somos “os maiores”. Porque é que haveria de ser? Porque os políticos são “maus” como lobos vestidos em peles de cordeiro? E os banqueiros também… e a malta do petróleo e do rating e tal… e à noite transformam-se em vampiros e em lobisomens e vêm comer as criancinhas?

abril 26, 2012

Esperemos que não seja da competência do cônjuge...


Isto não querendo levantar falsos testemunhos ou assim, mas exactamente quem tem por responsabilidade aferir da sanidade mental de um Presidente da República, por exemplo?
Ou seja, a quem compete declarar incapaz um Presidente que aparente, pela pose e pelo discurso, estar meio xoné?
A questão parece de somenos importância, mas se tivermos em conta a forte possibilidade de isso um dia (ontem?) acontecer no nosso país não vamos querer que a faca e o queijo da destituição estejam nas mãos de alguém cujo emprego dependa directamente da manutenção de um maluco no poder.

Pois não?

abril 24, 2012

25 de Abril sempre?
Claro! E cada vez mais...

Por nós, pela memória de José Afonso, estaremos no 25 de Abril com um cravo feito de poemas na Calçada do Combro, em Lisboa, pelas 19 horas, no Mini Teatro da Calçada.

Venham daí! E sigam o preceito solidário que a canção aconselha: tragam um amigo, também!




Foi em 25 de Abril de 1974. Lembram-se? Uma brisa só foi capaz de afastar a névoa mais densa. Mas uma brisa de vontade, de constância, de coragem. E todos os medos redescobriram que, afinal, em cada dia uma alvorada desponta e saíram, por fim, à rua numa ânsia imparável de Liberdade, solidários, numa corrente feita de seres humanos, maré alta na cidade.

Uma coragem nascida da ansiedade e receios mal contidos, mas de cravo ao peito e uma nova alma na voz, derramou na urbe um mar de gente vitoriando os «capitães de Abril» e, nesse inquantificável momento cósmico, Portugal renasceu... e todos nós com ele!    

E aos que criticam, hoje, os militares de Abril por não comparecerem nos «festejos oficiais» de um Abril espartilhado pelos interesses reinantes, a esses gostaria de lembrar que nem essa comparência terá estatuto obrigatório - pois seria inequívoco tique ditatorial - nem ninguém de coluna vertebral íntegra está impedido de manifestar a sua discordância pelo actual estado da nação do modo que tiver por mais adequado. Senão, cabe aqui questionar o que muitos vão questionando: então, que raio de liberdade é esta?

Da evidência dos juízos de gosto

Foi tema de debate académico, entre colegas e um professor, aqui há umas semanas e, invariavelmente (como tudo o que é filosofia, se não, não é filosofia nem é nada) tem a sua expressão no quotidiano do ser humano. Não que todos os temas filosóficos sejam fáceis de abordar em "conversa de café" mas este é-o.
Acontece que todos os filósofos sistemáticos (porque há os que não o são, como um Pascal e não serão menos filósofos por isso) têm dividido o mundo em três domínios diferentes, aos quais correspondem maneiras de pensar diferentes, justamente porque se debruçam sobre objectos de pensamento diversos (aliás, o velhinho e sempre actual Aristóteles disse qualquer coisa deste género: é próprio do homem inculto pensar de forma igual objectos diferentes - e só isto daria pano para mangas, mesmo porque a afirmação contraria o (dele) mestre Platão mas não vamos por aí, agora; ficará para outra altura).
É é mais ou menos consensual, e sob terminologia muito diversa, entender que os três domínios supra referidos serão:
a) o cognitivo (chamemos-lhe conhecimento científico, por uma questão de clareza), a que corresponderá a (necessidade de) prova;
b) o estético, que implica a evidência;
c) o ético-político, onde cabe a argumentação.
(haveria lugar para um quarto domínio, o religioso, que assume uma dimensão muito especial, por estar, de certa maneira, contido em cada um dos três acima e, ainda assim, ser à parte - mas deixemo-lo por ora)

E o que sucede é que não há aqui misturas: a ciência strictu sensu exige prova (experimental, desde Galileu) e é pela argumentação que vamos evoluindo em termos éticos e sociais. A questiúncula surge com a afirmação do juízo de gosto como ligado à ideia de evidência. Mas não é de outro modo, se pensarmos que, quando empreendemos uma discussão sobre se o clube A é ou não maior/melhor do que o clube B, ou sobre se os Beatles são melhores do que os Stones, ou mesmo se o Tony Carreira me é mais aprazível do que uma ária de Verdi, ou se cozido à portuguesa é petisco melhor do que bife com batatas fritas.
Não é por meio da argumentação (porque nunca convenceremos o opositor das nossas razões ou, mesmo que ele as aceite, dificilmente afirmará qualquer coisa como "sim senhora, vou já substituir toda a minha vasta discografia do Marco Paulo e passarei a ouvir unicamente Wagner, tens toda a razão" - se o fizesse, não passaria daquilo a que D. Hume chama pretender, conceito ainda há-de dar direito a um post) e muito menos por meio da prova (que importa a um admirador da Ruth Marlene se a métrica ou a harmonia do que ela canta seja cientificamente inferior, de uma perspectiva musicológica, às encontradas numa canção dos Pearl Jam?) que o juízo de gosto do parceiro se alterará.
E isto porquê?
Porque sentimos as coisas de que gostamos como evidentemente melhores do que aquelas de que não gostamos ou pelas quais sentimos indiferença. Ou seja, os nossos gostos são-nos tão evidentes (e não se pense na evidência como universalizável, esse será o maior dos erros do senso comum: o que para X é evidente pode não ser para Y - neste domínio e só nele) que raramente se alteram, a não ser que, de moto próprio, conheçamos outras realidades estéticas que se nos afigurem ainda mais evidentes.

Claro que o senso comum percebeu isto, tendo-o plasmado no adágio "gostos não se discutem". O que o senso comum provavelmente queria dizer é que, da discussão, dificilmente nascerá gosto diferente no parceiro. Pode ceder-se num ou noutro ponto, mas só se não tivermos a nossa opinião (ou, mais rigorosamente, o nosso juízo) bem elaborada, por desconhecimento ou desatenção (por exemplo, eu poderia achar que Picasso era o melhor dos pintores até conhecer Paula Rego, ou que Paris era a mais bela cidade do mundo até conhecer Praga).

Eu, por mim, prefiro dizer que os gostos discutem-se sim; de resto, é o que mais discutimos (mesmo inverbalmente) no dia-a-dia. Mas que se trata de uma discussão, as mais das vezes, estéril, ai disso não tenho a menor das dúvidas.

Dia Mundial do Livro...


... foi ontem, mas todos os outros o podem ser.

A vingança dos contactados telefonicamente

abril 23, 2012

De vez em quando encontram-se pérolas no Twitter


I. “Espécie inteligente”

Andam para aí umas pessoas perfeitamente convencidas de que somos uma “espécie inteligente”. Isto é muito estranho, não é? Como é que em pleno século XXI ainda há pessoas convencidas de disparates destes? Nós não somos, nem nunca fomos (e por certo nunca seremos) uma “espécie inteligente”. Os “indivíduos” da nossa espécie é que são inteligentes. É muito diferente! Como “espécie” somos muito semelhantes aos ratos. Os ratos não são assim muito inteligentes, pois não? Não sei… acho que não…

Se se puserem uns ratos numa gaiola, enquanto forem poucos e houver abundância, reproduzem-se muito. Quando já são muitos e os recursos escasseiam (o espaço, a água e a comida), lutam entre si, morrem alguns, e depois volta tudo ao princípio. A nossa espécie é igualzinha. A única diferença é que a nossa “gaiola” é o planeta. Nos últimos cem anos, como alcançamos os meios tecnológicos suficientes, destruímos mais o planeta que em toda a história da espécie humana e reproduzimo-nos muito porque houve muita abundância. Neste momento já vamos em número muito além do limite de sustentabilidade da nossa “gaiola”. Agora, aqui no Ocidente, vai haver algum decréscimo populacional, mas não como resultado de uma “decisão racional”, é mesmo só porque vamos entrar em escassez… e por isso, temporariamente, se calhar não vamos atingir o limiar dos recursos planetários. Quando o atingirmos, lutamos entre nós, nem que seja corpo a corpo até à morte por um copo de água, morrem alguns, e depois volta tudo ao princípio… a menos que entretanto tenhamos destruído o planeta a tal ponto que deixe de haver condições de sobrevivência para a nossa espécie. Onde é que alguém vê nisto qualquer coisa que se assemelhe a “inteligência”?

Não somos. Não somos nada uma “espécie inteligente”. Estamos muito longe disso. Lá por sermos bastante inteligentes como indivíduos não significa que sejamos inteligentes enquanto espécie. Não estou a ironizar. De todo. Nem de perto nem de longe. Somos até muito estúpidos. Eu espero que estejam a ensinar isto às crianças nas escolas! E que não lhes enfiem ideias malucas nas cabecinhas. A Natureza é muito poderosa. Os animais (“inteligentes” ou não) tendem a agir em acordo com o seu instinto. Uma pessoa tem que contar com isto. Tem que se precaver. Porque se se parte de pressupostos errados… e se está a contar com a reacção da “espécie inteligente”, a coisa depois corre mal. Se calhar é um defeito que temos. É uma pena. Mas é o que temos. E é com isto que temos que tentar viver o melhor possível.

Eu adorava ter umas asas para voar como um albatroz… ou ser capaz de respirar debaixo de água como uma dourada… Mas não. A Natureza a mim não me deu isso. Deu-me uma cabeça para pensar. Também é fixe. Apesar da minha tremenda ignorância, e de também não estar completamente satisfeita com o grau de inteligência que me foi atribuído… Mas pronto.

Se nós nos tornamos “inteligentes” foi por razões de pura sobrevivência animal. E lá porque nos tornamos “inteligentes” pelo processo normal de evolução das espécies, nunca deixamos de ser animais. A Natureza continua a governar-nos. Foi a Natureza quem fez a nossa “inteligência”. A Natureza prevalece, e prevalecerá sempre, além da nossa “inteligência”. Nunca a nossa “inteligência” chegará para se sobrepor à Natureza. O “instinto de sobrevivência” específico da nossa espécie estará sempre acima da nossa “inteligência”. Nunca foi, nem nunca será, doutra maneira. Só a nossa tremenda vaidade é que nos auto-classifica de “superiores” e nos impede de perceber que na perspectiva do aperfeiçoamento das espécies, não há nenhuma diferença entre ter-se uma "inteligência” ou umas "asas", isto é, não há nenhuma diferença entre um humano e uma gaivota. Nenhuma. Excepto o facto da nossa “inteligência”, somada à nossa agressividade natural, se ter tornado perigosa para a sobrevivência da nossa espécie (e das outras…).

(O primeiro de um conjunto de três pequenos ensaios a respeito da espécie Homo sapiens sapiens, passando pela economia, política, ecologia, sociologia, biologia, física, matemática, psicologia, filosofia, teologia, design, ordenamento do território, arquitectura, história,... etc..)

abril 22, 2012

troféus...

A posta que no mínimo faço umas cábulas...


Era um casal desavindo e um dia discutiram e o marido atirou a matar, porque lhe acertou no pescoço, mas falhou a intenção e acabou numa prisão por oito anos que já cumpriu.
A pena dela pelo desacerto na escolha de companheiro foi outro tipo de prisão, uma cadeira de rodas, mas para a vida inteira.

Agora ela, a vítima, encontra-se completamente à mercê do agressor e de um seu eventual milagre da regeneração ética e da reinserção social que, surpresa, nunca pagou a indemnização estipulada pelo tribunal.
Agora ela, a vítima, anda a recolher donativos para uma cadeira de rodas eléctrica enquanto o advogado residente do programa explica como ela poderia e deveria reclamar isto mais aquilo a que tem direito pela Justiça, logo a seguir à explicação detalhada da impotência do sistema para proteger as vítimas sem existirem indícios claros da ameaça.
Ou seja, sem acontecer o pior.

E então ela, a vítima, ali esteve, num programa da manhã da RTP1, a tentar o trampolim mediático para a generosidade de sofá, obrigada a assistir à aprendizagem dos outros, ingénuos, acerca da vulnerabilidade absoluta a que o Estado, a Justiça, nós todos, condenamos quem tenha a desdita de vestir a pele do agredido e não a do agressor.

A mim calhou ver a coisa assim de raspão.
E recuso-me a interiorizar essa lição.

abril 20, 2012

Tantos cortes, tinham que dar nisto...


Tom Janssen - PressEurop

Não “curto” áudio-coiso

Eu não quero pagar uma “contribuição áudio-visual” de 4,50€, mesmo que seja com um IVA só de 6%, na minha factura de electricidade.

Pá, não quero, sei lá! Eu nem televisão tenho. Quando me vieram chatear com a coisa da TDT mandei-os para um sítio que aqui não vou dizer e acabei com aquilo. Agora só ouço rádio. Tenho que pagar para ouvir a Smooth FM? Na factura eléctrica? Mas porquê? Por ligar o rádio à tomada?

Está bem que ninguém me perguntou nada. Mas não sei… A mim não me apetece pagar… Alguém aí quer pagar para isto? Eu não. Antes quero pagar para a conservação do Ceratotherium simum cottoni, que fiquei muito sensibilizada com o problema desta espécie, e então gostava que pusessem dez guardas bem armados de volta de cada um dos últimos exemplares. Aparecendo algum caçador furtivo (ou outro), zupa com um balázio.

Agora… “contribuição áudio-visual” na factura eléctrica não “curto”. “Curto” galinhas. “Curto” rinocerontes. “Áudio-coiso”, não “curto”. (Quer dizer… não posso afirmar com toda a certeza porque não sei o que é... mas, pelo sim, pelo não, à cautela, não “curto”).

abril 17, 2012

Era uma vez um rei de porcelana numa loja de elefantes


Séculos atrás a existência era vivida em diferentes planos, em diferentes dimensões, em função do grupo em que as pessoas se inseriam. Era o clero, poderoso por controlar o conhecimento e assim manipular a seu bel prazer a opinião pública desses dias, era a nobreza, poderosa por controlar o dinheiro e a esmagadora maioria dos bens imóveis, ambas ainda mais poderosas por partilharem a gestão política, e depois havia o povo, esmagadora maioria, que dava jeito para trabalhar e para guerrear quando convinha a quem mandava.
Carne para canhão, em termos práticos.

Nos nossos dias vendem-nos a ideia de que as coisas mudaram. Acabou a monarquia, acabou a nobreza e o clero já conheceu melhores dias em matéria de influência.
O problema é que não acabou uma coisa chamada dinheiro. Pior ainda, não acabou e escasseia imenso entre a esmagadora maioria, o povo, algo de muito eficaz para despertar consciências.
De repente percebemos todos, não há como uma crise a sério, que regressaram os dias em que a sociedade se dividia em classes, em castas, em elites, em autênticas cortes a quem passam ao lado os dramas populares, as aflições dos pelintras a quem espremem as poupanças e o resto como um xerife de Nothingham gigantesco, seja pela via fiscal ou pela via tradicional que sempre consistiu na desfaçatez oportunista por parte de quem tem que é quem pode, neste tempo como em qualquer outro.

Os galhos e os macacos

A existência volta a assumir de forma descarada as tais dimensões distintas em função dos grupos em que nos inserimos, com a liderança confiada a quem presumimos capaz de entender as dificuldades dos outros e de, enquanto modelos a seguir, adaptarem a sua conduta à conjuntura para exibirem algum tipo de solidariedade, a que se puder beber a conta-gotas do maior recato por parte dos que mandam.
Depois de ouvir o Primeiro-Ministro, o nosso, a divulgar aos microfones a sua certeza nas férias do costume, tudo como dantes no seu casulo livre de sobressaltos no final de cada mês, fiquei com a clara noção de que aflição é um conceito relativo no patamar em que, eleitores, povo, colocamos meia dúzia de nós para nos valerem com a sua sabedoria, a sua capacidade decisória mas também a sua sensibilidade para os problemas alheios que, por inerência de funções, deveriam abraçar como seus.
Não abraçam.

O nosso PM, que no meu bairro do Charquinho faria parte do que apelidávamos de betinho ou betoso, é igualmente totó e por isso expôs a sua vidinha santa num raro momento de sinceridade de inspiração balnear e percebemos todos que a crise a sério não passa por ali.
Contudo, aqui ao lado os vizinhos não estão a passar melhor. Com um quinto da força de trabalho desempregada e com as finanças a resvalarem para o alcance do afiado cutelo dos especuladores e agências de rating os espanhóis, os que são povo, esperariam dos seus líderes o mesmo que nós: apenas um nadinha de pudor.
Será melhor esperarem sentados, pois enquanto a esmagadora maioria vê fugir o chão sob os pés sua majestade, a deles, meteu os seus pelas mãos e espalhou-se ao comprido na savana onde podia andar a caçar gambuzinos ou outra actividade mais na onda do chá de caridade mas entendeu, presidente honorário de uma associação ambientalista, andar a caçar elefantes à conta do povo aflito para lhe sustentar tais vícios.

Com esta história dos elefantes é natural que os espanhóis fiquem de trombas, de tal forma ficou à vista o tal universo paralelo por onde deambulam os poderosos enquanto a esmagadora maioria, o tal de povo, sofre as consequências dos desmandos de algumas dessas elites (não apenas ibéricas) que mexem os cordelinhos e fingem fazê-lo pelo bem comum embora apenas quando isso não interfira no jogo de golfe marcado para a mesma semana.

abril 16, 2012

Alguém descobriu as galinhas dos ovos de ouro...

... e nós é que os vamos pagar!


Excertos da notícia de capa de hoje no jornal i:

"As empresas produtoras de ovos vão ter de abater perto de 3 milhões de galinhas em Julho porque não cumprem uma directiva comunitária que obriga à existência de gaiolas melhoradas, um investimento estimado em 75 milhões de euros. Por causa disso, Portugal passará de exportador a importador.
A directiva não é nova e está em vigor desde Janeiro deste ano, mas como muitos países estavam longe de conseguir cumpri-la, o Parlamento Europeu optou em Janeiro por um “acordo de cavalheiros”, segundo o qual os 13 países em incumprimento teriam mais seis meses para fazer a transição.
Actualmente, Portugal produz 102% dos ovos de que necessita e é exportador, sobretudo para a Alemanha, Inglaterra, França e também Espanha, quer para consumo directo, quer para a indústria. A partir de Agosto, poderá ter de passar a importar 50% das suas necessidades.
Alguns contratos de compra já estão celebrados com países terceiros que não têm condições mínimas comparáveis às que existem em Portugal, o que alguns produtores consideram estranho, tendo em conta as condições exigidas aos produtores da União Europeia.
(...) A proibição de gaiolas “não melhoradas” foi adoptada em 1999, dando aos Estados-membros perto de 12 anos para assegurar uma transição harmoniosa para o novo sistema e aplicar a directiva. No entanto, e até agora, Bélgica, Bulgária, Grécia, Espanha, França, Itália, Chipre, Letónia, Hungria, Países Baixos, Polónia, Portugal e Roménia não alcançaram as metas definidas.
Os que cumpriram, sentem-se lesados e falam em concorrência desleal. Afinal, foram 12 anos de transição e tiveram de fazer investimentos avultados.
A directiva em causa estabelece que todas as galinhas poedeiras sejam mantidas em “gaiolas melhoradas”, com mais espaço para fazer ninho, esgravatar e empoleirar-se. Nos termos da directiva, só podem ser utilizadas gaiolas que prevejam, para cada galinha, pelo menos 750 cm² de superfície da gaiola, um ninho, uma cama, poleiros e dispositivos adequados para desgastar as garras, que permitam às galinhas satisfazer as suas necessidades. 
(...) O eurodeputado Luís Capoulas Santos explicou ao i que “os países nórdicos têm estado pressionadíssimos pela questão dos direitos dos animais, com a qual concordo”, e lembra que os produtores tiveram um período de 12 anos para fazer a transição. No entanto, o ex-ministro da Agricultura do PS concorda que não se devem extremar posições e, até devido às dificuldades financeiras que o país enfrenta, “podia ser concedida uma moratória de alguns meses e o governo deveria considerar prioritários os investimentos nesta área”.
(...) Este ano, verificou-se escassez de ovos no mercado nacional, o que levou os preços no consumidor a subir perto de 60%, atingindo níveis “demasiado elevados, por contraste com o ano passado, em que o preço era muito baixo”, afirmou Paulo Mota, acrescentando que o preço ainda poderá subir 10% a 15%”."

«Coimbra, Aveiro ou Braga, uma desaparece» - Jaime Ramos

Na próxima década a população portuguesa descerá 2%, 200 mil pessoas. Desaparecerá uma cidade: Coimbra, Aveiro ou Braga?
Este cenário é preocupante em toda a Europa. Segundo algumas projecções a Europa perderá 60 milhões de habitantes e terá menos 18 milhões de jovens até 2030.
O INE tem cenários que apontam para que em 2060 Portugal tenha só 8,9 milhões de habitantes, contando com imigrantes, contra os actuais 10,6 milhões, uma redução de quase 2 milhões. Cenário mais grave porque será uma população muito mais envelhecida, com menos jovens, ou seja com tendência para agravar a perda populacional. As pessoas maiores de 65 anos, em 2060, serão um terço da população e os jovens abaixo dos 15 anos serão só cerca de 10 a 12%.
Já imaginaram a quantidade de casas que vão ficar vazias e devolutas? Cafés e restaurantes vazios, táxis parados, cabeleireiros, gabinetes médicos, agências bancárias e de seguros?
Esta descida é o início de uma quebra populacional que se acelerará à medida que se agravar com a morte de idosos, sem substituição por novos nascimentos.
A descida da população acarreta dificuldades acrescidas ao crescimento económico. O Governo (de Sócrates), que há meia dúzia de meses anunciava medidas de apoio à natalidade, decidiu cancelar o prometido, ainda antes da entrada em vigor.
É mais um corte cego. É evidente que há “incêndios” orçamentais para apagar, mas é bom não esquecer que temos de ter sempre novos bombeiros para substituir os que morrem ou se aposentam.
A crise económica agrava a baixa da natalidade ao reduzir a atracção de imigrantes. Nos últimos anos, a quebra de natalidade não se agravou mais porque as famílias imigrantes têm tido uma taxa superior de nascimentos, quando comparada com as nacionais.
Nas crises económicas são os imigrantes que mais sofrem com o desemprego. Alguns são ilegais e possuem uma rede social de entreajuda menos instalada. A crise económica reduz a nossa capacidade de sedução de novos imigrantes e provoca a emigração.

Jaime Ramos
Excerto do livro «Não basta mudar as moscas»

abril 15, 2012

O Português reclama de quê?!

Texto recebido por e-mail, com algumas adaptações (incluindo a "tradução" do Português do Brasil, certamente o país de origem - que também não prima pelo exemplo nestes temas - de quem escreveu este texto):

Postemo-nos frente a um espelho e reflictamos…

"Reclama do Sócrates? Do Victor Constâncio, do Passos Coelho? Do António José Seguro, do Cavaco Silva? Do Mário Soares, do Dias Loureiro? Do Armando Vara? Do Paulo Portas? Do Isaltino Morais? Do Duarte Lima, do Jorge Coelho, do João Jardim? Do Joe Berardo, do Ministério Público? Da Ministra da Justiça? Dos Tribunais? do Procurador Geral da República, dos Autarcas do País? Do Teixeira dos Santos, do Vítor Gaspar? Da CGTP, da UGT? Da Maioria dos deputados no Parlamento? Da Comissão de Arbitragem, do Pinto da Costa, do Valentim Loureiro, ou de outro “canalha” qualquer?

O Português reclama de quê?!

O Português é assim:
Coloca o seu nome num trabalho que não fez.
Coloca o nome de um colega que faltou numa lista de presenças.
Paga para alguém fazer os seus trabalhos.
Saqueia cargas de veículos acidentados nas estradas.
Estaciona nos passeios, muitas vezes debaixo de placas de proibição.
Suborna ou tenta subornar quando é apanhado a cometer uma infracção.
Troca o seu voto por qualquer coisa: praia, futebol, visita ao shopping, passeio, cervejas, etc.
Fala ao telemóvel enquanto conduz.
Usa o telefone da empresa onde trabalha para ligar para o telemóvel dos amigos ("dá-me um toque que eu ligo-te") e assim o amigo não gasta nada.
Conduz pela direita e pelos passeios nos engarrafamentos.
Pára em filas duplas e triplas, em frente às escolas.
Viola a lei do silêncio.
Conduz bêbedo.
Fura filas nos bancos, nas repartições públicas, etc. etc. utilizando-se das mais esfarrapadas desculpas ou mesmo sem se justificar.
Deita lixo nas ruas, nos passeios, nos jardins.
Usa atestados médicos sem estar doente, só para faltar ao trabalho.
Usurpa luz, água e tv por cabo.
Regista imóveis no cartório num valor abaixo do comprado, muitas vezes irrisórios, só para pagar menos impostos.
Compra recibos para abater na declaração das finanças, para pagar menos imposto.
Quando viaja em serviço pela empresa, se o almoço custou € 10, pede factura de € 20.
Comercializa objectos doados em campanhas de catástrofes ou para ajuda a mais necessitados.
Estaciona em espaços exclusivos para deficientes.
Adultera o conta-quilometros do carro para vendê-lo como se tivesse pouca rodagem.
Compra produtos piratas com a plena consciência de que são piratas.
Diminui a idade do filho para que este não pague bilhete ou pague menos.
Leva das empresas onde trabalha pequenos objectos como clipes, envelopes, canetas, lápis... etc. etc. como se isso não fosse roubo.
Falsifica tudo, tudo mesmo... só não falsifica aquilo que ainda não foi inventado.
Quando regressa do estrangeiro, nunca diz a verdade quando o agente da Alfândega pergunta o que traz na bagagem.
Quando encontra algum objeto perdido, na maioria das vezes não devolve...

... e depois quer que os políticos sejam honestos!

Escandaliza-se com a corrupção dos políticos, o dinheiro dos cartões de credito, das despesas nas passagens aéreas e das estadias no estrangeiro...
O Português reclama de quê, afinal?

Então sugiro adoptarmos uma mudança de comportamento, começando por nós mesmos, onde for necessário!
"Fala-se tanto da necessidade de deixar um planeta melhor para os nossos filhos e esquece-se da urgência de deixarmos filhos melhores (educados, honestos, dignos, éticos, responsáveis) para o nosso planeta, através dos nossos exemplos..."
A mudança deve começar dentro de nós, das nossas casas, dos nossos valores, das nossas atitudes."

O sujeito passivo e o emprego, procurado de forma activa

Depois do excelente post publicado pela Didas, dissertando com especial humor sobre o conceito de procura activa de emprego  com que o governo de Lagutrop tenta dourar a pílula e trocar as voltas aos desempregados, cumpre-me dizer também algo sobre o binómio activo/passivo.

Eu sempre me chateei com essa coisa intragável de me chamarem "sujeito passivo" quando assino os papéis para as Finanças. Escorrego logo para as derivas da Didas no que toca às subtilezas de levar ou trazer pacotes. Para as Finanças levamos pacotes do que nos fica a fazer falta, e em contrapartida, trazemos o pacote em marcha de alívio, sempre mais leve, palavra que como sabemos tanto serve para atestar o peso como para conjugar o verbo levar quando a gente já fartinha quer que o gajo leve naquilo que nos fazem levar o tempo todo.

A procura activa de emprego é aquela coisa que deve ser parecida ao Escuteiro que passa o tempo a levar (atenção: levar) as velhinhas de um lado para outro da rua correndo o risco de contaminar a velhinha com a actividade e levar (outra vez levar) com a sombrinha na tola, não por falta de gratidão mas sim pelo facto de a velhinha não querer atravessar a rua.
Assim, estou a imaginar um tipo desempregado, que é no mínimo posto na rua, ou pior levado à esquadra, apenas por ter entrado num supermercado e ter começado a arrumar activamente as prateleiras, a ajeitar os preços ou a trocar alguns produtos do sítio e colocar noutro que segundo ele, seriam mais apelativos, e assim esperando gratidão, teria direito ao ansiado emprego....
 Vistas bem as coisas, e para evitar estes dissabores, a procura activa de emprego é o que fazem muito bem aqueles rapazes que chegando às ourivesarias vão logo direito ao assunto. Para quê tentar arrumar de outra maneira as peças expostas? O ingrato do dono jamais lhes agradeceria. Viram o que aconteceu ao desgraçado do candidato a repositor de supermercado?
Nã.... um gajo verdadeiramente activo na nobre missão de conseguir emprego, tem de ter uma outra estratégia e agir de outra maneira.
Assim sendo, arrumam as coisinhas, que estão convenhamos, sempre muito mal arrumadas nas montras, dentro duns sacos e ala que vão eles: a caminho de dar-lhes um bom emprego....


abril 14, 2012

Pedro Passos Coelho -- Best of 2010-2011

Compilação de declarações do Pedro Passos Coelho antes de assumir o desGoverno de Portugal.
A coerência em pessoa!

«Uma questão de semântica» -pela Didas

"Eu acho que o governo devia explicar o que é que quer dizer com essa história de «procura activa de emprego». Bem explicadinho, assim tipo numa portaria mas escrito por alguém que não tivesse a mania que é o cagalhão atacado das letras e soubesse alinhavar duas palavras seguidas numa frase, ou seja, por ninguém que tenha escrito leis até hoje. Porque vai que uma pessoa pensa que anda a fazer procura activa de emprego e afinal anda a fazer procura passiva de emprego? Assim do nada, sem saber? Porque os termos activo e passivo são mais ou menos pacíficos em certos campos semânticos, não é? Por exemplo, a gente sabe qual é o que leva no pacote e qual é o que deixa levar, mas assim aplicado à procura de emprego não estou a ver...
E depois pode acontecer que um gajo, além de já ter tido o azar de ficar desempregado, de repente descobre que anda a fazer procura passiva de emprego e ainda lhe cortam a esmola a que eles chamam subsídio de desemprego por causa duma questão de pontos de vista! Por exemplo, os tachistas do governo, quando andaram a fazer por serem escolhidos para o tacho, fizeram-no duma forma activa ou passiva? E como é que se faz? Isso é que era de valor eles explicarem para a malta saber!
A não ser que seja de propósito para de hoje para amanhã nos lixarem como fizeram com o segredo da proibição das reformas antecipadas. Mas eles não eram capazes! Pois não?"
Didas
Blog «Farinha Amparo - a padaria da família»

abril 13, 2012

se calhar...

Se calhar, as teorias da conspiração, em escala global, são excessivas, exageradas.
Se calhar, o mundo iniciou circunvoluções com o eixo mais ou menos inclinado do que aquilo que era suposto.
Se calhar, Deus não existe, mas existe apenas a nossa percepção dele, por maior ou menor carência ou impacto de dose alucinogénea… Se calhar.     
Se calhar, aumentando o número de alunos por turma, ainda se vai abandalhar mais o depauperado sistema de ensino oficial que temos.
Se calhar, o abandalhamento do sistema de ensino oficial que temos vai promover a criação de mais carneiros acríticos e impreparados para tudo o que seja uma carreira profissional, enriquecida por uma sólida base humanista.
Se calhar, criar turmas apenas constituídas pelos melhores alunos de cada escola é uma promoção inconstitucional da formação de elites através do sistema de ensino oficial que temos.
Se calhar, anda uma mão-cheia de vendilhões do templo e da banha-da-cobra, feirantes de ocasião e de assento partidário, ou da obra ou do avental, ou do raio que os parta a todos, a criar um futuro que há-de ser uma mescla de feudalismo, temperado pelos extraordinários avanços tecnológicos, onde estes reizinhos e os seus séquitos viverão iluminados pelas energias que a multidão de escravos ou servos da gleba produzam nos subterrâneos dos seus castelos, empurrando, quais burros em redor da nora, os engenhos medievais, em troca de uma côdea de pão duro e uma malga de água fétida.
Se calhar, já não há castelos medievais e sou eu que estou a ficar balhelhas.
Se calhar, há fantasmas e esta malvada cultura ocidental, aqui e ali acidental, é que anda a iludir-nos, dizendo que não.
Se calhar, o Vítor Gaspar não é o retardado que parece. Nem o Álvaro Santos Pereira é o puto parvo que conhecíamos dos tempos liceais.
Se calhar, o Passos Coelho não é nada diferente do José Sócrates, ainda que não parecesse, a princípio. Para além do estilo, claro. Assim como que um vestido pela Ana Salazar e outro pela Fátima Lopes, mas dois modelos de mau gosto, na mesma exacta proporção.
Se calhar, o Zé Povinho nem é uma boa referência para o homo sapiens da subespécie lusitana desenrascata… mas, se calhar, é nisso em que nos estamos transformando, nuns pobres Zés Povinhos e pobrinhos, brutos, hirsutos, labregos e espertalhóides, de dignidade duvidosa, circunstancial e atípica.
Se calhar, somos. Se calhar sou…
Se calhar, até sou deficiente auditivo e ainda não me avisaram e nada do que ouvi nos noticiários matinais desta sexta-feira, treze, corresponde à verdade no terreno.
Se calhar…

à consideração de todos

Sem qualquer comentário, desnecessário, aliás...

abril 12, 2012

«Quinta Carta às Esquerdas» - Boaventura Sousa Santos

Crónica do meu professor de Ciências Sociais na FEUC, publicada na revista «Visão» de 5 de Abril de 2012:

"Uma decisão democraticamente tomada não pode ser destruída no dia seguinte por uma agência de rating ou por uma baixa de cotação nas bolsas"

"Porque é que a actual crise do capitalismo fortalece quem a causou? Porque é que a racionalidade da “solução” da crise assenta nas previsões que faz e não nas consequências que quase sempre as desmentem? Porque é que está ser tão fácil ao Estado trocar o bem-estar dos cidadãos pelo bem-estar dos bancos? Porque é que a grande maioria dos cidadãos assiste ao seu empobrecimento como se fosse inevitável e ao enriquecimento escandaloso de poucos como se fosse necessário para a sua situação não piorar ainda mais? Porque é que a estabilidade dos mercados financeiros só é possível à custa da instabilidade da vida da grande maioria da população? Porque é que os capitalistas individualmente são, em geral, gente de bem e o capitalismo, no seu todo, é amoral? Porque é que o crescimento económico é hoje a panaceia para todos os males da economia e da sociedade sem que se pergunte se os custos sociais e ambientais são ou não sustentáveis? Porque é que Malcom X estava cheio de razão quando advertiu: “se não tiverdes cuidado, os jornais convencer-vos-ão de que a culpa dos problemas sociais é dos oprimidos, e não de quem os oprime”? Porque é que as críticas que as esquerdas fazem ao neoliberalismo entram nos noticiários com a mesma rapidez e irrelevância com que saem? Porque é que as alternativas escasseiam no momento em que são mais necessárias? 
Estas questões devem estar na agenda de reflexão política das esquerdas sob pena de, a prazo, serem remetidas ao museu das felicidades passadas. Isso não seria grave se esse facto não significasse, como significa, o fim da felicidade futura das classes populares. 
A reflexão deve começar por aí: o neoliberalismo é, antes de tudo, uma cultura de medo, de sofrimento e de morte para as grandes maiorias; não se combate com eficácia se não se lhe opuser uma cultura de esperança, de felicidade e de vida. A dificuldade que as esquerdas têm em assumirem-se como portadoras desta outra cultura decorre de terem caído durante demasiado tempo na armadilha com que as direitas sempre se mantiveram no poder: reduzir a realidade ao que existe, por mais injusta e cruel que seja, para que a esperança das maiorias pareça irreal. O medo na espera mata a esperança na felicidade. Contra esta armadilha é preciso partir da ideia de que a realidade é a soma do que existe e de tudo o que nela é emergente como possibilidade e como luta pela sua concretização. Se não souberem detectar as emergências, as esquerdas submergem ou vão para o museu, o que dá no mesmo.
Este é o novo ponto de partida das esquerdas, a nova base comum que lhes permitirá depois divergirem fraternalmente nas respostas que derem às perguntas que formulei. Uma vez ampliada a realidade sobre que se deve actuar politicamente, as propostas das esquerdas devem ser credivelmente percebidas pelas grandes maiorias como prova de que é possível lutar contra a suposta fatalidade do medo, do sofrimento e da morte em nome do direito à esperança, à felicidade e à vida. Essa luta deve ser conduzida por três palavras-guia: democratizar, desmercantilizar, descolonizar. Democratizar a própria democracia, já que a actual se deixou sequestrar por poderes anti-democráticos. É preciso tornar evidente que uma decisão democraticamente tomada não pode ser destruída no dia seguinte por uma agência de rating ou por uma baixa de cotação nas bolsas (como pode vir a acontecer proximamente em França). Desmercantilizar significa mostrar que usamos, produzimos e trocamos mercadorias mas que não somos mercadorias nem aceitamos relacionar-nos com os outros e com a natureza como se fossem apenas mercadorias. Somos cidadãos antes de sermos empreendedores ou consumidores e para o sermos é imperativo que nem tudo se compre e nem tudo se venda, que haja bens públicos e bens comuns como a água, a saúde, a educação. Descolonizar significa erradicar das relações sociais a autorização para dominar os outros sob o pretexto de que são inferiores: porque são mulheres, porque têm uma cor de pele diferente, ou porque pertencem a uma religião estranha. "
Boaventura Sousa Santos

abril 11, 2012

«Não à mudança de hora... na Europa!»



Ai a Assembleia da República indeferiu liminarmente a nossa petição «Não à mudança de hora», porque "a regulação da Hora Legal é feita a nível europeu, limitando-se Portugal a cumprir as Directivas sobre a matéria"?
Então seguiu hoje uma petição, em meu nome individual, para o Parlamento Europeu. E já tenho a confirmação de recepção:
 "Pétition envoyée par Sr. João Paulo Calheiros Proença de Moura
Acusamos recepção da sua mensagem. Responderemos assim que possível.
Coordenadas
Gênero: Sr.
Apelido:  Proença de Moura
Nome próprio: Paulo
Nacionalidade: portuguesa
Endereço postal: Rua xxxxx
Código postal: xxxxx
Cidade: xxxxx
País: Portugal
Informações relativas à petição
Caso a Comissão das Petições declare a sua petição admissível, autoriza que a mesma seja apreciada publicamente? SIM
Autoriza que o seu nome seja inscrito num registo público, acessível através da Internet? SIM
Título da sua petição: Não à mudança de hora
O signatário vem expor e peticionar o seguinte:
A) Petição
A mudança de hora – feita duas vezes em cada ano – provoca problemas à saúde, ao bem-estar e à segurança das pessoas. Não estando demonstradas e não sendo indiscutíveis as vantagens económicas resultantes deste procedimento, a mudança de hora (“Hora de Verão”) deve deixar de ser efectuada em Portugal e na Europa.
B) Fundamentação
[...]
Assim sendo, parece-nos ser do mais elementar bom senso terminar com os procedimentos de mudança de hora em Portugal e na Europa."

Et voilà. Agora aguardemos.

A Assembleia da República indeferiu liminarmente a nossa petição «Não à mudança de hora»

Ai nós achávamos que Portugal tinha algum pedacinho de soberania?!
A Assembleia da República despachou a nossa petição:

Petição Nº 113/XII/1
Não à mudança horária.
Texto da Petição [formato PDF]

Entrada na AR:  2012.03.26
N° de Assinaturas:  276
Situação:  Concluída
1° Peticionante:  João Paulo Calheiros Proença de Moura
Comissões a que baixou:

XII - Comissão de Economia e Obras Públicas
Indeferimento Liminar
Arquivada em:  2012.04.04
Situação na Comissão:  Concluída
(Nota de admissibilidade) [formato PDF]


Já entenderam então por que motivo a petição foi indeferida?
É que "a regulação da Hora Legal é feita a nível europeu, limitando-se Portugal a cumprir as Directivas sobre a matéria".
Indo eu, indo eu, p'ró Parlamento Europeu...

abril 10, 2012

o faz-de-conta que se governa

Podemos ou não podemos pré-reformarmo-nos? É um direito ou não é (ou era)?
Independentemente das amarguras económico-financeiras que tal possa acarretar-nos, eu tenho para mim que é um direito, sim senhor. Não um «direito adquirido» mas sim um direito contratualizado, construído laboriosamente, conquistado a trabalho diário e prestações pagas regularmente ao Estado.
Mas isso assim seria se não vivêssemos num sórdido período de faz-de-conta-que-nada-serviu-de-nada, onde os nossos eleitos mandantes se sentem como peixe na água… E quando não sentem, mudam as leis, mancomunando-se uns com os outros para que tudo fique com um arzinho pestilencial de «legalidade democrática» e logo passam a ficar à vontade.
Já adivinharam: estou a referir-me às declarações do actual primeiro ministro pelas quais soubemos que ele não suscitou a discussão pública sobre as razões que levaram à actual proibição de «meter os papéis» para a reforma antecipada apenas e tão só para evitar uma corrida às pré-reformas por parte dos eventuais interessados, o que perturbaria o bom funcionamento das instituições. A tanto chegou a desfaçatez. Nem ser sério, nem o parecer; mas assumir a esperteza saloia, assim chamada.
Poderia discorrer sobre os malefícios de se passarem atestados de menoridade e de vil oportunismo ao bom povo, dando de barato que quem o fizesse estaria a exercer apenas o tal legítimo direito que lhe assistiria por vivermos num estado de direito – o que não acontece, de facto, isso de vivermos num estado de direito.
Não, vivemos num estado de sítio, num estado em mau estado, num estado vilão e interessado nas prebendas que se auto-distribui, sem rei, nem roque, nem presidência da República, nem tribunais, nem poderes institucionais e outros que tais que representem o povo ou, no limite, representem a salvaguarda do tal suposto e utópico «estado de direito».
Não há estado de direito, em boa verdade, quando, à menor contrariedade técnica, se muda a lei, se revoga um despacho, se adultera o sentido e conteúdo de uma portaria com outra que se sobrepõe àquela, sem pedir licença a ninguém.
Paradigmático exemplo é, nomeadamente, o caso do Acordo (?) Ortográfico.
Fascizante é, pois, o único termo que me ocorre, por muito que se queira invocar o «flagelo da crise», o espectro do memorando da trika, ou o papão da fome. E não há argumentos de «maioria parlamentar» que me iludam ou façam mudar de ideias.
O culto da aldrabice ligeira, sem qualquer requinte, sequer, de simulação instituiu-se na política portuguesa governativa onde, claro, são todos gente séria até prova em contrário.
De  facto, só mesmo os (des)governados recebem roda de tratamento como rematados vigaristas, independentemente das provas que em seu favor abonem e que estão cavadas muitas e sobejas vezes em fundas rugas de desespero que vão abundando no nosso país.  
Deve ser interessante e curioso governar-se assim. Mas, não sei porquê, felizmente há muito tempo que tal fato não me assenta – note-se que aqui é fato, mesmo, do que se fala, aquele que os nossos irmãos brasileiros chamam terno. O terno (outro) que esta gajada nunca mais dá nem há quem lho faça dar.   
Lá me dirão que é fastidiante tanto moralismo e manias de ética… Dirão o que quiserem. A verdade é que eu não me governo com isto. Nem a fazer-de-conta.
 

abril 08, 2012

«A sustentabilidade da segurança social» - Jaime Ramos

Não posso deixar de considerar ridículos aqueles que fazem discursos sobre a sustentabilidade a prazo da segurança social. Acreditam que vão mandar no futuro…
Os mesmos que em 2009 anunciaram apoios à natalidade, que em 2010 arranjaram uma desculpa para não cumprir, têm a ilusão que acreditamos nas suas promessas para daqui a dezenas de anos. São risíveis.
Vivemos num sistema em que são os trabalhadores activos que pagam as pensões dos reformados. Independentemente do que agora pensarmos ou decidirmos, serão as pessoas que cá estiverem, dentro de 20, 30, ou 40 anos, que decidirão como vai ser.
As decisões sobre as regras futuras vão ser competência de quem na altura mandar, tendo em consideração que, sem contribuintes disponíveis para pagar, não haverá distribuição possível.
Se houver um número suficiente grande de trabalhadores activos, estes poderão estar disponíveis para suportar o número de reformados, que se advinha crescente. Se o número de pessoas jovens, activas, não for suficiente, simplesmente não haverá gente para custear o sistema de aposentações, implicando um corte claro nas expectativas criadas.
Não vou analisar a questão do modelo de financiamento a longo prazo da segurança social. Sei que vai competir a quem cá estiver, no futuro, essa decisão.
Sugiro a leitura do livro “Como Financiar a Segurança Social no Século XXI”, de José Veludo, trabalho para a tese de mestrado de sociologia, da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, editada pela ANET, Associação Nacional dos Engenheiros Técnicos. É uma análise lúcida da problemática do financiamento da segurança social.
O actual sistema português assente na Taxa Social Única, suportada pelas empresas e trabalhadores, é injusto porque sobrecarrega as empresas que mais empregam. É um modelo pensado em meados do século passado que deve ser revisto. As empresas de mão-de-obra intensiva, como é a maioria das micro, pequenas e médias empresas portuguesas, são fortemente penalizadas. São estas que sustentam a segurança social bem como os seus trabalhadores.
As empresas com grande facturação e lucros elevados pouco contribuem para a sustentabilidade da segurança social, o que é profundamente injusto.
É legítimo que os trabalhadores aspirem a ter uma aposentação, após uma vida de trabalho, que lhes permita continuar a viver com um nível semelhante ao que possuíam quando trabalhavam.
Alguns poderão fazer investimentos que lhes possam garantir as rendas suficientes. Outros conseguirão poupar o suficiente para depositar na banca esperando que um qualquer crash bolsista não lhes destrua, num momento, o mealheiro. A maioria acredita nos políticos e na solidariedade intergerações. Como ao longo da sua vida de trabalho têm andado a sustentar aqueles que estão aposentados, esperam no futuro que as crianças e os jovens de hoje venham a contribuir com impostos ou taxas para a sua reforma.
Não tenho dúvida num ponto. A garantia de que as pessoas de maior idade vão ser tratadas com dignidade estará mais assegurada se o sistema da Segurança Social se mantiver gerido pelo Estado.
Se o processo passar para as mãos dos grupos financeiros, como agora se adivinhou na presente crise, nada estará garantido.
A banca é excelente a gerar lucros, a partir e repartir ficando com a melhor parte, mas basta um ligeiro sopro na confiança do sistema para não haver liquidez.
A banca mundial, se não fosse a intervenção dos estados, tinha falido só porque algumas famílias de americanos remediados deixaram de pagar umas prestações relativas aos empréstimos para casa própria.
Falar da sustentabilidade impõe também a obrigatoriedade de se evitar despesas exageradas, como são as pensões milionárias. Não é admissível que um Estado humanista, assente numa cultura de base cristã, tolere pagar a alguns privilegiados pensões, reformas ou aposentações excessivas e em simultâneo apregoar que não tem o suficiente para pagar valores mínimos dignos às pessoas comuns. Urge que se crie um tecto máximo para as reformas e aposentações pagas pelo Estado e que não poderão exceder o valor de 14 vezes o valor da pensão mínima.
Criando esta relação veremos que as elites aposentadas pelo Estado estarão interessadas em combater de facto a pobreza exigindo que os pobres, recebedores da pensão social mínima, sejam aumentados.
Com o sistema actual, de uns a receber muito e outros demasiado pouco, os primeiros falarão dos segundos como uns malandros, esquecendo que na sua maioria estes trabalharam uma vida ou sofrem de doenças ou acidentes que os impediram de uma vida contributiva.
A ideia de justiça social impõe a obrigatoriedade de um tecto nos salários públicos e de um limite nas reformas pagas pelo Estado.
Qualquer análise das pensões pagas aos ex-funcionários públicos revela uma grave discrepância entre os valores que estes recebem da Caixa Geral de Aposentações e aquilo que é pago pela Segurança Social aos trabalhadores reformados pelo regime geral.
Não é tolerável que esta injustiça continue.

Jaime Ramos
Excerto do livro «Não basta mudar as moscas»