dezembro 24, 2014

Natal, mesmo de improviso...

A todos, 

Acabei de ler uma intensa sugestão de Natal no blog Relógio de Pêndulo, do meu amigo Herético:


que, também intensamente, vos recomendo.

Já leram? E, então, que tal...? 

Natal é, pois, como fica claramente documentado nesta exemplo, aquilo que o nosso olhar apura, o que as nossas mãos constroem, o abraço que perseguimos e obtemos.

Tudo aquilo que, por outro lado, indecentemente, nos cerca e avassala:  ricardos, antónios diversos, josés de manjedouras, coelhos e outras alimárias congéneres, portas fechadas ou cavacos mal passados no fogo primordial, a desarrumação dos dias e a ansiedade das noites, nada disso vai além da muito efémera existência... por muito que perturbe a nossa única e imprescindível existência.

É, pois, também por aquele olhar que, em redor da minha mesa de Natal, eu sei que todos os lugares estão preenchidos. Nalguns casos por memórias. Noutros mais por seres viventes. Mas todos entoando os cânticos necessários e urgentes que sempre ajudam a confortar espíritos.

O Herético, da lisura da sua «alma ateia», ouviu o Gloria in Excelsis Deo. Não posso deixar de estar de alma absolutamente solidária com a dele. 

Quem quiser, faça o favor de se chegar ao grupo. E este Natal terá, certamente, outra graça.

Boas festas!


dezembro 22, 2014

«A III Guerra Mundial» - Boaventura Sousa Santos

Tudo leva a crer que está em preparação a III Guerra Mundial. É uma guerra provocada unilateralmente pelos EUA com a cumplicidade ativa da UE. O seu alvo principal é a Rússia e, indiretamente, a China. O pretexto é a Ucrânia. Num raro momento de consenso entre os dois partidos, o Congresso dos EUA aprovou no passado dia 4 a Resolução 758, que autoriza o Presidente a adotar medidas mais agressivas de sanções e de isolamento da Rússia, a fornecer armas e outras ajudas ao Governo da Ucrânia e a fortalecer a presença militar dos EUA nos países vizinhos da Rússia. A escalada da provocação da Rússia tem vários componentes que, no conjunto, constituem a segunda guerra fria.
Os componentes da provocação ocidental são três: sanções para debilitar a Rússia; instalação de um governo satélite em Kiev; guerra de propaganda. As sanções são conhecidas, sendo a mais insidiosa a redução do preço do petróleo, que afeta de modo decisivo as exportações de petróleo da Rússia, uma das mais importantes fontes de financiamento do país.
Esta redução trará o benefício adicional de criar sérias dificuldades a outros países considerados hostis (Venezuela e Irão). A redução é possível graças ao pacto celebrado entre os EUA e a Arábia Saudita, nos termos do qual os EUA protegem a família real (odiada na região) em troca da manutenção da economia dos petrodólares (transações mundiais de petróleo denominadas em dólares), sem os quais o dólar colapsa enquanto reserva internacional e, com ele, a economia dos EUA, o país com a maior e mais obviamente impagável dívida do mundo.
O segundo componente é o controlo total do Governo da Ucrânia, de modo a transformar este país num estado satélite. O respeitado jornalista Robert Parry (que denunciou o escândalo Irão-contras) informa que a nova ministra das Finanças da Ucrânia, Natalie Jaresko, é uma ex-funcionária do Departamento de Estado, cidadã dos EUA, que obteve cidadania ucraniana dias antes de assumir o cargo. Foi até agora presidente de várias empresas financiadas pelo Governo norte-americano e criadas para atuar na Ucrânia. Agora compreende-se melhor a explosão, em fevereiro, da secretária de Estado norte-americana para os assuntos europeus, Victoria Nulland: "Fuck the EU." O que ela quis dizer foi: "Raios! A Ucrânia é nossa. Pagámos para isso."
O terceiro componente é a guerra de propaganda. Os grandes media e seus jornalistas estão a ser pressionados para difundirem tudo o que legitima a provocação ocidental e ocultarem tudo o que a questione. Os mesmos jornalistas que, depois dos briefings nas embaixadas dos EUA e em Washington, encheram as páginas dos seus jornais com a mentira das armas de destruição massiva de Saddam Hussein, estão agora a enchê-las com a mentira da agressão da Rússia contra a Ucrânia.
Peço aos leitores que imaginem o escândalo mediático que ocorreria se se soubesse que o Presidente da Síria acabara de nomear um ministro iraniano a quem dias antes concedera a nacionalidade síria. Ou que comparem o modo como foram noticiados e analisados os protestos em Kiev em fevereiro e os protestos em Hong Kong das últimas semanas. Ou ainda que avaliem o relevo dado à declaração de Henri Kissinger de que é uma temeridade estar a provocar a Rússia.
Outro grande jornalista, John Pilger, dizia recentemente que, se os jornalistas tivessem resistido à guerra de propaganda, talvez se tivesse evitado a guerra do Iraque em que morreram até ao fim da semana passada 1.455.590 iraquianos e 4801 soldados norte-americanos. Quantos ucranianos morrerão na guerra que está a ser preparada? E quantos não-ucranianos?
Estamos em democracia quando 67% dos norte-americanos são contra a entrega de armas à Ucrânia e 98% dos seus representantes votam a favor? Estamos em democracia na Europa quando uma discrepância semelhante ou maior separa os cidadãos dos seus governos e da Comissão da UE, ou quando o Parlamento Europeu segue nas suas rotinas enquanto a Europa está a ser preparada para ser o próximo teatro de guerra e a Ucrânia a próxima Líbia?

Boaventura Sousa Santos

Artigo da revista «Visão» disponível aqui.

dezembro 09, 2014

A posta que não ouves

O sentimento de revolta é um dos que mais mobilizam qualquer pessoa. Seja provocado por motivos plausíveis ou apenas fruto de um raciocínio mal formulado, ou mesmo de um erro de interpretação, desenvolve-se como um tumor maligno enquanto persistir a questão que lhe deu origem.
De entre as revoltas possíveis, a revolta surda é potencialmente a mais nociva. Sobretudo porque tende a emudecer.

O cliché da panela de pressão veste como uma luva qualquer descrição da revolta surda enquanto factor de perturbação. A pessoa acumula essa força interior mal contida, absorve cada sinal, cada confirmação, nem sempre fidedigna, da legitimidade da sua ira. A pessoa ou o país.

É sempre de estranhar quando alguém, ou um povo, sente na pele o efeito de injustiças que se somam às provocadas por um rácio desfavorável entre a sorte e o azar e opta por refilar em surdina.
Aos poucos, a revolta surda vai exprimindo o seu paralelo com um vulcão. São pequenos abalos sísmicos, desabafos soltos aqui e além, aumento da concentração de gases perigosos, a mente a abdicar da racionalidade sem se aperceber. Indicadores a que poucos atribuem relevância e afinal são gritos de alerta para a iminência de uma erupção.

A revolta surda não sabe falar. A sua linguagem é equivalente à de uma granada de mão. Aparentemente inofensiva até alguém lhe puxar pela cavilha e o inferno acontecer, o caos espelhado em estilhaços aleatórios que atingem quem estiver mais a jeito.
Alimenta-se a si própria, sem controlo, uma vez deixada à solta na razão. E é essa a primeira vítima do massacre subsequente à revolta engolida quando a sua natureza é ser cuspida nem que sob a forma de um palavrão.

São poucas as escapatórias encontradas por alguém, ou uma população, na lógica que noutras formas de revolta acaba por prevalecer.
A revolta surda, por se sentir amordaçada, é mais eficaz que as restantes na arte de ensandecer.

dezembro 07, 2014

A política e o domingo

SOARES FAZ 90 ANOS
Devo dizer que nunca coloquei a cruz no seu nome, mas vejo o evidente:
Hoje, as televisões abriram o jornal da uma todas com a mesma notícia. Olhando para as imagens, vemos gente de todos os quadrantes políticos a felicitá-lo. Gente que, como ele, já apresenta provecta idade e as cãs da vida pública dedicada. Serão todos bons? Será o aniversariante bom? Talvez não, mas lá estavam aqueles que nas épocas de menor segurança abandonaram a sua área de conforto e lutaram por ideais, muitas vezes antagónicos, mas, na sua mente, os ideais de um Portugal melhor.
Frequentemente se criticam as senilidades desta geração; porém, se não tivessem sido eles, estes jotinhas que hoje nos governam pugnariam todos por ideias da União Nacional e da Mocidade Portuguesa.
Uma geração que não sabe respeitar a memória dos mais velhos não merece ser recordada no futuro. Há algumas múmias que não se fizeram representar e outros cachopos que assobiam para o lado, mas quando fizerem os seus 90 anos, nada mais terão a seu lado que a enfermeira do Lar e um ou outro familiar dedicado. É esta a lição da vida.


E O SENHOR VOTA EM QUEM?
Desde as minhas aulas de 10º ano, na disciplina de Noções de Administração Pública, que ainda não compreendi nem aceitei o método de eleição de deputados na nossa república.
Achava muito bem que os deputados fossem eleitos por círculos regionais, para defenderem os interesses dos seus eleitores. Grande engano!
Os deputados da Madeira votaram contra o OGE e vão ser penalizados, incluindo o Vice Presidente da Assembleia. Há uns anos, os deputados de Coimbra do PS e outros que eram professores também votaram contra e foram censurados. Sobre os interesses dos eleitores estão os interesses dos partidos, a disciplina de voto.
Ora bolas. Votar para quê? Que sistema injusto é este. Por exemplo, o círculo eleitoral de Portalegre elege um só deputado (ou PS ou PSD), mas o boletim contempla todos os partidos. Para onde vão os votos nesses partidos? Simplesmente não vão!
Defendo abertamente os grupos independentes de cidadãos que não obedeçam a disciplinas partidárias, assim como defendo o fim dos círculos eleitorais. Deveriam ser os partidos a elaborar uma lista com candidatos de todo o país e os votos cairiam por atacado. Todos os votos seriam úteis e poríamos fim ao desperdício (neste caso, de votos), o que tão bem nos ficaria.

dezembro 05, 2014

Hoje apetece-me ser criminosamente demagógico, ainda que no usufruto pleno da minha constitucionalíssima liberdade de expressão

Colhendo, porventura, o exemplo conspícuo e péssimo de alguns que me governaram (e governam) sem que eu lhes tenha para isso dado aval, mas porque assim funciona a nossa abençoada e, acima de tudo, querida Democracia.

E o caso é que vi e ouvi com estes meus apêndices sensoriais que me consta que a terra há-de comer, coadjuvada por uma miríade de pequenos seres subterrâneos – e, ainda assim, mais preclaros que os tais que me governaram e governam, diga-se... – enfim, vi e ouvi, ontem, em programa televisivo dedicado à actividade prolífica a que se dedicam os estudantes do Erasmus por essa Europa afora, coisa de espantar!

Eis a coisa:

Uma jovem portuguesa, em pleno recurso ao Erasmus e em diáspora por terras alemãs, tomou-se de amores por aquele que se lhe revelou o amor da sua vida – a quem apresento as minhas incomensuráveis desculpas por não ter retido a respectiva nacionalidade – e, como acontece muitas vezes nestas conjugações astrais, a coisa precipitou-se na confecção bilateralmente arquitectada de um pimpolho.

Até aqui, nada de especial, para além de este pimpolho integrar cerca de um milhão de outros pimpolhos gerados com o favorecimento do Erasmus – que se revela, assim, um poderoso estimulante erótico e procriador, propiciador do enriquecimento e refrescamento genético da velha Europa, que anda tão necessitada disso como de muitas outras  coisas, aliás.

Ainda nada de espectacular, convenhamos.

Mas eis senão quando a jovem, disfrutando de umas férias em Portugal, nos revela, em entrevista, o seguinte – e parece-me que não deixei escapar migalha:

- Após ter encontrado um emprego na Alemanha, eventualmente lançando mão da formação superior obtida no país dos atrasados que somos nós, e antes do aparecimento do pimpolho, mas depois de ter encontrado o amor da sua vida, segundo percebi, já, portanto, contando o casal com uma estabilidade razoável (o que, em Portugal, é circunstância proscrita e só atingível por treinadores de clubes de futebol de primeira água) com casinha montada, estabilidade emocional e tal, lá chegou a vez do projecto parental, em conformidade com a ordem natural das coisas.

Mãos e outras anatomias lançadas à obra e filho feito, a jovem trabalhadora alemã, ainda que de nacionalidade portuguesa, vê cairem-lhe ao colo e só porque as regras assim mandam lá por essas terras longínquas, 3 (três) anos de licença de parto, com remuneração por inteiro, a que o nobre e avisado estado alemão acrescenta, em termos de abono de família e pela existência do acima referido filhote, 400 – digo bem – , quatrocentos euros por mês.  

Ou seja, se percebi bem, o estado alemão remunera por um filho o que, em Portugal, o nosso estado considera justa remuneração por um mês de trabalho, a quarenta horas por semana.  
  
Se presumirmos – e só mesmo por presunção, claro – que a jovem não estava a enfiar-nos um barrete por bem intencionado que fosse e que, pelo contrário, nos relatava a pura das verdades com quantos dentes tinha na boca, eu quedei em estado semicomatoso do qual ainda não recuperei completamente...

Quantas Europas há por esse mundo fora sem me avisarem? A quantos anos-luz estamos para aqui destas realidades europeias?


E, cuidado, que se algum palerma me vier dizer que a questão reside na produção desigual de riqueza entre os dois países e porque é dado consabido e adquirido que os trabalhadores portugueses são universalmente tidos como dos melhores desse mesmo universo e arredores, eu fico capaz de assassinar o primeiro gestor da coisa privada como da pública, governantes incluídos, que me apareça pela proa!

novembro 28, 2014

elevação do cante...

a património imaterial da humanidade gera as primeiras reacções
Raim on Facebook

novembro 27, 2014

O julgamento paralelo de José Sócrates

A “Justiça” não é capaz de informar a sociedade.
Supõe-se viver fora e acima dela. Nos astros.

As Escrituras narram a parábola de Maria Madalena. Os fariseus, em magote, trouxeram-na à presença do Senhor. Que a condenasse pelos seus muitos pecados. O Senhor atentou na dignidade humana de Maria Madalena. Ouviu-a. Depois, ditou sentença.

As questões da Justiça são políticas. Os tribunais exercem um poder soberano. O exercício dessas funções é, por natureza, político.
Se os políticos nos transmitem que se não intrometem com o poder soberano dos tribunais, teremos de responder que se trata de mera tautologia.
Falam por falar.
Não se quadram nem apreciam o silêncio.
Exigem e esperam decisões céleres e justas.

Directa ou implicitamente, conforme interesses, também partidários e políticos, responsabilizam o que chamam “A Justiça” pelo processamento lento do sistema judicial. Desleixam a Justiça no investimento que não fazem no sistema. Tratam o poder judicial com displicência. Um poder soberano menor. Provocam, por confrangedora incompetência, sem consequências políticas, a paralisação do sistema.
Só se lembram da Justiça quando ela lhes bate à porta.
O “país político”, dizem, fica longe da Justiça.
Não devia ficar.
Todos somos “país político”.
A Justiça também.
Vivemos na civitas.
A Justiça diz respeito ao Estado de direito.
A política também. Nelas, todos somos parte interessada com dever de participar.
O “país político” nada explica sobre a Justiça.
É com outros.
O poder judicial pouco ou nada explica.
A Justiça é para dentro.
Com ele.
Está ainda colado a metodologias tradicionais e arcaicas.
Subestima o direito à informação da comunidade.
Não sabe comunicar. Defende-se.
Fecha-se.
 O segredo de justiça alomba com todas as responsabilidades de um secretismo incompatível com a sociedade de informação que é a nossa.

A “Justiça” não é capaz de informar a sociedade.
Supõe-se viver fora e acima dela. Nos astros.

Nem está preparada para comunicar.
Vive para dentro. Ignora como separar sigilo do que deve ser público.
Receia a comunicação social.
Só interage às ocultas. “Julgar em nome do povo” transmuda-se em fraseologia gratuita.
Retórica.
Os gabinetes de imprensa do Ministério Público produzem comunicados secos e irrelevantes.
Sacralizam o sistema.
Separam-no da comunidade.
Blindam-no.
A comunicação social apossa-se de toda a informação pública. É ostracizada pelo sistema judicial. Como um adversário temível. Transmite verdades e inverdades. Factos e aparência de factos. Massacra dias inteiros a reproduzir as mesmas coisas ad nauseam. Fomenta juízos de valor sobre pessoas e factos que ignora em toda a amplitude.

Os arguidos são sujeitos a julgamentos paralelos.
 O segredo de justiça, imposto pelas normas do julgamento legal, impede-os de usar o contraditório no julgamento da rua. Ninguém os leva, com o arrolamento dos “pecados”, à presença do Grande Júri.
São apedrejados.
Culpados.
Não há direitos de defesa, nem presunção de inocência que lhes valham.

Confunde-se Justiça com justicialismo.
São condenados antes de julgados.

E depois?
Depois, a ninguém assiste o direito de desrespeitar a dignidade da pessoa humana.

Procurador-geral adjunto

artigo publicado no público

posted by Charlie

novembro 25, 2014

«O que diz Calimero» - António Pimpão

Quem se não lembra daquele pintaínho preto dos desenhos animados, sendo louros os seus irmãos, que ainda tinha metade do ovo a servir-lhe de chapéu, e cujas infelizes histórias sempre terminavam com ele a dizer: “Não há justiça! Não há justiça! Abusam porque sou pequenino”?
Ocorreu-me esta imagem a propósito do estado da nossa justiça.
Sempre que são apontados os constrangimentos ao investimento estrangeiro em Portugal, o estado da justiça, com a sua morosidade e imprevisibilidade, aparece invariavelmente à cabeça.
Creio não haver dúvidas de que todos sentimos que a justiça portuguesa é um problema sério, sendo inexplicavelmente demorada, errática, injusta e soberba, consumindo consideráveis recursos financeiros do orçamento sem resultados palpáveis correspondentes. E parece ser irreformável.
Os agentes da justiça são dos servidores públicos mais bem remunerados do país – basta consultar no DR as listas dos aposentados e respetivas pensões de aposentação, em que os juízes e magistrados surgem invariavelmente à cabeça -, usufruem de privilégios únicos e excessivos (só podem ser “julgados” pelos seus pares e, por isso, corporativamente intocáveis; só podem ser presos em flagrante delito; não são abrangidos pelas reduções salariais aplicadas aos restantes servidores públicos, …).
Ao arrepio das restantes funções do estado, em que, por força dos contactos com o exterior, estas vão conhecendo e acompanhando as melhores práticas, e por isso se modernizam, a justiça permanece fechada, provinciana, deslocada no tempo, como se ainda estivéssemos na idade média, exigindo dos cidadãos um tratamento submisso e rebaixador (basta atentar na exigência de responder à chamada às 9 horas e, depois, esperar pacientemente nos corredores dos palácios da justiça para se ser ouvido e, muitas vezes, isso nem chega a suceder, sem qualquer aviso, ou, ainda, os inexplicáveis e sucessivos adiamentos).
Estabelecendo um paralelo com a atividade empresarial, é como se a justiça se ocupasse de uma atividade não transacionável, ou seja, virada para o mercado interno, sem contacto com o exterior, enquanto a generalidade dos restantes serviços exerce atividades transacionáveis, ou seja, voltadas para o exterior, sujeitas à concorrência e, logo, ao aperfeiçoamento.
Os resultados da máquina da justiça têm sido desproporcionadamente inferiores aos meios disponíveis e ao dinheiro que gasta, além de que, muitas vezes, as decisões, quando finalmente são tomadas, já não podem, pela sua excessiva demora, produzir qualquer efeito, seja dissuasor, corretor ou reparador.
Nos últimos anos, com recurso à comunicação social e através de bem dirigidas fugas de informação, a justiça tem vindo a promover o julgamento dos suspeitos na praça pública.
Para reforçar a sua posição e induzir-nos à condenação dos suspeitos, vai deixando cair para a comunicação social informações parciais do processo, que reforçam a condenação pública, sem possibilidade de contraditório, visto que tais acusações não passam de insinuações. Nos casos mais mediáticos, os putativos infratores acabaram sistematicamente por ser absolvidos, geralmente por falta de fundamento da acusação ou insuficiente ou irregular obtenção de provas (para além da operação Face Oculta, não me recordo de outra condenação).
Parece que, consciente da sua morosidade e ineficiência, a justiça optou por compensar isso com julgamentos na praça pública, mais céleres, respaldados e definitivos, pois o suspeito nunca mais recupera a condição de inocente. Veja-se, a título de exemplo, os casos do Apito Dourado, da Casa Pia, do Freeport, de Duarte Lima I ou do “serial killer” português.
Muito embora a justiça portuguesa seja – dizem - excessivamente garantística, a verdade é que essa suposta garantia se perde totalmente com as fugas de informação e o degradante espetáculo montado por todos os órgãos de comunicação social, sem o mínimo pudor ou respeito.
Poderá parecer que este post tem a ver com José Sócrates. E terá, apesar de a intenção inicial ter sido mais genérica.
Não ponho as mãos no fogo por José Sócrates relativamente à presumida acusação; não gosto, mas posso aceitar, a sua detenção à chegada ao aeroporto; mas repudio totalmente a fuga de informação, que só pode ter tido uma origem, que permitiu às TV proporcionar-nos o abutriano espetáculo da sua detenção. E do que se seguiu.
Também me permito estabelecer um paralelismo entre o tratamento dado pelos media a José Sócrates e o dado a Ricardo Salgado, ambos detidos, parece-me, em condições excessivas: enquanto Ricardo Salgado saiu prontamente dos noticiários, apesar de a sua presumida responsabilidade ser incomparavelmente superior à de José Sócrates, este está a ser massacrado e escalpelizado até ao tutano. Eventualmente - especulo - porque a comunicação social, além de recear o retorno de Ricardo Salgado, terá sido por ele profusamente beneficiada, podendo ter telhados de vidro.

António Pimpão

petroleiro embateu...


Raim on Facebook

novembro 24, 2014

«Auto de fé» - António Pimpão

Os autos de fé estão intimamente ligados à Inquisição e consistiam na humilhação pública dos heréticos e punição dos cristãos novos. Os penitenciados eram geralmente estrangulados ou queimados vivos.
Os autos de fé, embora contassem com a presença das autoridades, eram sobretudo um espetáculo para a populaça, que acorria em magotes, tendo durado, em Portugal, entre 1536 e 1820.
As execuções públicas dos Távoras, pelo Marquês de Pombal, tiveram o mesmo perfil, pois se destinaram sobretudo a humilhar a família dos Távoras, acusadas, sem grandes provas, de atentarem contra o Rei e o seu primeiro ministro.
O espetáculo que as diversas televisões nos estão a dar não são mais do que a versão moderna desses irracionais autos de fé: a mesma boçalidade, o mesmo degradante exaltar de sentimentos primitivos, o mesmo gosto pelo sangue, a mesma ligeireza das acusações, baseadas em meras suspeitas, no diz-que -diz, sem provas, a mesma condenação sem julgamento.
Aquilo a que se tem assistido, sem nada se poder fazer, além de gratuito espetáculo, é sobretudo um atentado à democracia e à liberdade.

António Pimpão

novembro 14, 2014

Portugal sob viroses

O BES, instituição-pilar do regime – seja ele qual for, na infinita capacidade adaptativa desta majestosa e aristocrática instituição – foi atacado por um vírus de âmbito conspicuamente familiar e apenas extensivo a escassos e estreitos círculos de relações íntimas, cujo nome científico, ainda não estabilizado, poderá ser denominado o zanga-se-a-comadrella. A comunidade científica tem-se visto grega (logo, com pouco crédito no mercado) para descobrir as fontes do surto epidémico. A doença manifesta-se pelo avassalador enriquecimento dos elementos da família Espírito Santo, enquanto os pais e os filhos da restante trindade deste País assistem, pagando, ao descalabro institucional promovido e aconchegado por quem, por acaso, é chorudamente pago para evitar que estas coisas aconteçam…

Já o governo português, porventura por contaminação dos corredores do poder, com muito menos cuidados de higiene por força dos sucessivos cortes orçamentais e despedimentos na função pública, até no pessoal da limpeza ou principalmente aí, tem sido avassalado por um surto de idiotella, cujos sintomas mais graves e notórios se fizeram manifestar em Pires de Lima, senhor ministro da Economia, em plena Assembleia da República, sintomas esses que se caracterizam por mudança súbita de voz, que se torna infantilmente aflautada, raciocínio errático e de recuo muito limitado, compondo um quadro de esquizofrenia preocupante que, como bem nos lembramos, ocasionou recentemente comportamentos muito análogos, ainda que inconseguidos, por parte da própria presidente da Assembleia. 

Do mesmo modo, a senhora ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, revela avassaladores indícios de mania da perseguição, infundada embora, que se atribui ao mesmo vírus, o qual pode desenvolver desvios comportamentais de diversa índole, mormente quando agravada por recurso a plataformas informáticas – lembremo-nos da esterqueira que se aloja, nomeadamente, nos teclados dos computadores após utilização prolongada (unhas, migalhas de pão, cabelos, clipes usados para escarafunchar ouvidos e/ou outras partes anatómicas…) ou, mesmo, da insegurança e ansiedade digitais geradas pelos écrans tácteis – articulado com reformas estruturais no sistema judicial de tal modo abissais, que nem se lhes vê o fundo…

Estas manifestações desviantes tiveram, como é bem sabido, uma especial incidência no Ministério da Educação, numa deriva que se prolonga há mais de dois meses sem internamentos nem fim à vista.

A Protecção Civil, por seu lado, tem vindo a ser vitimada pelo vírus estranho e perverso denominado empanicadella no seu afã de manter os cidadãos a par daquilo que parece ser uma portentosa e quase diária hecatombe meteorológica… mas afinal nem tanto. A doença manifesta-se na constância e assiduidade de avisos amarelos e laranjas espalhados pelo País de cada vez que cai um aguaceiro em qualquer ponto do dito, passando geralmente ao lado das autênticas trombas de água com que o cidadão comum tem vindo a ser presenteado e para as quais há escasso ou nulo aviso. Prevê-se que em dia de problema sério e generalizado, ninguém lhes ligue nenhuma, pensando tratar-se de mais algum acesso viral naquelas cabecinhas preocupadas…

Por outro lado, a Presidência da República parece infectada por um estranho e incógnito vírus, que leva o seu principal agente a condecorar hoje personalidades por alegados altos feitos para, amanhã, se questionar, meditabundo, sobre a gritante incompetência dessas mesmas personalidades. Há quem lhe chame boliqueimella, mas esta denominação carece de contorno científico… Porém, o cidadão atónito observa que foi apenas há cerca de seis meses, em 10 de Junho, mais propriamente, que Zeinal Bava foi condecorado com a Classe do Mérito Comercial (Grã-Cruz), que se destina a distinguir «quem haja prestado, como empresário ou trabalhador, serviços relevantes no fomento ou na valorização do comércio, do turismo ou dos serviços» pelo senhor presidente da República. Há dias o mesmo senhor presidente questionou o mundo sobre «o que é que andaram a fazer os accionistas e os gestores» da PT»? Lá está…é o vírus!  

Mas um dos vírus que mais me tem atormentado – devo confessá-lo – tem especial incidência no pão nosso de cada dia. No pãozinho, esse mesmo, o que nos acompanha o pequeno-almoço e restantes refeições (para quem as tenha). Um homem adquire um pão na mercearia ou na padaria, no supermercado ou no café do bairro, e o resultado é sempre o mesmo: o pão é um amontoado de buracos. Não se pode fazer dele a bem-aenturada torradinha, nem espalhar uma colherzinha de mel no faneco sem que os ingredientes se escoem por toda aquela imensidão de buracos, onde devia encontrar-se miolo.

Eu tenho muito cá para mim que isto se trata de uma manifestação de panditismo descarado, porventura proporcionado por algum vírus gourmet com especial predilecção pelo miolo do pão e que o deixa todo esburacadinho, coitado. Já me informaram que aquilo era água a mais na massa de padeiro, que propicia um espaventoso aspecto exterior, mas sem qualquer conteúdo, pelo que a dar-se-lhe algum nome científico eu sugeriria, talvez, casa-da-segredella – estão a ver, não estão? Espavento exterior sem conteúdo…  eheheh, esta foi de mestre (de obras).

Hoje mesmo, mal aberto o jornal do dia, e salta a notícia de que diversos elementos ligados ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras terão sido atacados por um vírus de goldella, vírus esse que se manifesta pelo aparecimento intempestivo de chorudas maquias de numerário de proveniência uma vez mais duvidosa e cujo foco infeccioso não é de fácil circunscrição…

E de muito mais haveria a referir, mas não quero incomodar-vos à exaustão.

Mas, agora, num registo sério, pois o que para trás fica dito não passa de um chorrilho de brincadeiras com que vamos sendo lixados, como terão reparado, deixo-vos esta reflexão:

- antes de mais, interessa saber que não me atrevo, por razões claras e óbvias do respeito que me merece o sofrimento alheio, a ser cínico ou, sequer, irónico referindo-me àquela enfermidade que, na zona de Vila Franca de Xira, tem vitimado centenas de concidadãos.

Não posso, entretanto, deixar de considerar, a este respeito, que, se temos um governo que legisla, já em 2013, no sentido de deixar de tornar obrigatórias determinadas auditorias ou inspecções a instalações de empresas privadas cuja actividade é susceptível de gerar subprodutos perniciosos para as populações circundantes, este caso, para além de se tratar de urgentíssima situação de saúde pública, não deixa de ter flagrantes contornos de caso de polícia. Pelo menos, assim me recomenda o senso-comum…


Haverá, ainda, tribunais e sistema judicial (para além de outras minudências…) a funcionar em Portugal ou terá já tudo sido diluído nestas viroses e estamos todos ao deus-dará, como soe dizer-se, e apenas nos resta ir sobrevivendo até ao momento da nossa medieval, desconsolada, desprotegida, indigna e irremediável morte não assistida? 

novembro 13, 2014

Sorteios, concursos, jogos de azar e especulação financeira - isto está tudo ligado!

Praticamente todos os meus amigos sabem a alergia que tenho a jogos de fortuna e azar. Na minha opinião, o estado actual da população do nosso país deve-se, em primeira e última análise, à especulação financeira, a ambição sem limites por ganhar e arrecadar dinheiro e mais dinheiro e mais dinheiro e... já decerto todos perceberam a sequência. E, enquanto a maioria das pessoas critica e se considera vítima dos especuladores, o facto é que essa mesma maioria aceita cair na mesma lógica da ambição, apostando em jogos e joguinhos com vista a... conseguirem ter mais dinheiro.
Vejam o exemplo do Euromilhões, cujo primeiro prémio, por mais baixo que seja, considero ser ofensivo, estúpido e pornográfico. Pergunto sempre a quem joga "o que faria com esse dinheiro" e as respostas são sempre do domínio do "sei lá, logo se vê".
Pois o bom povo português - coitadinho... - aposta todos os anos, desde 2004, à volta de € 1.000.000.000,00 (mil milhões de euros!) para receber em prémios à volta de € 500.000.000,00 (quinhentos milhões de euros).
Ou seja, do dinheiro da malta que aposta no Euromilhões, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa arrecada por ano metade: cerca de € 500.000.000,00 (quinhentos milhões de euros). Pergunta: quem ganha com a vossa ambição, quem é?

Vejam isto no «bonequinho» da revista Visão de 30/10/2014:


Para quem tiver curiosidade, aqui está o artigo completo:

predadores


Raim on Facebook

novembro 12, 2014

«Uma esmolinha para o Santo António» - António Pimpão

Na sua prédica semanal de sábado passado, na TVI, Marcelo Rebelo de Sousa, comentando a rábula do ministro da economia dirigida a António Costa, por causa da provável introdução da taxa sobre as dormidas e entradas em Lisboa, por ar ou por mar, afirmou que a referida rábula não passou de um ato falhado, por ser mais recordada pelo insólito da tirada do ministro do que pela situação (ou pessoa) que pretendia criticar.
Não me parece que seja assim; sinto que o comentário colocou um ónus sobre António Costa e o isolou na opinião pública por ter passado a ideia de ser caso único. E não o é.
Não tenho, por enquanto, uma opinião formada, crítica ou de apoio, a respeito da intenção do presidente do município e candidato a primeiro-ministro de introduzir a aludida taxa turística.
As taxas distinguem-se dos impostos por serem a contrapartida da prestação de um serviço por uma entidade pública, só estando a ela sujeitos quem recorrer a esse serviço. Quem não quiser pagar, basta escusar o serviço. Há, pois, uma relação direta e imediata entre serviço público e pagamento pelo seu beneficiário. Pelo contrário, os impostos destinam-se a fazer face a despesas de soberania e gerais do estado cujo benefício não pode ser individualizado e que, por isso, têm que ser suportadas por todos, consoante a capacidade para pagar de cada um. Ninguém pode eximir-se-lhes.
Neste enquadramento, a taxa que António Costa pretende cobrar é sobretudo um imposto, que, segundo a constituição, só pode ser criado pelo parlamento.
Mas deixando de parte esta questão, que pode parecer bizantina, confesso que propendo a preferir que sejam as câmaras a criar e arrecadar os impostos que constituem as suas receitas; só assim o cidadão poderá estabelecer uma relação entre impostos locais pagos e realizações autárquicas, em vez de, como acontece entre nós, ser o governo a cobrar a totalidade dos impostos e, depois, repartir uma parte pelos municípios, segundo critérios definidos. Desta forma, nem imaginamos quanto dos nossos impostos são destinados à nossa câmara municipal.
Sobre o propósito de António Costa de criar a taxa turística, o que se pode dizer é que, à primeira vista, isso parece positivo, na medida em que é o município a aplicá-la e se pratica, em sentido lato, o princípio do utilizador pagador. O problema está em que não se sabe bem o que é que a taxa pretende pagar, ou melhor, paga algo inefável, que já existe e foi pago pelos contribuintes; e também contribui para o financiamento de realizações futuras anunciadas, só restando saber se se concretizarão.
Também se pode argumentar que há alguma justiça no facto de os estrangeiros que visitam Lisboa também contribuirem financeiramente para os bens de uso comum da capital que lhes são oferecidos e que nós suportámos.
Já me parece mais despropositado que o ministro da economia – e Paulo Portas - apele a António Costa para que não introduza a referida taxa, quando o governo mais não tem feito, de há dois anos para cá, que não seja criar ou reforçar taxas. Nisto, quem nunca pecou…

António Pimpão

legionella vs ebola


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novembro 11, 2014

Filipa Martins

parabéns pela medalha de ouro na Taça do Mundo
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«Dois pesos...» - António Pimpão

Poderia ter pegado em muitos e até mais expressivos exemplos, mas neste momento ocorre-me o espetáculo televisivo e dos demais meios da comunicação social quando o Ministério Público perseguiu e capturou Carlos Cruz e Paulo Pedroso, o primeiro no Algarve e o segundo às portas do Parlamento, “só” porque gostavam de crianças e estando o segundo inocente, à luz da justiça.
Ficou-se hoje [ontem] a saber ainda mais do que já se sabia, ou seja, que Ricardo Salgado, quando se encontrava a assegurar a transição para nova administração e encarregado de praticar atos de mera gestão, desviou do BES umas centenas de milhões de euros. Nem o maior prestidigitador consegue ter as suas artes, pois conseguiu fazer desaparecer todo aquele dinheiro sem deixar rasto, de acordo com o relatório dos auditores.
Os primeiros, que gostavam de se entreter com crianças, foram sujeitos ao vexame que conhecemos. Ricardo Salgado, que nos tem andado a “enrab…” a todos, continua incólume na sua mansão da Quinta da Marinha, sem ser minimamente incomodado.
É patente que o Ministério Público tem dois pesos e duas medidas.

António Pimpão

novembro 10, 2014

«Quando é o Estado a pagar...» - António Pimpão

O governo pretende privatizar os transportes públicos, sob a forma de concessão, em condições que não são ainda conhecidas.
António Costa, presidente do município de Lisboa, deseja que a exploração dos transportes públicos da capital (Carris e Metro) passem a ser explorados diretamente pelo próprio município.
O governo entende que, se o município de Lisboa se quiser habilitar à concessão dos referidos transportes públicos, o deve fazer competindo com os demais interessados.
Porém, António Costa defende que o estado deve continuar a suportar todos os encargos com a aquisição da atual frota (leasing), a pagar a sua manutenção e as infraestruturas e que continue a pagar os subsídios compensatórios relativos aos passes sociais (e presumo, cobertura dos prejuízos). Ou seja, mudam as moscas…
Tudo indica que o presidente do município de Lisboa o que quer é que seja a câmara a explorar os transportes na cidade, que possa lá empregar quem muito bem entender, normalmente protegidos ou correligionários, com preocupações centradas nos aspetos sociais, sem cuidar da eficiência; e que sejam os contribuintes nacionais – nós - a pagar a fatura. É uma forma conveniente de solidariedade.
Não consigo subscrever esta visão um tanto mítica e messiânica do estado, em que se considera que quando é o estado a pagar… ninguém paga. Ora, a verdade incontornável é que quando é o estado a pagar… todos pagamos.
Enquanto que, por um lado, como ocorre com as SCUT, se reclama a aplicação do princípio do utilizador pagador – com o qual concordo -, por outro não se deixa de puxar a brasa à sua sardinha e aliviar os munícipes locais e enviar para todos os contribuintes a fatura daquilo de que só alguns dispõem e consomem. E o que se passa com os transportes passa-se com muitos outros benefícios públicos, designadamente artes e espetáculos, em que a capital é o único local que deles dispõe… mas todos pagamos.
Esperava uma maior atenção ao interesse coletivo da parte de quem se propõe vir a governar o país.

António Pimpão

CR7 recebe...

mais uma bota que não consegue calçar
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novembro 09, 2014

As imagens que o ICS não quis publicar:

Ver AQUI

É ajuizar, senhores, a ver o que cá se lavra, como dizia a canção...

novembro 07, 2014

ali para os lados de Boliqueime...

foi encontrado um portão que se supõe ser o mesmo que desapareceu de Dachau
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(i)reflexão para o f-d-s:

Ouvindo tantos comentários televisivamente angustiados quanto ao surgimento e crescimento inusitado do novo partido, em Espanha, o PODEMOS, depara-se-me uma dúvida metódica: 

- Cá pelo burgo, com a treta dos partidos que temos, não poderia surgir um zingarelho do mesmo tipo?... 

Nem que se chamasse NÃO PODEMOS... talvez com esta denominação mais afeiçoada ao nosso tão constante estar, assim a modos como quem quer e não pode...


novembro 05, 2014

Comenta-se que os juízes...

expulsos de Timor estavam a tentar implantar a plataforma Citius... ilicitamente
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outubro 29, 2014

Grafeno, uma alternativa formidável, já!.

Abastecer um carro eléctrico em trinta segundos e um telemóvel em dois?


O  nosso mundo, melhor, a fórmula de relativa estabilidade ambiental que dá o suporte à simbiose que nos permitiu construir a civilização actual está gravemente ameaçada. Não  só a superpopulação devido à explosão demográfica versus a crescente escassez de recursos, mas principalmente a não sustentabilidade dos modelos energéticos, são a principal ameaça. Se por um lado é possível conduzir-se por iniciativas institucionais à limitação demográfica, por outro lado, tanto a produção de energia como a produção de alimentos ultrapassaram já há muito o limiar da sustentabilidade. Não é possível continuar a produzir num modelo que globalmente tira mais da equação ambiental daquilo que ela pode dar. O défice é esse que todos nós sentimos, como mero elemento que somos nesta teia de interacções complexas dum ecossistema que teimamos em ignorar.


Os horizontes não são agradáveis por mais que determinados governantes insistam em projectar cenários de amanhãs sempre melhores do que os que passaram e que todos vemos piorar de ano para ano. Um dos elementos que mais contribui para a desequilíbrio ambiental são os motores de automóvel.  Os recursos energéticos sob forma de combustíveis fósseis estão já praticamente esgotados. Mesmo em países onde ele jorrava debaixo dos pés por cada poço que se escavava num quintal. O Dubai, actualmente um centro financeiro que vive da inércia do movimento de capitais, turismo e investimentos em energia alternativa, já não tem uma pinga, e os outros Emiratos estão no limiar. Exploram-se agora os xistos betuminosos, ou seja, as côdeas que ninguém queria quando o bolo era farto.

ciclo dos motores térmicos
E se pensarmos que os motores dos carros, sendo térmicos, trabalham sob o ciclo de Carnot que apenas aproveita menos de 20% da energia, desperdiçando os restantes 80 em calor e atritos, então concluímos que poderíamos ter tido combustível para 500 anos caso o seu potencial energético fosse aproveitado a 100%, com todas as vantagens económicas e ecológicas decorrentes. Mas o mundo  dos Homens que temos é este e não outro, e o paradigma do crude a baixo preço e inesgotável sob o ponto de vista das gerações anteriores, entregou-nos como herança este modelo no limiar do colapso, com todos os perigos que a nível mundial a luta pelo acesso às fontes de energia fóssil,- a caminho do esgotamento,- representa.  A verdade é que pese embora todas os avanços em energias renováveis, no caso da mobilidade, ainda não tinha aparecido até há pouco nenhuma alternativa prática ao velho, ineficaz (energeticamente), e poluente automóvel movido a energia fóssil. 
. Alternativa eléctrica

Os motores eléctricos aproveitam a energia aplicada praticamente a 100%. 
Mas as baterias! 
As baterias foram desde sempre um quebra-cabeças. Pesadas se feitas de chumbo, caríssimas e complexas se feitas recorrendo às tecnologias de iões de lítio. Depois existe ainda o problema do carregamento. Lento demais para ser alternativa ao ainda prático posto de combustível e sujeito a um infernal condicionamento quanto aos ciclos de carga. 

Isto advém do processo electro-químico que está na base da construção das baterias que conduz a que para cada um ou dois electrões livres é preciso dispor de uma fórmula complexa de átomos que lhe dêem o suporte físico. Numa bateria descarregada, para que ela volte a ter carga, é necessário uma inversão química de todo o processo e isso tem de ser feito a uma velocidade relativamente baixa pois de contrário as baterias estão sujeitas à destruição.  A juntar a isto, uma deficiente recarga pode conduzir a uma acentuada redução na capacidade de acumulação de energia, o que vulgarmente se chama de viciação, o que leva a que só muito pouca da energia cinética seja possivel de ser recuperada e reconvertida em carga eléctrica devolvida às baterias durante as travagens de desacelerações.  Os electrões, extremamente abundantes no Universo, são assim  difíceis de guardar no caldinho químico de uma bateria.

Condensador eléctrico, duas placas isoladas
De imediato uma ideia luminosa nos ocorre: não será possível acumular apenas electrões, dispensando assim o volume e peso dos átomos que os suportam? A resposta é sim. E já há muito, desde sempre, que todos nós utilizamos dentro dos nossos equipamentos uns acessórios a que se chamam condensadores ou capacitores. Extremamente versáteis usam-se desde filtragens, isoladores de corrente contínua, elementos de entrega de sinal, memórias RAM  para computadores etc.  Não existe equipamento dos nossos dias que não use profusamente esses acessórios. Carregam e descarregam de forma rápida, sem viciações,  e praticamente sem envelhecimento.  O problema é que apenas aguentam energia por um lapso de tempo reduzido. Até agora não era possível acumular grandes quantidades de energia pelo que o uso de condensadores como armazéns de energia para efeitos de alimentação autónoma de motores ou outros equipamentos, como telemóveis, estava fora de questão.

Contudo, isso agora mudou. Uma descoberta fantástica, resultado do trabalho dos Prémio Nobel Andre Geim e Konstantin Novoselov abriu novas perspectivas há pouco tempo sequer imagináveis! O grafeno permite que se produzam o que

quanto mais superfície e mais próximas, mais capacidade
se chama de super-condensadores

Fundamentalmente, o que é um condensador?  Embora tão versátil, um condensador é apenas um dispositivos formado por duas placas. Quanto mais juntas estão, mais energia podem acumular.  Jamais se podem tocar e por isso isola-se o espaço entre as duas com uma placa isolante a que se chama dieléctrico. Quanto mais fina, mais capacidade de acumular electrões o dispositivo possui.  No limite, se tivessem encostadas uma à outra à distância de isolamento de um átomo, poderiam acumular uma super gigantesca quantidade de energia.  O grafeno permite reproduzir precisamente essa condição. Uma descoberta de ficção científica, o grafeno é extremamente leve, resistente e com qualidades extraordinárias a todos os níveis. Com super-condensadores de grafeno é possível produzir baterias para telemóveis que se carregam em dois ou três segundos, para carros que se carregam de seis a trinta segundos, etc.  E isto em qualquer patamar de descarga. Tanto faz que esteja quase carregada, a meia carga, ou completamente descarregada.  Não tem nem ciclos de carga nem viciações.

Estrutura microscópica de uma folha de Grafeno
Mas  o mais aliciante e fantástico é que depois da descoberta inicial, uma pequena alteração no processo de produção do grafeno levou a que se possa eficazmente produzir nas nossas casas!  Tão simples de construir e eficazes, mesmo com o recurso a processos quase artesanais, que melhor do que palavras, as imagens.  
Uma enorme vantagem do grafeno é ser -além de muito leve-, incomparavelmente mais barato e no fim do ciclo, totalmente reciclável e de impacto ambiental praticamente neutro.
As indústrias do automóvel tem vindo a dar passos largos ao investir na sua optimização e estão neste momento ao ponto de anunciar  a aplicação desta tecnologia aos seus produtos  auto movidos a electricidade, embora se deva dizer com toda a propriedade que as aplicações deste material só agora despertaram e sim. Um outro mundo é possível. Não sem problemas, mas certamente sem este:  os impactos ambientais no que ao pormenor da produção de energia motora dizem respeito. Outras aplicações extraordinárias podem ser desde já apontadas; roupas e edifícios inteligentes e auto-sustentados. O grafeno é ainda incrivelmente resistente e leve o que está a entusiasmar todos os sectores ligados à inovação mas também outros com larga experiência e tradicionais tais como a engenharia, construção civil e aeronáutica.
A Humanidade encontrou sempre um caminho em momentos em que tudo indicava o seu colapso. Esperemos que esta descoberta contamine no bom sentido todo um paradigma económico que pertence há muito ao passado. Para bem do Planeta e principalmente de todos nós.

outubro 25, 2014

Rui Machete

em nova polémica sobre as jihadistas portuguesas
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A liberdade e a felicidade, alguém já achou? Dizem que no Butao as pessoas são felizes...à força. E nós?

Sobre a noção de clausura e felicidade, somos na nossa grande maioria, criaturas complexas. Tirando os casos de alterações graves de personalidade presentes nos exibicionistas, procuramos o retiro e a clausura voluntária para que nos sintamos em plena liberdade nos nossos relacionamentos íntimos.



Butão
 
Num comentário da minha/nossa querida amiga relativo a um post anterior falou-se de liberdade e felicidade. A liberdade é de facto um conceito bastante vago, talvez ainda mais vago do que a da felicidade. Poderá um monge que livremente escolhe a clausura, ser indicado como um ser livre? E já que a sua clausura provém da livre escolha, poderá esse homem preso ser também feliz? Se-lo á na medida em que a sua escolha livre é aquela em que a sua noção de procura de felicidade está ligada ao que o ambiente de recolhimento proporciona, mas pode não ser nada feliz na sua procura e contudo não querer sair. Podemos dizer que a sua prisão é quase virtual, pois basta em princípio um acto de vontade para que dela saia. Tal como uns pintassilgos que fizeram ninho de uma gaiola desactivada cuja porta estava aberta, portanto não-presos numa prisão para pássaros. Sabemos no entanto, durante a História, que muitos homens e mulheres foram monges à força. As questões de herança e partilhas, a sucessão dos ceptros do poder levaram no Velho Mundo a uma prática que deixou para trás uma grande quantidade de mosteiros. Seriam felizes? Enterrados vivos sem a tal vocação nem outra culpa que não fosse serem irmãos e irmãs mais novas de famílias que queriam as suas terras indivisas. Poderiam eles tornar-se felizes mais tarde, à medida que a chama se fosse extinguindo, ou seja que se fossem amansando e baixando os braços, adaptando-se às circunstâncias, abrindo dentro da clausura portas para outras realidades? Tudo indica que sim na grande maioria dos casos.
O chamado síndroma de Estocolmo refere-se exactamente à moldagem na relação de forças entre raptores e raptados. Numa situação prolongada no tempo, assiste-se a uma rotação de valores, acabando por estabelecer-se uma relação solidária no que começou por ser uma dependência forçada.

  Sobre a noção de clausura e felicidade, somos na nossa grande maioria, criaturas complexas. Tirando os casos de alterações graves de personalidade presentes nos exibicionistas, procuramos o retiro e a clausura voluntária para que nos sintamos em plena liberdade nos nossos relacionamentos íntimos. Somos, nas nossas sociedades, felizes nos pequenos momentos de felicidade que intervalam nas brechas dos muros que à nossa volta vamos deixando construir, mas somos também nós a construir outros muros que nos libertam... Contudo, nos sistemas políticos actuais sentimos estar presos, cada vez mais presos. E paradoxalmente, estas prisões são feitas - dizem os carcereiros- para que sejamos cada vez mais felizes. Ou seja, elevam cada vez mais a altura dos muros que nos separam do acesso aos meios para que possamos cada um por nós sentirmo-nos mais felizes intramuros. Um perfeito paradoxo. Já não existe na Europa, salvo uma minoria marginal de meia duzia de centenas de pessoas, ninguém que viva do que a terra dá sem o uso do dinheiro. Não é possível passar no crivo dum fisco universal que tudo tributa. Quem vive das galinhas e das couves, não tem a liberdade de dizer que não vai pagar o imposto sobre a propriedade, ou no equivalente em dinheiro sobre os bens que produz. Ainda está fresco o episódio do fisco Português no seu massacre persecutório aos velhotes e as suas meia dúzia de sacas de batata tiradas do quintal à base de enxada e dores nas costas. Ou seja, não somos livres se não possuirmos dinheiro, não só para alguma despesa lateral, mas para alimentar um fisco que o faz para que sejamos "mais felizes"... Perante isto, qual será a medida de felicidade dos habitantes do Butão? São obrigados ser livres e felizes, à força? O Butão tem duas religiões dominantes, o Budismo e o Hinduismo e a Constituição proibe expressamente o prosiletismo. Ninguém pode obrigar nem ser obrigado a seguir determinada corrente religiosa. Por outro lado, a população é muito reduzida se comparada com as mega urbes das nossas sociedades: as duas maiores cidades, têm apenas sessenta mil habitantes num universo de um quarto milhão de pessoas. As aldeias agrícolas são autosuficientes e o comércio reduzido, não há o conceito de uma economia esquizofrénica baseada na lógica do aumento constante, tendencialmente infinito, da produção e troca de bens. Proibiram o tabaco: uma decisão acertada. Ou seja, em termos absolutos, uma privação de liberdade. Mas o tabaco conduz ao consumo compulsivo (contra-senso do conceito de liberdade), mata que se farta, o que faz com que parte da liberdade-dinheiro que todos possuem vá direitinho para as despesas com os tratamentos das doenças. Podemos argumentar com a privação da liberdade de escolha, mas aí também o argumento funciona no que toca ao haxixe, cocaína, etc. Predujiciais individual e colectivamente pelo impacte que têm a todos os níveis.

Pinochet, golpe de Estado em 1973 e o derrube do governo eleito de Allende
Mas até no chamado Ocidente, o que era inicialmente um ritual marginal que passou para o consumo compulsivo e marca da liberdade de escolha há alterações: as pessoas podem comprar tabaco, não podem cultivar porque isso não dá impostos, mas não podem fumar em qualquer local fechado, e em muitos sítios em lado algum. Como somos livres, temos a liberdade de optar entre alternativas, excepto nas que colectivamente nos são vedadas de forma imposta. Como dizem os Budistas, quem quer estar em todos os lados ao mesmo tempo, não está em lado algum. Poderá então um Estado impôr um padrão de conduta? Balizar a liberdade? Dizer entre as infinitas hipóteses de escolha, quais as que podem ser seguidas? Os ditadores pensam que sim. Mas os sistemas abertos com destaque para os EUA, arautos da liberdade, apoiaram e financiaram dezenas de ditaduras ferozes, ao mesmo tempo que diziam às suas populações que eram aliados, "moderados" que combatiam a falta de liberdade dos países comunistas. De uma forma diferente mas com os mesmíssmos resultados, os sistemas políticos balizam a liberdade, uns apenas pela força outros pela força do condicionamento da informação, não dispensando fora de portas e mesmo dentro de portas,- desde que ninguém veja nem saiba-, a força bruta: desaparecimentos, assassinatos selectivos etc. Estamos todos rodeados de muros, não se vêem, mas sentem-se e embora de longe em longe, ou de perto em perto a onda se agigante e derrube os muros por mais altos que sejam.
Contudo, apesar das cíclicas crises sociais e politicas, somos na maior parte do tempo os reféns que simpatizam com os carrascos. Acomodados e continuando a vida com horizontes mais estreitos, de mãos atadas, e de venda sobre os olhos, contentes se houver algum alívio na mão que oferece as carícias do chicote diário. E é este o mundo livre que não trocamos por nenhum outro. Ou seja, liberdade, liberdade, não sei bem o que é, mas tenho uma suspeita, e chego a sentir-me feliz todas a vezes que penso nela...