Comentário do OrCa à minha 10ª carta de trás da serra:
"Bem... da terra, da santa terrinha, já não vêm só abóboras. Agora chovem merecidas catilinárias. Ainda bem! Deve ter algo a ver com aquela história de fazer o combate de dentro para fora...
Como sabes, estou contigo a 100% e, se for preciso mais um bocadinho, é só dizer, que rapidamente chegaremos aos 110%!
Chateia e irrita esta moleza institucional, este «no pasa nada», quando tu, como eu, como tantos outros, assistimos, conscientes, ao despautério que ocorre na «res publica», acumulado com tanta delapidação dos chorudos impostos que pagamos.
Quanto aos professores... Enfim, dos lápis que dão aos alunos, ao trabalho noite adentro, diário e continuado, ao desgaste diário, também, de aturar as criancinhas que tantos pais não sabem, não querem ou não podem educar, como se diz, só não vê quem não quer ver!
E a atitude destes pseudo-tecnocratas que vão desaguando no ministério, a arremedar ao neo-liberal, entoando loas a um status mirífico e a um estatuto educacional para o País que eles próprios nunca praticaram, nem advogaram, a não ser quando se alcandoraram ao poder, fede que tresanda!
Estou com o Junqueiro: «Truculenta manada obesa de hipopótamos, ó Humanidade, enxota-mos!»
Um abraço.
OrCa"
abril 15, 2008
abril 06, 2008
Recensão do meu livro «Persuacção»
Rolando Almeida fala sobre o meu livro no seu blog A Filosofia no Ensino Secundário:
"Filosofia aplicada à Gestão
Recentemente descobri um interessante livro que deveria constituir a regra, mas que, curiosamente, é uma excepção. Já aqui referi sobre a importância do pensamento crítico e da sua transversalidade no conjunto dos saberes (ver aqui, aqui, aqui e aqui). O pensamento crítico é transversal pois é ele quem fornece as ferramentas para o raciocínio consequente. No nosso país, o pensamento crítico aparece já nos currículos de alguns cursos superiores, como os de engenharia, mas é ensinado pelos professores de matemática, o que é manifestamente errado.
Para alguém com formação em filosofia é algo chocante saber que os filósofos andam no desemprego, ao passo que o mercado que lhes é próprio é absorvido por outras formações. Uma pessoa com formação em matemática ensinar pensamento crítico é tão aberrante como alguém com formação em filosofia ensinar geografia ou biologia. O pensamento crítico consiste basicamente no conhecimento das regras da lógica informal que são aplicadas ao raciocínio em geral. Paulo Proença de Moura, o autor deste Persuacção, O que não se aprende nos cursos de gestão (Edições Sílabo, 2005) apercebeu-se das potencialidades do pensamento crítico e da filosofia para o ramo da gestão. A tomada de decisões do gestor é mais segura se o mesmo possuir uma formação sólida no raciocínio e, acima de tudo, souber pensar com consequência. O autor ficou admirado quando percebeu que o pensamento crítico praticamente não se ensina nos cursos de gestão em Portugal e resolveu publicar este livro que é também o resultado da sua tese de mestrado. Todo o capítulo 2 , que leva o título, «A filosofia e argumentação na gestão» é um pequeno tratado de filosofia e de lógica formal e informal. O livro é útil, sobretudo, para nos revelar as potencialidades da filosofia e a sua aplicabilidade prática numa área tão pouco dada a especulações como a da gestão. No início deste texto mencionei que este género de livros deveria constituir a regra, isto se a filosofia que se tem praticado em Portugal acordar para a realidade e deixar de ser uma formação só ao alcance dos ricos e do carreirismo. Na verdade, estas obras abundam no mercado anglo saxão e com resultados evidentes, enquanto nós por cá vamos alimentando a ideia que a filosofia é só investigação pura e dura completamente avessa à divulgação pública. É pena! Dei-me conta deste livro tardiamente (a edição é de 2005), mas não podia deixar passar em branco esta assinalável coragem do autor."
"Filosofia aplicada à Gestão
Recentemente descobri um interessante livro que deveria constituir a regra, mas que, curiosamente, é uma excepção. Já aqui referi sobre a importância do pensamento crítico e da sua transversalidade no conjunto dos saberes (ver aqui, aqui, aqui e aqui). O pensamento crítico é transversal pois é ele quem fornece as ferramentas para o raciocínio consequente. No nosso país, o pensamento crítico aparece já nos currículos de alguns cursos superiores, como os de engenharia, mas é ensinado pelos professores de matemática, o que é manifestamente errado.
Rolando Almeida
Para alguém com formação em filosofia é algo chocante saber que os filósofos andam no desemprego, ao passo que o mercado que lhes é próprio é absorvido por outras formações. Uma pessoa com formação em matemática ensinar pensamento crítico é tão aberrante como alguém com formação em filosofia ensinar geografia ou biologia. O pensamento crítico consiste basicamente no conhecimento das regras da lógica informal que são aplicadas ao raciocínio em geral. Paulo Proença de Moura, o autor deste Persuacção, O que não se aprende nos cursos de gestão (Edições Sílabo, 2005) apercebeu-se das potencialidades do pensamento crítico e da filosofia para o ramo da gestão. A tomada de decisões do gestor é mais segura se o mesmo possuir uma formação sólida no raciocínio e, acima de tudo, souber pensar com consequência. O autor ficou admirado quando percebeu que o pensamento crítico praticamente não se ensina nos cursos de gestão em Portugal e resolveu publicar este livro que é também o resultado da sua tese de mestrado. Todo o capítulo 2 , que leva o título, «A filosofia e argumentação na gestão» é um pequeno tratado de filosofia e de lógica formal e informal. O livro é útil, sobretudo, para nos revelar as potencialidades da filosofia e a sua aplicabilidade prática numa área tão pouco dada a especulações como a da gestão. No início deste texto mencionei que este género de livros deveria constituir a regra, isto se a filosofia que se tem praticado em Portugal acordar para a realidade e deixar de ser uma formação só ao alcance dos ricos e do carreirismo. Na verdade, estas obras abundam no mercado anglo saxão e com resultados evidentes, enquanto nós por cá vamos alimentando a ideia que a filosofia é só investigação pura e dura completamente avessa à divulgação pública. É pena! Dei-me conta deste livro tardiamente (a edição é de 2005), mas não podia deixar passar em branco esta assinalável coragem do autor."
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A minha décima carta de trás da serra na revista Perspectiva
má Educação
Não sei onde te meteste nesse dia, que não te vi, mas terias feito bem em ir conversar com as cem mil pessoas que foram desfilar pelas ruas à capital. Decerto concluirias que, ao contrário do que diz a ministra da Educação, os professores sabem do que estão a falar quando dizem que estão cansados e fartos.
Já me ouviste dizer isto centenas de vezes desde a nossa infância, mas sabes que gosto sempre de repetir: a minha política é a política do trabalho. Foi uma frase que foi gravada na minha memória pelos meus pais e pela minha avozinha – ai de mim se a chamasse sem este diminutivo gramatical – muito antes do 25 de Abril de 1974. Lembro-me de o meu pai um dia, ao regressar do café, dizer-me pedindo segredo aquilo que um amigo lhe contou: a sigla “VMPS” (da água mineral de “Vidago Melgaço e Pedras Salgadas”) queria afinal dizer “Vamos Mandar Prender Salazar”.
Lembras-te de te contar quando eu estudava no liceu da Covilhã, logo a seguir à revolução dos cravos, aquele episódio da aula de ginástica em que o professor faltou? Como estávamos equipados, fomos jogar futebol. Havia um colega que queria ir para a baliza. Mas para a outra era sempre um impasse, porque ninguém aceitava ficar ali quieto a levar com boladas enquanto os outros podiam marcar canelas. Um colega mais matulão sugeriu: “Fazemos uma votação para quem deve ir para a baliza”. Ainda mal tinha acabado a frase e disparou logo uma pergunta, colocando o braço no ar: “Quem vota no Paulo Moura para ir para a baliza?” o que levou à unanimidade nos braços levantados… mas no meu caso foi um manguito, uma declaração de voto – “Porra para a vossa democracia” – e uma corrida para os balneários mudar de roupa. Só ao longo da vida assimilei as várias lições deste dia: uma delas foi que a democracia pode ser perigosa, quando desrespeita as minorias, ao quebrar aquela velha máxima de “a nossa liberdade acaba quando começa a liberdade dos outros”; outra foi que ser franzino não ajuda nada a fazer valer a nossa posição; e a principal foi que eu e o futebol não combinamos.
Eu sei, eu sei, é como se estivesse daqui, na Cova da Beira, a ouvir as tuas gargalhadas. Aposto que te estás a recordar dos meus tempos da escola primária em que, mesmo nos dias em que levava eu a bola, não me escolhiam para nenhuma equipa. E pior ainda era quando havia um número ímpar de jogadores e eu ficava para o fim. Até que os dois que escolhiam as equipas chegavam a acordo: “Tu tens a equipa mais forte, ficas também com o Paulo Moura”.
A minha alcunha dos tempos de juventude reflectiu tudo isto: Cruijff.
Na primeira vez que fomos jogar para o pinhal da cerca do conde, o Zé Papas começou por gritar aos colegas de equipa “não deixem o Cruijff desmarcar-se” mas, ao fim de poucos minutos, já gritava “passem a bola ao Cruijff que ele remata para fora”.
Não falando de política nem de futebol, resta-me falar de trabalho. E deixa-me que insista: a malta que manda ainda não se convenceu que os professores do ensino público não têm meios para trabalhar como lhes é exigido. E muito menos ainda para o que desejariam fazer!
Se eu pudesse, falaria com cada professor e dizia-lhe para exigir, na sua escola, os meios para poder exercer a sua actividade. E quando falo em meios é no sentido mais lato possível: ambiente social e respeito pela profissão; enquadramento e protecção legal; formação; equipamentos funcionais (informáticos, multimédia, internet,…); consumíveis; gabinete de trabalho para actualização de conhecimentos, preparação de aulas e de testes, bem como para a sua correcção; apoio administrativo; e, o recurso mais escasso de todos: tempo. Exijam que se cumpra o Estatuto da Carreira Docente: “O direito ao apoio técnico, material e documental exerce-se sobre os recursos necessários à formação e informação do pessoal docente, bem como ao exercício da actividade educativa”. E nos regulamentos da avaliação: “O docente tem direito a que lhe sejam garantidos os meios e condições necessários ao seu desempenho, em harmonia com os objectivos que tenha acordado”.
Ou terão que ser os cônjuges dos professores a cobrar do Estado tudo o que este devia providenciar? Algum professor já apresentou factura dos riscos que lhe são feitos no carro? Do tempo que trabalha em casa fora do horário laboral? Dos tinteiros, resmas de papel e outros materiais que paga do seu bolso?
Sabes que mais? Se as coisas se mantiverem como estão, a culpa é dos professores, ao permitirem, com o seu voluntarismo, que o Ministério da Educação continue a fazer omeletas sem ovos, usando o truque de pôr a cabeça de cada professor.... num ovo!
Cem mil abraços,
Paulo Proença de Moura
Página on-line da revista «Perspectiva». Na secção das Crónicas estão disponíveis os meus textos anteriores.
Não sei onde te meteste nesse dia, que não te vi, mas terias feito bem em ir conversar com as cem mil pessoas que foram desfilar pelas ruas à capital. Decerto concluirias que, ao contrário do que diz a ministra da Educação, os professores sabem do que estão a falar quando dizem que estão cansados e fartos.
Já me ouviste dizer isto centenas de vezes desde a nossa infância, mas sabes que gosto sempre de repetir: a minha política é a política do trabalho. Foi uma frase que foi gravada na minha memória pelos meus pais e pela minha avozinha – ai de mim se a chamasse sem este diminutivo gramatical – muito antes do 25 de Abril de 1974. Lembro-me de o meu pai um dia, ao regressar do café, dizer-me pedindo segredo aquilo que um amigo lhe contou: a sigla “VMPS” (da água mineral de “Vidago Melgaço e Pedras Salgadas”) queria afinal dizer “Vamos Mandar Prender Salazar”.
Lembras-te de te contar quando eu estudava no liceu da Covilhã, logo a seguir à revolução dos cravos, aquele episódio da aula de ginástica em que o professor faltou? Como estávamos equipados, fomos jogar futebol. Havia um colega que queria ir para a baliza. Mas para a outra era sempre um impasse, porque ninguém aceitava ficar ali quieto a levar com boladas enquanto os outros podiam marcar canelas. Um colega mais matulão sugeriu: “Fazemos uma votação para quem deve ir para a baliza”. Ainda mal tinha acabado a frase e disparou logo uma pergunta, colocando o braço no ar: “Quem vota no Paulo Moura para ir para a baliza?” o que levou à unanimidade nos braços levantados… mas no meu caso foi um manguito, uma declaração de voto – “Porra para a vossa democracia” – e uma corrida para os balneários mudar de roupa. Só ao longo da vida assimilei as várias lições deste dia: uma delas foi que a democracia pode ser perigosa, quando desrespeita as minorias, ao quebrar aquela velha máxima de “a nossa liberdade acaba quando começa a liberdade dos outros”; outra foi que ser franzino não ajuda nada a fazer valer a nossa posição; e a principal foi que eu e o futebol não combinamos.
Eu sei, eu sei, é como se estivesse daqui, na Cova da Beira, a ouvir as tuas gargalhadas. Aposto que te estás a recordar dos meus tempos da escola primária em que, mesmo nos dias em que levava eu a bola, não me escolhiam para nenhuma equipa. E pior ainda era quando havia um número ímpar de jogadores e eu ficava para o fim. Até que os dois que escolhiam as equipas chegavam a acordo: “Tu tens a equipa mais forte, ficas também com o Paulo Moura”.
A minha alcunha dos tempos de juventude reflectiu tudo isto: Cruijff.
Na primeira vez que fomos jogar para o pinhal da cerca do conde, o Zé Papas começou por gritar aos colegas de equipa “não deixem o Cruijff desmarcar-se” mas, ao fim de poucos minutos, já gritava “passem a bola ao Cruijff que ele remata para fora”.
Não falando de política nem de futebol, resta-me falar de trabalho. E deixa-me que insista: a malta que manda ainda não se convenceu que os professores do ensino público não têm meios para trabalhar como lhes é exigido. E muito menos ainda para o que desejariam fazer!
Se eu pudesse, falaria com cada professor e dizia-lhe para exigir, na sua escola, os meios para poder exercer a sua actividade. E quando falo em meios é no sentido mais lato possível: ambiente social e respeito pela profissão; enquadramento e protecção legal; formação; equipamentos funcionais (informáticos, multimédia, internet,…); consumíveis; gabinete de trabalho para actualização de conhecimentos, preparação de aulas e de testes, bem como para a sua correcção; apoio administrativo; e, o recurso mais escasso de todos: tempo. Exijam que se cumpra o Estatuto da Carreira Docente: “O direito ao apoio técnico, material e documental exerce-se sobre os recursos necessários à formação e informação do pessoal docente, bem como ao exercício da actividade educativa”. E nos regulamentos da avaliação: “O docente tem direito a que lhe sejam garantidos os meios e condições necessários ao seu desempenho, em harmonia com os objectivos que tenha acordado”.
Ou terão que ser os cônjuges dos professores a cobrar do Estado tudo o que este devia providenciar? Algum professor já apresentou factura dos riscos que lhe são feitos no carro? Do tempo que trabalha em casa fora do horário laboral? Dos tinteiros, resmas de papel e outros materiais que paga do seu bolso?
Sabes que mais? Se as coisas se mantiverem como estão, a culpa é dos professores, ao permitirem, com o seu voluntarismo, que o Ministério da Educação continue a fazer omeletas sem ovos, usando o truque de pôr a cabeça de cada professor.... num ovo!
Cem mil abraços,
Paulo Proença de Moura
Página on-line da revista «Perspectiva». Na secção das Crónicas estão disponíveis os meus textos anteriores.
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