janeiro 12, 2017

e, agora, para falar de outra coisa...
já olhou, com olhos de ver, para a sua factura de electricidade?

Há, nesta espuma dos dias, como alguns lhe chamam, algumas coisas mais sólidas e substanciais nas quais não nos convém tropeçar sem que, pelo menos, arrisquemos sérios danos na canela dos pensamentos.
 
Ora, vem ao caso, a circunstância de me ter debruçado sobre o sacrossanto tarifário da electricidade que uso lá por casa e, após cuidado apuramento de factos, apurar que, afinal, a desgraçada violência doméstica é assumida por improváveis agentes, porventura com os mesmos perniciosos efeitos civilizacionais.   
 
Sabemos de uma praga que assola todos quantos tenham celebrado um contrato de fornecimento de electricidade, de há longos anos, e que se chamava «aluguer de contador» que consiste, por sua vez, numa espórtula prestada à entidade fornecedora tão só por nos dar a benesse de existir e apesar de cobrar, em paralelo, o consumo que, efectivamente, tivermos, em termos de Kwh consumidos.
 
Quando o avanço civilizacional decidiu considerar que aquele «aluguer» era um abuso e, concomitantemente, um insulto à inteligência e à dignidade do bom povo e, como tal, teria de ser erradicado, logo a inteligência do costume transmutou a coisa em «taxa de potência» - tudo sempre sob a alçada do forte braço da lei -, na perspectiva ancestral de que mudam as moscas mas não muda a matéria que as atrai. E assim se ficou a pagar o mesmo, o que, no fundo e bem vistas as coisas, era o que interessava.
 
Entretanto, o nível de sofisticação foi-se apurando graças aos sacrossantos avanços tecnológicos, também conhecidos por progresso, e essa «taxa de potência» passou a estar sustentada no argumento de que, enquanto o caduco e troglodita «aluguer de contador» pouca ou nenhuma variação tinha de cliente para cliente, esta «nova» taxa incidia agora sobre a «potência contratada». Leia-se, a capacidade, disponibilizada pela empresa fornecedora, de o cliente poder ligar, em simultâneo, cada vez mais electrodomésticos.
 
Ora, numa lógica sem lógica nenhuma - pois o consumo é suposto pagar-se pelos Kwh gastos e quantos mais electrodomésticos ligados, mais se consumindo, logo, mais se paga... - o pagador, se queria usufruir da possibilidade de  ligar um aquecimento ao mesmo tempo que passava a roupa a ferro e aproveitava o tempo (cada vez mais escasso) para lavar a roupa suja da semana, lá via aumentar a tal «taxa de potência» na sua inestimável facturinha, ao solicitar «instalação» aumentada de potência contratada.
 
Dito de outra maneira: o cliente paga mais para poder gastar mais... Percebe-se? Duvida-se.
 
Esse aumento, sem entrar noutros devaneios despiciendos, traduzia-se tão-só pela calibragem de um aparelhómetro, instalado a seguir ao contador de electricidade e que se chama disjuntor diferencial. Por acréscimo, além de calibrar a potência disponível, até tinha a simpatia de proteger a instalação em casos de curto-circuitos, o que até era, vamos lá e como disse, simpático e - lá está! -, civilizado.  Uma vez mais, o forte braço da lei dava cobertura ao enredo.
 
Um dia, em pleno cavaquismo, o País amanheceu com a privatização da empresa fornecedora deste bem. E, ao privatizá-la, algum jurista atento apurou que uma empresa privada não deve cobrar taxas... Enfim, que diabo, não estamos no México, não é? Logo a solução foi fácil e brilhante: mudou-se-lhe, de novo, o nome e passou a denominar-se então «encargo de potência», mantendo-se todos os demais pressupostos.
 
Aqui convém parar e referir que este «aluguer-taxa-encargo» sofre regulares aumentos anuais, como é de bom tom numa sociedade que caminha para o futuro...
 
Mas o irrequieto legislador não dorme sobre os louros conquistados e no seu afã de se actualizar em novas realidades e novos desafios, cada vez mais engrossado institucionalmente, até com entidade «reguladora» a preceito, que lhe vai conferindo uma armadura de aço - o «mercado regulado» - contra débeis tentativas de sobrevivência do cliente, a esbracejar aflito num consabido mar de taxas e taxinhas.
 
Encurtando razões, que o palavrório vai longo, eis o actual estado da arte - uma outra vez, com todo o suporte legal:
 
- O «encargo de potência» mantém-se;
 
- Os «contadores inteligentes» em fase de instalação, permitem a definição da tal «potência contratada», ficando os encargos de instalação do sistema de protecção à responsabilidade integral do utente/cliente... Será por isso que regressaram em força os incêndios motivados por curto-circuito...?  
 
- Para cúmulo, uma vez mais civilizacional, actualmente o preço do próprio Kwh também varia em função da «potência contratada», ou seja, o cliente paga mais para poder gastar mais (potência contratada) e paga mais cara cada unidade consumida por já pagar mais para poder gastar mais (diferencial de preço em função da potência). Confusos? Pois têm mais...

-Na factura emitida avisa-se o bom povo de algo quase iniciático: «O preço da electricidade inclui o valor X (sem IVA) correspondente às tarifas de acesso às redes, que contêm o valor dos Custos de Interesse Económico Geral (CIEG) no valor de Y. Estes valores são independentes do comercializador» - fim de citação e de paciência. E, então, perceberam?
 
Há, neste contexto, uma questão filosófica que me avassala: o que é tudo isto...?!?... Enfim, o que nos vale é que vivemos num estado de direito... Olha se não fosse!
 
 

7 comentários:

  1. Nem sei que asneiras utilizar!...

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  2. Um Estado torto que não consegue pôr mão nos abusos inqualificáveis da EDP chinesa.
    Custos enormes e um serviço PÉSSIMO.
    Ainda há dias queriam que eu estivesse à espera deles durante toda uma manhã para que eles colocassem um selo num contador que está... no exterior.
    Disse logo que não iria estar!
    Recebi contudo um SMS passado dias " a brigada técnica acabou de sair, não abandone o local combinado". Fui ao exterior, deixei a porta do contador destrancada para que pudessem colocar o selo e armadilhei a portãozinho do quintal com um pequeno ramo de arbusto, para ver se alguém tinha lá estado. À noite, quando cheguei, ainda o raminho lá estava. Ou seja, os tipos da brigada técnica devem ter-se perdido ou então são como os Reis Magos e só devem chegar lá para dia 6 do Ano que vem!
    Agora só deixo uma questão: quantas pessoas podem dispor do seu tempo ao bel-prazer de terceiros para " não abanar" o local combinado, e isto durante dias? Sou um micro empresário e posso dispor do meu tempo com alguma flexibilidade, mas suponhamos que era empregado e tinha que pedir inutilmente a manhã ou a tarde ou o dia inteiro ao meu patrão? Que direito tem esta empresa de desrespeitar assim as pessoas?
    Sabem que ainda por cima se arrogam ao direito de onerar a factura da energia com mais 20 €uro caso não esteja presente"conforme combinado"?
    Palpita-me que daqui algum tempo receba uma chamada da minha vizinha já jubilada, a dizer que uns homens com um ar muito aborrecido entraram no meu quintal da frente e encontraram a caixa do contador fechada. Acho que é horas de voltar ao meu amigo apicultor a quem dei um enxame que há tempos se instalou na dita caixa, a perguntar se não se importa de voltar a pôr lá as minhas abelhas. Só por causa cá de umas coisas.....

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    1. E não dá para mudar de fornecedor? Dá...

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    2. Dá, mas acontece que é tudo uma farsa. As concorrentes têm de jogar na casa do "player" principal que é quem PRODUZ a energia. Assim, têm de fazer a pirueta de comprar o produto a concorrer com o vendedor. Algo complicado e só possível se reduzirem custos. E para reduzir custos a primeira vítima é logo o assim chamado "recurso humano". Como trabalho na área, tenho sabido de coisas inacreditáveis. Não no fornecimento, porque esse na prática não muda. Ninguém vai mudar fios na rua, ninguém coloca no bairro um gerador etc. A questão é na assistência que é muito má na EDP mas é muitas vezes pior nas outras.

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    3. Só não posso acrescentar mais razões às razões do Charlie por razões óbvias. Mas que ele está cheio de razão, lá isso é facto.

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    4. ... e fala quem sabe... por dentro...

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