março 30, 2006

Agente de mudança num organismo público: D. Quixote?...

"Iniciei hoje a leitura do livro [«Persuacção - o que não se aprende nos cursos de gestão»]. Já concluí o primeiro capítulo («Mudança Organizacional»). Dado que está neste momento fresco, vou partilhar alguns pensamentos que me passam pela cabeça.
Tenho achado muito interessante, principalmente por ver retratado um mundo que, à primeira vista, não vejo reflectido no meu local de trabalho. Isto não pela incorrecção do livro (quem sou eu para o afirmar!), mas sim pelas características particulares de um organismo público, que tem sido o meu emprego há vários anos. Por outro lado, a minha posição particular (sem competências de chefia) distorce a visão que tenho do sistema ou, pelo menos, não me permite vislumbrar alguns dos conceitos que li.
A segmentação da organização é por demais evidente, dando origem às referidas capelinhas. Os objectivos locais ultrapassam assim os da organização, que permanecem num manto de mistério para funcionários do meu nível. Como tal, a única abordagem que poderia fazer era a de considerar o meu departamento como «O» sistema. Outro aspecto evidente é a abundância da imposição como forma de chefia, talvez por ser intencional esse esconder do caminho a seguir.
A inércia dos funcionários é notória e, do meu ponto de vista, perfeitamente compreensível. Repare-se:
1. Não temos uma noção clara dos objectivos da organização. Será porventura pura e simplesmente político, ou seja, abstracto e oscilante, conforme o governo;
2. Não há incentivos nem esforços de motivação dos funcionários. Parte-se do princípio que estão todos nas designadas gaiolas douradas e, como tal, acomodados. Ou seja, incentiva-se a inércia;
3. Raramente se observam orientações superiores (administração) que transpareçam mais do que a necessidade de resolver questões pontuais e muitas vezes mesquinhas.

Tudo isto transmite a ideia de que o que se espera do funcionário é, apenas, o manter a máquina em funcionamento. Como tal, a simples ideia de mudança ou agente de mudança é algo estranha para quem vive neste mundo. Porquê fazê-lo? O que se ganha com isso? Seria apenas um movimento quixotesco?
Peço desculpa pelo evidente desordenado das ideias, mas são reflexões em cima da leitura e muito perto do sono... :D
Decerto direi (ou postarei) mais qualquer coisa à medida que for digerindo o livro e os conceitos. (...) Para já, estou a achar muito interessante, já que me abre os olhos para o que não vejo à minha volta, passe o paradoxo... :)
Abraço

Mário Nogueira"

Mário,
Entendo perfeitamente essa sensação. Mas posso garantir que a sensação de lutarmos contra moinhos de vento não é exclusiva dos D. Quixotes dos organismos públicos.
E aproveito para dar o exemplo de um conterrâneo meu (cariense, portanto), João Amaral Tomás, actual secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e a quem muitos chamam «o pai do IVA» (quem se recorda dos esclarecimentos que passavam na televisão, todos os dias, antes da implementação deste imposto em Portugal?). É um quadro da administração fiscal. No início dos anos 90 esteve no gabinete do então secretário de Estado dos Assuntos Fiscais Oliveira e Costa. Desde 1993 até 2002, foi conselheiro para os assuntos financeiros da representação do Governo português em Bruxelas (Reper). Em Outubro de 2001, foi renovada a requisição à DGCI para, em comissão de serviço de três anos, exercer o cargo de conselheiro económico da Embaixada de Portugal em Londres. Mas mês e meio depois, Rudolfo Lavrador, o secretário de Estado do Tesouro e das Finanças de Oliveira Martins, nomeou-o para as funções de assessoria técnica, com efeitos desde Setembro de 2001, ou seja, antes da nomeação para Londres. Em Março de 2002, o ministro Oliveira Martins louvou-o em despacho, pela sua "inteligência e lealdade". Em 2003, já no mandato do Governo Durão Barroso, Amaral Tomás passou a adjunto do secretário de Estado dos Assuntos Europeus, Carlos Costa Neves, em cujas funções se manteve até Novembro de 2004, ou seja, já no mandato de Santana Lopes [fonte: Público].
Para mim, com o trabalho que está a ajudar a desenvolver e implementar na área fiscal, começando a dar credibilidade e a impor aos contribuintes (indivíduos e empresas) algum respeito pela máquina fiscal, o João Amaral Tomás é um exemplo a seguir de agente de mudança na «organização pública». Com o detalhe de ser de Caria (o que não é de somenos importância, para quem se queixa da interioridade).

março 28, 2006

A mudança de hora - alguns contributos


Enquanto estou a preparar uma página específica para este tema da hora de Verão / hora de Inverno (DST - «Daylight Saving Time»), agradeço a todas as pessoas que têm dado as suas opiniões, quer por e-mail, quer nos comentários a gentis referências a este assunto no BLOGotinha e na Praça da República em Beja.

Ficam aqui alguns desses comentários:

Um link para a Wikipedia"A minha contribuição: http://en.wikipedia.org/wiki/Daylight_savings
MN"

Teoria da conspiração?..."É um assunto que acompanho há muitos anos... e que não tem nenhuma base científica (se se recordar, o sr. Cavaco, nos seus tempos de primeiro-ministro, decretou que o fuso horário de Portugal era o da Alemanha, para que as trocas comerciais fossem incrementadas e para que a hora de fecho das bolsas fosse o mesmo - um argumento que, de tão cretino, não merece mais comentários)...
Por favor não esquecer que vários países vivem e convivem com horas diferentes dentro do próprio país.
A mudança de hora tem a ver, simplesmente, com uma coisa a que os tecnocratas chamam de controle social e que visa condicionar as populações abrangidas....
um abraço!
I"

Chatices... e saídas precoces
"Eu preferia que fosse sempre hora de inverno. É que agora no trabalho, sempre que chegar material do estrangeiro tenho que estar a fazer contas. É sempre uma hora mais cedo do que vem nos «faxes»... e eu lembro-me bem que na anterior mudança de hora mudei os relógios todos da empresa e tive chatices porque alguns PCs se passaram. E o pior foi ter-me esquecido de acertar o relógio do telemóvel. Eram 4h da manhã, uns dias depois, e eu preparado para sair para o trabalho, quando só devia às 5h :)
Cruxe"

Ganha-se e perde-se..."O que se ganha em poupança (dizem...) perde-se em produtividade! Anda tudo com sono e com desconforto até se adaptarem!
Alcaide"

Que tal horas por turnos em vez de hora de Verão?
"Eu já trabalhei em turnos rotativos e tinha de alterar o meu ciclo de descanso de 8 em 8 dias. Assim, esta discussão por causa de 1 hora de diferença - e ainda por cima durante o fim-de-semana, em que a maior parte das pessoas está a descansar - só dá para rir.
taz"

Os transtornos da vida no campo"Mudar o horário da comida e da dormida aos bebés não é fácil e causa transtornos, nisso estamos de acordo. E já agora que dizer de mudar a hora da extracção do leite dos animais? Se pensarmos bem, há aqui pano para mangas.
Quanto à economia de energia, são tretas. O que se ganha de um lado gasta-se de outro e vice-versa. Se não pensem bem e tirem conclusôes.
No final, e feito o balanço, que ganhamos no assunto? Nada... e perdemos muito.
Quanto à hora do fuso horário, já é outra história.
José Palma"

Aborrecimentos"Acho que no fundo a maioria das pessoas discorda da mudança horária. Pessoalmente aborrece-me ter de alterar a hora aos sei lá quantos relógios que tenho em casa, os dos carros pregam-me grandes sustos, ficam sempre por acertar e depois quando dou por mim estou em pânico a pensar que estou atrasado!
Moura Viva"

Y Viva España"Bem, tenho uma opinião ligeiramente diferente. Como já tinha dito no meu blog, devíamos ter a mesma hora do resto da Europa. Estamos tão ligados a Espanha, e eles têm uma hora diferente. Ou será apenas um dos últimos bastiões contra a supremacia dos espanhóis?
zig"

Como?!..."Porque uma coisa é a hora solar e outra é a hora legal... 12:00 quer dizer meio-dia, ou seja o sol está a pique... como não podemos mudar o movimento de translação da terra, é mais simples mudar a hora «legal».
Bejense"

Baralho!"Estas mudanças de hora baralham-me sempre os sonos...
Clitie"

O romance português da mudança de hora (contado por quem sabe)Eu devo confessar que estas mudanças institucionais me são sempre muito perturbadoras. Das Instituições espera-se estabilidade, ordenamento e respiração desentupida, para que o bom do cidadão saiba com o que conta e - lá está! - a quantas anda. Quando as Instituições nos dão a volta ao texto, o cidadão perturba-se, o artista desiquilibra-se e a vida, sem essa rede protectora, vê a margem de risco agravada.
As questões curiosas e laterais - como a da poupança energética, etc. - só têm relevância no Canadá, na Finlândia e ali assim junto a Badajoz. Cá no burgo essa questão é despicienda pois, qualquer que seja a hora do dia ou da noite, os edifícios todos se engalanam com miríades de luzes acesas por defeitos vários e incontornáveis na concepção dos mesmos.
Claro que esta circunstância tem um chamado efeito colateral benéfico (para alguns). Vide os lucros anunciados pela "Eléctrica" nacional...
Por outro lado, ainda que não irrelevante, interessa que o ser humano seja capaz de sentir o pulsar da Terra e, com ela, das estações do ano. Elas trazem-nos, por sua vez, à oscilação progressiva dos ciclos dia-noite, com todo o encanto que tal possa representar para todos, com especial incidência no namoro e outras actividades pecaminosas. Para quê, então, destruir mais esse mistério, através da amálgama globalizada dos horários? É uma maldade! E é contra-natura!
E o vexame por que passam os pais, já cotas, à rasca para actualizarem a parafernália de electrodomésticos espalhados pela casa, tudo com reloginhos a piscar, perante o ar de gozo dos putos, esparramados de riso pela gritante dificuldade dos progenitores, às voltas com os respectivos livrinhos de instruções? É assim que pode desautorizar-se uma hierarquia, essa é que é essa!
Diz o Paulo - e com muita ciência - que os bebés, esses ainda em estado de pureza, não condescendem com estas alterações... o que leva tantos pais a terem de mudar as fraldas extemporaneamente cagadas já dentro do carro, quando poderiam estar a cumprir a rotina de as substituirem em casa, logo depois do pequeno almoço e a caminho de uma reunião com a gerência da firma.
Nã! Se me fosse dado votar, eu também votava contra a mudança da hora!
OrCa"

A EDP aproveita bem (!) as mudanças de hora"Eu também sou contra a mudança da hora. Não é por nada - ou até por tudo o que aqui já foi dito - mas também porque:
1 - Os meus cães ficam com as horas das refeiçóes e dos «passeios» baralhados;
2 - And last but not the least... Eu pago à boa da EDP um acréscimo de 2 - dois - euros mensais para ter um contador bi-horário que me oferece a energia com uma redução de quase 50% nos períodos de vazio.
Por períodos de vazio entende-se o horário das 22h00 às 8h00 no horário de inverno e o período das 23h00 às 9h00 no horário de verão, ou seja do fim de Março ao fim de Outubro.
Para que seja rentável o pagamento desta taxa, é necessário que as máquinas da loiça e roupa sejam ligadas no período de vazio, já que o aspirador só pode ser ligado de dia para não incomodar os vizinhos.
Mas, e aqui é que reside a questão, neste horário que agora começou, considerando um ciclo médio de lavagem de 90 minutos, e tendo em conta a hora de dormir de quem se levanta cedo para trabalhar, só dá para ligar uma das máquinas.
Resumindo: Mas por que carga de água é que a EDP há-de mudar o «horário de vazio» com a mudança de hora de verão, se a hora de abertura e encerramento dos empregos e serviços é sempre a mesma?
Só pode ser para «nos meter ainda mais a mão ao bolso», não acham?
Isabel Magalhães"

março 26, 2006

A mudança de hora - um belo tema para a argumentação racional


Ilustração gentilmente gamada ao BLOGotinha
Sou naturalmente alérgico à mudança de hora. Se fosse eu a decidir, acabava com isso. Já há bastantes anos que tenho lido muitos estudos e opiniões sobre a «hora de Verão», «hora de Inverno», «DST - Daylight Saving Time»,... e, para ser sincero, os argumentos de poupança de energia ainda não me convenceram e considero bem mais relevantes os factores que têm em conta o bem estar das pessoas, quer individualmente, quer na sua vida social e profissional.
Quem tem bebés sabe bem que não os consegue convencer que mudou o horário. Mesmo para os adultos, os primeiros dias de desfasamento de hora levam a adaptações forçadas do organismo (trabalho, sono, refeições,...) e a lapsos (que tanto resultam em meras anedotas como podem bem ter resultados graves). Para já não falar de haver sempre um relógio (pulsos, salas, telemóveis, despertadores, carros, equipamentos electrónicos,...) que nos esquecemos de acertar.
Não sei se alguma vez tentou informar-se sobre este tema e se sabe os argumentos que levam a este procedimento de mudança de hora. Pessoalmente, julgo que é um tema interessantíssimo para estudar no âmbito da argumentação racional.
O que me proponho fazer é criar uma página dedicada à mudança de hora em que, com base numa estrutura argumentativa, irei recolher dados, justificações, restrições, fundamentos e refutações, de forma a que possamos chegar a conclusões (com qualificadores e excepções) por nós próprios, de forma racional.
Obviamente, todos os contributos serão bem vindos. E agora vou almoçar, a uma hora em que o meu organismo ainda não pede comida...

março 21, 2006

Mensagem recebida por e-mail

"Caro Paulo Proença,

Venho mais uma vez felicitá-lo pela sua iniciativa em escrever o livro sobre argumentação. Li-o e estudei-o no ano passado. Foi difícil pois a temática não é ensinada nas escolas formais. Com o tempo fui interiorizando os conceitos expostos.

Hoje, começa a revelar-se bastante útil no meu trabalho, aumentando os meus níveis de assertividade e a clareza da minha acção.

Bem Haja.
Emanuel Pinho
Sales, Marketing and Business Development
Account Manager Indústria e Serviços
Netual GFI International"

Só tenho a agradecer-lhe a atenção que tem em escrever-me, ajudando-me a consolidar o que já interiorizei há bastante tempo: a argumentação e o pensamento crítico são temáticas realmente importantes e deveriam ser ensinadas nos cursos superiores, nomeadamente de gestão.
Se quiser enviar-me alguns casos reais com que se tenha já deparado ao longo da sua vida profissional, que ilustrem a boa ou má utilização de argumentos, terei muito gosto em publicá-los aqui (respeitando a indicação que me der sobre anonimato de pessoas e organizações). Aliás, este convite é extensivo a todos os que lerem o meu livro e/ou este blog.
Bem haja também.

março 19, 2006

A pirâmide bicuda - uma achega interessantíssima do Jorge Castro

Sobre a forma de ver a hierarquia nas organizações:
"Não poderia estar mais de acordo contigo!
Na verdade, a própria representação do modelo cria, por um lado, e reflecte, por outro o «estado das coisas».
A hierarquização vertical, até em termos de esquema mental, propicia a criação de «patamares» estanques de responsabilidade perante um determinado status empresarial, quando a responsabilidade deve ser encarada na perspectiva da partilha.
Há, nos organigramas «tradicionais», uma herança que poderia, até, chamar-se feudal, por posicionar o topo da pirâmide mais perto dos céus... logo, de Deus ou dos deuses o que, também dessa forma, condiciona e indicia posturas.
E a pirâmide não é vista como um vector indicativo de rumo a seguir, mas sim como uma mera representação do escalonamento social - o que nada tem a ver com a gestão em si mesma.
Ponderassem melhor alguns gestores e talvez descobrisssem que os faraós não se colocavam no vértice da pirâmide, posição certamente incómoda para quem ali deseja ficar para toda a eternidade...

Um grande abraço.
Jorge Castro"

Organogramas, hierarquias e linhas da frente

Na sua crónica «À Luz do Dia» de ontem, na revista «Xis» do jornal «Público», Laurinda Alves escreveu que "felizmente não existe na XIS uma hierarquia em forma de pirâmide mas uma linha da frente onde cabemos todos e onde todos avançamos ao mesmo ritmo. Um ritmo muito contagiante, devo dizer."No meu livro «Persuacção - o que não se aprende nos cursos de gestão», defendo esse mesmo princípio e proponho que o organograma seja visto em cima de uma mesa e não afixado numa parede:
"O gestor não está «no topo da pirâmide» (visão deformada dada pelo tradicional organograma, visto na vertical) e sim «na ponta da seta» (imagem dada pelo organograma visto na horizontal): assegurando a direcção a seguir, a coerência da estratégia e a coesão da estrutura da organização. Se esta imagem fosse alterada, muitos preconceitos, complexos de superioridade (ou de inferioridade, para quem se sente «por baixo»), distanciamentos remuneratórios e «sociais» desapareceriam ou seriam, no mínimo, atenuados. No que respeita ao tema específico que estamos a abordar, poderia contribuir para uma mais fácil persuasão para a mudança, quando essa necessidade fosse detectada em qualquer área, por qualquer elemento da organização." (pág. 46)

março 06, 2006

O livro «Persuacção» no Centro de Documentação dos Correios


Segundo a reportagem publicada na revista dos Correios deste mês, o livro «Persuacção - o que não se aprende nos cursos de gestão» é um dos livros mais requisitados no Centro de Documentação da empresa.
Bem hajas, Carlos Carvalho, pela informação.

março 04, 2006

Após caricaturas do profeta Maomé

"O Presidente da República, Jorge Sampaio, apontou hoje o «diálogo contínuo» e o «melhor conhecimento mútuo» entre o Islão e o Ocidente como a via para evitar a repetição de violência como a gerada pela publicação de caricaturas do profeta Maomé».
«O diálogo e a convivência - não apenas entre Governos, mas também entre homens de cultura, de leis e de religião de ambos os lados - são especialmente necessários e importantes neste momento delicado das relações entre o Ocidente e o Islão, em que qualquer mal-entendido ou divergência podem rapidamente assumir enormes proporções junto das opiniões públicas, como ainda recentemente vimos», disse, no final da sua deslocação à Argélia."

in Diário Digital, 04-03-2006

A força dos argumentos contra o argumento da força. Eu não diria melhor.