abril 25, 2006

O Simplex visto pelo Jorge Castro

"Vivendo eu - profissionalmente falando - numa grande empresa dita privada, mas onde a tutela do Estado se faz sentir, não como regulador e vigilante do interesse público mas mais como reflexo de pressões clientelares que desconhecem a razão e que a razão desconhece, sigo com atenção este interessante «debate» sobre o Simplex...
Creio, até, que haverá uma unanimidade nacional quanto à necessidade de abater o fardo que a burocracia doentia representa nas nossas vidas. Mas poderemos dar crédito aos nossos governantes?
Nestas questões, para além da questão da «atitude» a tomar, há, na verdade, a questão da liderança e, nela, o importante vector do exemplo dado por essa liderança.
Se vos disser que, na «minha» empresa, constituída juridicamente em 1994, conto até à data com a nomeação de 18 (dezoito!!!) gestores, integrando 7 (sete!!!) elencos de gestão, o que direis quanto à possibilidade prática de colocar no terreno o que quer que seja de sustentável?
E mais: onde é que estão os responsáveis pelas más políticas ou pelas más práticas? - Ao fim de um ou dois anitos, já tudo se escafedeu... e quem vier atrás que apague a luz!
Para não me alongar muito, direi apenas - com uma «boca» talvez um pouco anarca - que acreditarei no Simplex e nos «simplexes» todos quando vir um gestor bater com os costados na barra do tribunal por gestão danosa ou lesiva dos interesses nacionais (e quantos há nestas condições!...). O que verificámos todos os dias? - Salto de poleiro e airosa pancadinha nas costas.
E curiosamente esta lógica vale para as empresas públicas como para as privadas.
Até à tal fase do tribunal e sem cinismo exagerado, vejo, ouço e leio. Quando algo é posto no terreno, nem me dá para acreditar...
Tudo isto é deveras complicado. Mas tomemos um exemplo comesinho: faz sentido equipar informaticamente as brigadas da polícia se não há verbas para os coletes de protecção? Ah, pois, serão coisas paralelas e uma pode ir sem a outra. Talvez... mas eu cá não subscrevo.
Outro: Faz sentido aumentar as taxas moderadoras na saúde antes de efectuar um levantamento exaustivo dos recursos efectuados nos últimos dez anos, por tudo o que é governante ou acólito, neste país? Talvez desvendássemos impensáveis compadrios, a custo zero para os próprios, mas que saem do bolso do povinho, apenas na lógica de que devemos fazer o favorzinho ao sr. ministro... E a arte de saber cair em graça continua a render mais do que a de ser engraçado.
É que, nestas matérias e neste país, interessa saber sempre quem é padrinho ou afilhado de quem, o que geralmente desvirtua, logo à nascença, o projecto mais bem intencionado.
A começar por algum lado, interessava recomeçar a ouvir falar-se de concursos públicos transparentes, por exemplo. E avaliações publicadas e publicitadas.
Porque a questão fundamental coloca-se ao nível da credibilidade dos agentes. Mas ela apenas é sustentada pela capacidade que o comum cidadão tenha de poder exercer um magistério de controlo e, até, de promoção de responsabilização, quando for o caso.
E, sem credibilidade, o bom do Zé Povinho lá fica a fazer manguitos, dizendo que «cantas bem mas não me alegras», enquanto tenta cinicamente safar-se nas economias paralelas.
Se me é permitido o vernáculo, há em tudo isto uma enorme falta de tomates, sobrando-nos esta calda pantanosa do compadrio que nos tolhe os movimentos.
Não sou céptico. Tenho-me mais na conta de realista. Por isso sou optimista em relação ao Simplex. Mas atento, pois conto já muitos anos de enganos e outros tantos de desenganos!

Jorge Castro"

14 comentários:

  1. Concordo com o texto. Não deixa de ser curioso que os mais descrentes que por aqui comentam são funcionários de empresas/institutos/organizações (de uma forma ou de outra) do Estado...

    ResponderEliminar
  2. Ah, e mais uma achega: a minha empresa (uma EPE, actualmente), desde 1997 já teve cerca de 7 presidentes (confesso que deixei de os contar, e até já nem esforço por saber quem eles são). Administradores, nem sei...

    Enquanto os cargos de gestão forem políticos, não creio que a situação melhore... :(

    ResponderEliminar
  3. Eu , por exemplo, sou adepto do poder de controlo do cidadão.
    E você? Se visse , digamos , o Valentim Loureiro passar - lhe perto? ou o de Marco de Canavezes ?ou o Isaltino?! Pregava-lhe um sopapo?!...
    Eu teria imenso gosto e sou da opinião que esta prática se generalize. O cidadão ao mesmo tempo que exerce o seu poder de controlo , liberta-se das tensões causadas , por ex.º , pela falta de dinheiro no final do mês ou pela derrota do seu clube , no fim de semana ultimo.
    Mas atenção , não proponho a bárbarie. Não! Os sopapos são dados à vez e cada cidadão só tem direito a arrear num crápula por dia.Com ordem e civismo. E ,aproveitando o proposto simplex, sem o preenchimento de qq formulário.

    Bem hajam.

    ResponderEliminar
  4. Mas olhem que as empresas públicas não têm o monopólio destas situações...

    ResponderEliminar
  5. Bom, de nomeações políticas creio que sim. Já do resto...

    ResponderEliminar
  6. Nas empresas privadas também tens nomeações «políticas»...

    ResponderEliminar
  7. Bom, eu arriscaria dizer que na administração pública SÓ tens nomeações políticas...

    ResponderEliminar
  8. OK, tu queres mesmo "ganhar"...
    ;-)

    Paulo Moura

    ResponderEliminar
  9. :D Infelizmente, acho que é mesmo assim...

    ResponderEliminar
  10. Mas temos sempre a tendência a pensar que os nossos males são piores que os dos outros...

    ResponderEliminar
  11. Lamentavelmente, estou em crer que para este "mal" não há, em Portugal, empresas públicas ou privadas.

    Trata-se de uma questão cultural, se quisermos, que define uma atitude.

    Numa empresa pública, como numa privada, atribui-se um computador topo de gama a um director, por exemplo, não porque seja necessário ou, sequer, porque esse director domine as técnicas, mas sim porque É UM DIRECTOR, logo, "merece" mais do que os seus subordinados.

    É esta "lógica" que subverte as relações laborais, nas perspectivas de competências e de eficácias, torcendo-as para o espúrio lado do "status"... que não levam as empresas a lado nenhum que não seja o da falência.

    A diferença, aqui, entre público e privado, é apenas esta: no privado, a fonte seca e a empresa fecha, depois de atribuídos os Ferraris aos respectivos donos; nas empresas públicas, a fonte não seca, não se atribuem Ferraris, mas os Mercedes e os Jaguares e os BMW têm a sua quota de venda permanentemente assegurada.

    E, assim, Portugal terá a melhor frota automóvel da Europa em circulação nas piores estradas da Europa.

    Como se vê, nem tudo é mau!

    ResponderEliminar
  12. Concluindo raciocínios, já de si intermináveis:

    - As estradas serão, em média, as piores da Europa, mas a gasolina é das mais caras... e as portagens, também... e a electricidade, também... e o gás também... e a água também... e a saúde também... e a internet também... e valerá a pena continuar?...

    Apenas porque uma escassa minoria de umas centenas de milhar (que parecem muitos, mas não são!) se permite estabelecer padrões de vida, sem rei nem roque, dos quais são os únicos beneficiários, numa lógica autista que determina, afinal, as vivências de muitos milhões.

    Não é assim? Bem, por estas razões, a que se aliam convenientes e cúmplices fechar-de-olhos a elementares regras de concorrência e, até, de legalidade democrática, é que um IKEA - privadíssimo - quando aparece em Portugal apresenta os preços mais elevados de toda a sua cadeia europeia, num país com a média de salários (per capita) mais baixa da Europa.

    Estratégia estúpida? Claro que não. Em Roma, sê romano. À falta de controlo generalizado, é um fartar vilanagem. E a malta lá vai pagando.

    Nos intervalos, vai quase tudo aos jogos de futebol e compra os jornais "desportivos" para se manter informado acerca da arte de se tornar num imbecil sem dor, mas com muita anestesia.

    ResponderEliminar
  13. Um aparte: ouvido da boca de um director, a afirmação de que, a haver limitações na dimensão das mailboxes, os directores deveriam ter mais espaço, já que usam e precisam mais do email que os restantes funcionários...

    Se alguém vir este comentário, nego a autoria! ;)

    ResponderEliminar
  14. Outrora fomos uma potência mundial, um país que tomou a iniciativa e o rumo do seu destino nas Suas mãos.
    Temos um legado e uma tradição de empreendedores a preservar. No passado descobrimos o mundo contra todas as adversidades.
    Hoje, em Portugal, estamos sempre à espera de que venha alguém superior (chefe, politico) com as directrizes ou um plano de actuação que tenhamos de seguir.
    Não se toma a iniciativa, o espírito empreendedor e a tomada de riscos não são incentivados nas universidades, escolas e em grande parte das empresas. Tem tudo a ver, na minha opinião, com a qualidade de líderes que estamos a formar na nossa sociedade.
    Um verdadeiro líder pode não ter a autoridade formal para recompensar ou punir boas/ más prestações, mas as pessoas que o rodeiam reconhecem nele uma verdadeira autoridade ao satisfazer os seus pedidos, ou seja se devidamente motivados os colaboradores tomam a iniciativa sem que seja necessário andar a puxar pelos “ galões”.
    Nas organizações inovadoras e modernas as pessoas que são o motor do desenvolvimento das empresas assumem a autoridade apenas e só através do sucesso alcançado em anteriores iniciativas.
    A questão vital nesta nova teoria de gestão é a de que os colaboradores seguem um líder porque é essa a sua livre vontade e não porque o têm de fazer.
    È essa a motivação que os faz ir para além do trabalho necessário e esperado ou seja o de ir sempre um pouco mais além daquilo que lhes é “ exigido”e que acaba por fazer a diferença com entusiasmo, motivação e paixão.
    O Marechal da Prússia Helmuth von Moltke (1800 - 1891) estabeleceu a elaboração de directrizes aos seus oficiais em vez de ordens.
    Moltke pretendeu desenvolver o empreendedorismo nas suas fileiras ao motivar os oficiais prussianos a tomas decisões por iniciativa própria.
    Os grandes empreendedores criam uma cultura empresarial na qual a sua visão e valores são vividos por colaboradores que pensam de uma forma independente.
    Hans Hinterhuber e Wolfgang Popp elaboraram para a HBR um artigo em que , partindo da análise de Moltke sugeriram que os empreendedores e gestores á semelhança de atletas de alta competição ( ex. de Michael Schumacher ou Tiger Woods ) para se tornarem campeões necessitam de muito treino e trabalho continuo com a finalidade de desenvolverem competências pessoais a fim de melhorem as Suas aptidões naturais. Hinterhuber e Popp criaram um questionário que pode ajudar um gestor a medir a Sua competência de liderança e gestão estratégica.
    Aqui estão descriminadas as questões que servirão de base para uma análise introspectiva de cada um de nós. 1. Tem uma visão empreendedora sobre o futuro da Sua empresa/departamento? 2. Está consciente da filosofia da empresa e do papel que desempenha nela ? 3. Sente que os seus produtos, serviços ou marca oferecem ao seu cliente um claro beneficio e à sua empresa uma vantagem competitiva sobre os seus concorrentes?
    4. As pessoas que dependem de si hierarquicamente agem de uma forma independente e de acordo com os objectivos da empresa sem uma dose exagerada de “supervisão” da Sua parte?
    5. O seu departamento/empresa reflecte a Sua própria visão? 6. Envolve os Seus subordinados no planeamento estratégico?
    7. Os valores corporativos da sua empresa/departamento estão alinhados com esse planeamento estratégico? 8. Observa atentamente os seus concorrentes de mercado e tenta aprender algo de novo com eles? 9. É da opinião de que o seu sucesso se deve ao seu trabalho árduo e não à sorte? 10. Está a tentar deixar o mundo num local melhor do que aquele que é no presente?

    ResponderEliminar