Preferiria
não ter a minha segunda estreia neste blog
abordando assunto que tomou conta do
noticiário nas últimas semanas, precisamente nos dois últimos dias, com a execução por fuzilamento do
brasileiro Marco Archer, na Indonésia.
Um
assunto que me custa muito formar uma opinião. E ainda não a tenho, em definitivo. Primeiro,
como mãe, sequer cogito a mais remota
condição de saber que um filho será executado,
ainda que essa sentença tenha cumprido o devido processo legal. No caso do
Marco, a Lei Natural da Vida se encarregou de cumprir o objetivo: pai e mãe
morreram antes de passarem por mais esta dor, mas não sem antes terem vivido, com
o filho, o cumprimento doloroso dessa punição, desde a prisão, em 2004, pelo tráfico
de mais de 13kg de cocaína levados no tubo de sua asa delta. Segundo, sendo Marco Archer também brasileiro (e sem me esquecer de tantos outros nessa mesma espera, de outras nacionalidades), também me angustiei com o final
tão triste. Por longos dez anos, à espera de que algo
aconteça, que dê uma reviravolta, que o tempo pare, que as decisões mudem, que compreendam
a vida de uma pessoa mais importante do
que qualquer lei, enfim. Terceiro, como refém de uma situação, começamos a achar que para alguns crimes
como estupro, latrocínio, pedofilia, tráfico de pessoas, tráfico de drogas e tantos outros crimes,
considerados hediondos, a pena de morte seria bem-vinda, como forma de mitigar
o que as estatísticas nos mostram, dia a dia, no Brasil, com leis tão frágeis
nesse sentido, resultando em reincidências e criminosos nas ruas, enquanto cidadãos de bem estão trancados em suas casas, com medo de saírem às ruas.
Um emaranhado de conclusões inconclusivas permeiam nossos pensamentos a respeito do que se passou. A verdade de cada um. Cada qual se fundamentando nos mais exacerbados argumentos e teorias sobre pena de morte. Eu não sei qual a "minha" verdade. Talvez nem ainda a soubesse, mesmo sofrendo na pele o que condenados (?) devem sofrer, merecedores ou não dessa punição. Morreria, sem compreender a verdade dos homens.
A
execução do brasileiro, no último sábado, às 15h30 – horário de oficial do Brasil -, causou diversas reações, entre indignação, tristeza,
consternação e até aprovação do cumprimento da pena. Trouxe à baila grande polarização entre críticos e defensores da pena de
morte. Nesta última,
pessoas que certamente têm
inúmeros motivos para assim se posicionarem, ou porque já viveram, em família, o drama de filhos mortos, assassinados por traficantes, ou por terem morrido de overdose, vítimas, vítimas, vítimas...ou, simplesmente, apenas por torcerem para o circo pegar. Até onde chega a falta de razão
de um ser humano!?
Não
houve pedido de clemência, do Papa à Presidenta Dilma, que sensibilizasse Joko
Widodo, presidente da Indonésia empossado em outubro passado. Durante a
campanha pela presidência da Indonésia, prometeu
aumentar a repressão ao tráfico de drogas em seu país. As esperanças de Marco, a partir dali,
começaram a ficar duvidosas.
Joko
sentenciou ao fuzilamento, inclusive, um
cidadão da indonésia, além de outros
estrangeiros (Brasil, Vietnã, Nigéria, Holanda e Malauí).
Na
fila da morte, outro brasileiro, Rodrigo
Gularte, preso em 2004, quando entrou na Indonésia com 6 kg de
cocaína escondidos em pranchas de surfe,
além
de uma britânica, de 58 anos, envolvidos com o tráfico de drogas. E essas
próximas execuções serão para breve, noticiam.
A Anistia Internacional (AI) classificou como um "retrocesso", o fuzilamento dos 6 condenados, na Indonésia.
Morte
pela fogueira, empalamento, guilhotina, garrote, roda, pisoteado por elefante,
apedrejamento, desmembramento, escaldamento, funeral vivo, crucificamento,
entre outros, foram os métodos de
execução aplicados ao redor do mundo, ao longo da história (alguns ainda são
usados), o que reafirma a posição da AII. Embora a maioria dos países
tenha abolido a pena de morte (no Brasil, essa prática é prevista em situações
de guerra, no artigo 5º,inciso XLVII da Constituição Federal), em 78 nações é uma prática recorrente, seja por meio de injeção
letal (China e Estados Unidos), decapitação (Arábia Saudita), enforcamento
(Afeganistão e Irã), fuzilamento (Indonésia, Somália e Vietnã).
Contudo,
estudos demonstram, por exemplo, que dos 36 estados americanos que adotam a
pena de morte, o índice de assassinatos por 100 mil habitantes é muito maior do
que nos outros 14 estados que não condenam à morte. O que demonstra a
ineficácia da pena consubstanciada no desrespeito ao ser humano e vulgarização
da vida. Outro exemplo, a China, é o país que mais aplica penas de morte no
mundo, com cerca de 4.000 mil execuções/ano, e mais da metade desse total,
pasmem, é realizado antes de serem revisadas as sentenças, pela Suprema Corte.
Isso
vem provar, em contrapartida, que o remédio pedagógico, como forma de inibir a
prática de crimes, nem é tão eficaz assim. E nem vou entrar no mérito de
quantos inocentes devem ter morrido, sem antes terem provado a inocência, e de
quantos pertenceriam às classes sociais desprivilegiadas.
O
que o chamando mundo ocidental tem feito pela “humanização” da pena de morte? Podemos
afirmar que houve um avanço, se considerarmos que na Idade Média as execuções
eram um espetáculo público, como forma de ferir, também, a moral do indivíduo e
de sua família. Com a consolidação da Inquisição na Igreja Católica, no século
XVII, as execuções eram por decapitação,
enforcamento ou mortes na fogueira. (Nesse particular, tenho minhas críticas
sobre como a Igreja Católica, que deveria, desde sempre, pregar o amor e o
perdão, foi capaz de tamanha crueldade).
Avanço
nos métodos empregados, somente? Com o episódio de Marco Archer, muito se
ouviu: “Poderiam condená-lo à prisão perpétua, mas não matar”. Em uma das
muitas matérias veiculadas nesses dias, Marcos teria pedido que o matassem logo, uma
vez negados todos os pedidos de clemência. Como resposta, o diretor da prisão onde se
encontrava preso respondera-lhe: “Adoraria
te matar agora, Marcos, mas o homem (presidente) ainda não deu a ordem”.
Qual é a diferença, afinal, em matar em nome da lei, matar como faz o grupo Boko Haram, como também no mais recente episódio do Charlie Hebdo, o açoite do blogueiro saudita, em praça pública e tantos outros?
Poderia trazer à discussão, ainda, a questão do limite da soberania de um
país; o cumprimento às leis; a desproporção da não pena de morte para crimes
mais graves; a tentativa em diminuir o número de crimes com a pena de
morte, sem resultados plenos; as falhas
nessa negociação do governo brasileiro com o governo da Indonésia; o nosso vulnerável Judiciário; as cadeias
superlotadas; a não ressocialização do preso; a corrupção nos sistemas prisionais; qual a classe social que mais tem sofrido a condenação por pena de morte; e a contradição do governo da Indonésia: o mesmo que condena à morte é o mesmo que pede clemência à Arábia Saudita, para uma cidadã indonésia, por assassinato e roubo de sua empregadora.
São temas que certamente merecem discussão, e são complexos, di per si.
Porém, finalizo com a posição do
ex-ministro francês, Robert Badinter: "Porque nenhum homem é inteiramente
responsável, porque nenhuma justiça pode ser absolutamente infalível, a pena de
morte é moralmente inaceitável”.
E, talvez, eu tenha, enfim, formado uma
opinião a respeito da pena de morte.