dezembro 11, 2011

Com a devida vénia e o devido respeito, transcrevo o texto da autoria do Tenente-Coronel da Força Aérea, com a especialidade TODCI, José Lucas, que recebi na minha caixa de correio electrónico. Quando dizemos que há mais vida para além do défice, também deve ser a casos destes que nos referimos.

JC

«HERÓI POR 300 € 

A notícia já correu o Mundo inteiro. Seis tripulantes de um barco de pesca, o ‘Virgem do Sameiro’, de Caxinas, foram encontrados por um helicóptero EH-101 da Força Aérea e foram salvos pela tripulação do mesmo, nomeadamente por um Sargento-Ajudante (o recuperador - salvador), que pendurado num guincho, arriscou a sua vida em 6 subidas e descidas.

O panorama é inimaginável.

Um helicóptero no meio da imensidão do mar, com mar agitado, os pilotos tentando colocar o helicóptero na melhor posição (o que é dificílimo, tratando-se de um navio grande, quanto mais de uma simples balsa salva-vidas, a turbulência provocada pelas pás do aparelho, o recuperador - salvador a descer e a subir, a ter de recuperar um a um, estejam feridos ou não. Parece algo de outro mundo, mas não é,... aliás, afinal é!

É algo do outro mundo, pelo menos do meu mundo, pois não tinha condições para o fazer. É algo deste mundo, porque estes heróis da Força Aérea fazem-no diariamente, arriscando a sua vida para salvar outras vidas. Muitas vezes fazem-no mas muito mais longe, a cerca de 150 km da costa. Se houver uma falha humana, uma avaria e o helicóptero cair, provavelmente morrerão (pois é preciso que outro meio aéreo que está em alerta descole, voe, os encontre com vida e consiga recuperá-los). 

Mesmo assim, este militares cumprem o seu dever: têm família, filhos, que têm como dado adquirido que o pai volta mais logo e, nem imaginam que tal pode não acontecer. Poucas pessoas sabem o seguinte:

a) O Sargento-Ajudante recuperador-salvador está neste trabalho voluntariamente;

b) O Sargento-Ajudante recuperador-salvador está neste trabalho porque passou por testes e provas dificílimas, apenas acessíveis aos melhores física e psicologicamente; 

c) O Sargento-Ajudante recuperador-salvador ganha cerca de 1300 € limpos (um profissional com muitos anos de carreira, que arrisca a vida muito mais do que ninguém, voluntariamente, por amor ao serviço, ao próximo); 

d) O Sargento-Ajudante recuperador-salvador tem de estar disponível 24 horas por dia, deixando a família para trás a qualquer momento, sempre que for chamado ao serviço inopinado; 

e) O Sargento-Ajudante recuperador-salvador recebe cerca de 300 € líquidos de risco de voo (menos do que os pilotos, que também arriscam a vida, mas arriscam menos pois não estão pendurados num guincho); 

f) O Sargento-Ajudante recuperador-salvador, tal como os demais militares dos 3 Ramos das Forças Armadas, continua a salvar vidas, com ânimo, profissionalismo e competência, apesar de lhe terem cortado o vencimento desde o ano passado, apesar de lhe terem tirado o subsídio de férias e de Natal, apesar de não ter perspectiva de evolução na carreira nem aumento de ordenado; 

g) O Sargento-Ajudante recuperador-salvador não tem mordomias, carros de luxo, condutor, sala própria, secretária, telemóvel de serviço, despesas de representação chorudas, outros emolumentos mais ou menos disfarçados. 

h) Para mim, estes são os verdadeiros heróis, aqueles que apesar de fortemente penalizados, fortemente incompreendidos, apenas lembrados aquando de actos heróicos mediáticos como este, continuam dia após dia a cumprir além do dever.

O Sargento-Ajudante recuperador-salvador, como todos os militares merecem o respeito por parte de quem governa, para que entendam que não se trata de um funcionário público (aliás muitos respeitáveis), mas sim de um cidadão especial, que jurou publicamente dar a vida pela Pátria, dar a vida para que outros vivam.
À atenção de quem de direito !!!

José Lucas

PS - Num exercício de imaginação, tentei considerar a hipótese dos respeitados e digníssimos representantes do povo, na Assembleia da República (AR) receberem 1300 € de vencimento mais 300 € de risco. Provavelmente a AR ficaria vazia. Dir-me-ão: mas não é a mesma coisa, são responsabilidades diferentes. Pois são: o Sargento-Ajudante recuperador-salvador arrisca a vida 


diariamente para que outros vivam!»

12 comentários:

  1. aplaudo.A verdade leva tempo a pousar em certos ouvidos. Há que insistir.
    Conceição Paulino/TMara

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  2. Os critérios das remunerações são mesmo algo de muito esquisito...

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  3. Só não aplaudo como a Conceição, porque o texto, sempre muito bem como é cunho do Orca, enche-me de uma revolta triste.
    Saiba-se que além de tudo mais, a responsabilidade por acidentes e eventualidades que possam decorrer da acção de salvamento, são de imediato imputadas aos desgraçados heróis que arriscam a vida por um prato de lentilhas. Autos e processos é tal e qual como na Polícia que ao perseguir um "benfeitor" amigo do alheio, despista um carro de serviço e em serviço.
    Entretanto, na assembleia, as barrigas vão tomando as formas redondas do alheamento.
    NAda como uma boa redoma de conforto para mandar uns bitaites, fazer leis e inventar impostos.
    Só dava a cada um deles uma hora a tentar ajudar a salvar náufragos naquelas condições. Desconfio, porque acredito que no fundo há sempre algo de bom em cada ser humano, que no fim haveriam de sentir um nó na garganta quando fossem receber as maquías a que tem " o justo direito"

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  4. Mesmo dentro das organizações, o equilíbrio das remunerações é, na maioria das vezes, injusto.

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  5. É muitas vezes injusto e por vezes até, canalha...

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  6. Tanta filhadaputice que por aí há...

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  7. Pois, São....
    E puta és tu, e não tens filhos desses..
    É injusto, este mundo, injusto...

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  8. Só agora me deparei com esta noticia mas, mesmo que tarde quero postar. Com muito orgulho servi a Força Aérea, o país e a HUMANIDADE como recuperador salvador. Pertenço ao 2º curso desta especialidade realizado em 1981, dediquei-me a esta missão até 1988, nesta data e por razões particulares deixei este serviço e também o serviço activo na FAP. Em 1982 tive um acidente em missão de treino, sem saber fiquei com uma lesão na medula que só posteriormente foi identificada, sofro de paraparésia espástica perdendo a mobilidade dos membros inferiores, foi-me atribuida dificiencia a 80%, pedi reabertura do processo e que fosse considerado dificiente das forças armadas, aqui está a parte politica da questão ou seja a procuradoria geral da republica considera que a missão de recuperador salvador em treino não é de risco agravado, só em missão real. Nota: as missões de treino têm que ser duras para que se possa estar preparado para as missões reais. Tenho o processo a correr há 5 anos e ainda não sei o resultado final. Neste momento não posso angariar meios para a minha sobrevivencia e tenho que viver com pouco mais de 600€, não me arrependo do que fiz, antes pelo contrário mas, isto é a justiça dos homens.

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  9. Chiça, Augusto Rodrigues. Só de ler já faz muita impressão, nem consigo imaginar o que é passar por isso!
    Permite que divulgue esta sua mensagem no blog?

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  10. Sim autorizo! Não é por ser uma injustiça contra mim mas porque sou contra todas as injustiças.

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  11. Como prefere? Publico o que aqui comentou ou prefere enviar-me um texto por e-mail? jpcpmoura@gmail.com

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