outubro 12, 2011

Nostalgia e pessimismo (só desta vez…)
- morreu um jovem mineiro numa mina em Portugal

Há qualquer coisa de profundamente anacrónico ou até de esquizofrénico numa sociedade onde se propagandeia a nossa adesão incondicional e imediata aos mais vanguardistas avanços da tecnologia, que nos transforma numa espécie de árvore de natal com pernas, onde os enfeites são iPhones e iPads e iPods, num ai-jesus-que-não-me-chega-o-que-ganho mas, logo ali ao lado, uma mina de volfrâmio, velha como as coisas velhas, desaba sobre um jovem de vinte anos, ceifando uma vida, inútil e desperdiçadamente, por pouca ou nenhuma aplicação dos avanços tecnológicos de que a Humanidade dispõe e que tão bem poderiam e deveriam prever e impedir desgraças destas.

Que me perdoem os puristas da arte de bem escrever pela extensão do parágrafo anterior, mas ela é seguramente menor do que a extensão da sensação de indignação que me percorreu ao saber de mais esta morte inútil. Deste desperdício de uma vida ainda tão pouco vivida.

Por uma daquelas coincidências em que a vida é fértil, perto da mesma hora em que decorreu tão funesto evento, estava eu, no teatro A Barraca, em Lisboa a ouvir uma actuação de um grupo coral constituído por velhos mineiros reformados das minas de São Domingos, no Alentejo, actuação que foi encerrada por um Hino aos Mineiros, em homenagem a todos os camaradas mortos no exercício da sua esforçada labuta. Podem ser colhidos mais detalhes aqui: Grupo Coral da Liga dos Amigos da Mina de São Domingos - http://ligasaodomingos.com.

Cântico colhido no acervo musical asturiano, cuja fertilidade se empolgou durante a Guerra Civil espanhola, e que os irmãos alentejanos tiveram artes de adoptar como bandeira cantada.

Cântico a que o acaso aliado à necessidade – neste caso, a necessidade imperiosa do sustento diário – conferiu foros que ninguém, de quantos presentes juntaram a sua voz àquele hino, imaginaria.  

E fico-me por este apontamento-reflexão ou seja lá o que for isto, constrangido pelo desperdício tão inglório de uma vida, a somar a tantas outras que enxameiam a planura alentejana, e a que a bateria interminável e inexorável de i-qualquer-coisa dos cumes da tecnologia, não descobre artes de pôr cobro.

Nostalgia e pessimismo? Se calhar estavam à espera que eu comentasse o facto de a entidade patronal envolvida ter, muito prontamente, sugerido que o rapaz morreu por culpa dele próprio…

3 comentários:

  1. As minas sempre me fizeram uma impressão terrivel. Não só por serem uma ferida na grande Mãe Terra, mas ainda por serem a ponta duma cadeia terrivel. Morre gente debaixo do chão para tirar o metal com que se há-de fazer os meios para matar mais gente. Morre gente debaixo do chão para tirar grão a grão, grama a grama, aquilo que é precioso, ao ponto de se tornar tão banal que é às toneladas que enche dele as lixeiras.
    Pensemos: sempre que se deita uma lata fora, houve suor, lágrimas e morte por cada X de unidades daquilo que esgota a sua serventia uma vez acabado seu conteúdo.
    É isto sustentável???
    Nem num mundo infinito....

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  2. Fazes um post ou tenho que o fazer eu?

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