novembro 13, 2011

Somos reféns do sistema económico, ou podemos derrubar o gigante?


O que eu penso disto é que existem de facto reféns.
Acabamos por ser todos reféns de um sistema ou melhor, estamos aprisionados pelos limites de uma máquina que tem uma lógica implosiva e constrictora.
Desde há mais de dois séculos que se sabe qual o percurso natural dos sistemas económicos baseadas na concorrência: a concorrência elimina a concorrência! Ou seja, um mercado aberto acaba por ficar fechado no restrito círculo de interesses dum pequeno grupo que anulou toda a concorrência.
É-nos fácil pegarmos nos exemplos mesmo ao pé da porta, da nossa porta.
Dantes podíamos escolher entre as mercearias do bairro, depois vieram os "hipers" e passamos a escolher cada vez mais os "hipers" quer pelo preço, quer pela diversidade da escolha. Agora, que os merceeiros faliram, pela concorrência feroz dos grandes espaços, os "hipers" vendem o que querem com muito menos variedade na oferta e ao preço que mais lhes convêm; a eles, não a nós.
Por outro lado, os produtores - e uma vez que eles deixaram de ter mercado junto aos antigos merceeiros -, passaram a ficar do mesmo modo quase totalmente dependentes dos "hipers" que lhes impõem preços de miséria, limitação na variedade dos produtos e prazos abusivos, ou seja; condições de operação totalmente imorais, anti-económicos, para não ir mais longe e dizer ilegais.
Este exemplo, que pode parecer despropositado, tem tudo a ver com o que J.Couto escreve e tem o sentido de desmontar a terrível deriva antidemocrática que alguns políticos pretendem - como Manuela Ferreira Leite - adoptar como processo de implementar medidas e soluções.
A verdade, e pelo que atrás ficou dito em relação aos "hipers" versus mercearias, é que o corte da nossa capacidade de reagir contra o ataque aos nossos direitos não resolve coisa alguma. Esta falácia é-nos metida na cabeça pelos políticos incompetentes e com falta de coragem para dar o murro na mesa e apontar os verdadeiros culpados: o monopólio do sistema financeiro! Este sim a cabeça da serpente constritora que nos sufoca.
Subrepticiamente, como os ofídios, este sistema foi lançando os seus tentáculos, espalhando créditos através de uma cadeia que acabou por tornar TODOS reféns.
Fomos nós, os consumidores, que encantados pelo cante da sereia, dos "baixos preços" eliminámos todo um sector que criava empregos locais e que permitia uma saudável concorrência entre produtores que por sua vez também criavam empregos. Fomos nós, os Países, falando agora em macro, que para desenvolver as economias (que modelos de economias?), embalamos no cante do crédito fácil sempre a subir em direcção ao sol e que agora de repente vemos as asas de cera a derreter, o mar escuro lá em baixo... e já estávamos quase a chegar ao Paraíso...
E o culpado é a Democracia?!
Vimos ao longo da História que nas alturas de convulsões económicas, as franjas das sociedades aparecem como os bodes expiatórios, os culpados de tudo. Uns porque são pretos, ou porque são ciganos, ou porque são imigrantes, ou porque têm o cabelo encaracolado, ou porque são funcionários públicos, ou porque são democratas...
E ninguém aponta o dedo aos que - uma após uma - ficaram com todas as cordinhas nas mãos e que se divertem "bués" a fazer de todos nós marionetas das suas jogadas.
Pois bem, é hora de nos unirmos e em conjunto puxar pelas cordinhas que nos prendem e deitar abaixo o gigante de papel que nos tem reféns dos seus dedos.
A solução que muitos apontam - a tal suspensão da democracia - iria apenas permitir ainda mais o fecho da espiral da serpente que nos constringe, pois o único limite é o que advém da livre expressão da nossa indignação, quer seja em acções de rua ou nas urnas.
Não se pode dar crédito a políticos que apontam, como solução para a crise, a adopção de medidas que aprofundam mais a crise, mas parece que é precisamente nisso que eles estão apostados, reféns que se encontram do sistema financeiro: uma coisa tremenda mas em cujo topo assentam os interesses de apenas meia dúzia de indivíduos a quem não sei se hei-de chamar pessoas.
São antes a cabeça da serpente. Sem ela o resto do corpo perde a pressão, alivia a tensão e aí, de repente, acabamos por descobrir que a pressão não é mais do que uma cadeia em que todos nós, apertados pelo anterior, vamos sucessivamente apertando o próximo.
Não é a cabeça que tem a força mas é ela quem ordena, e a força somos nós que paradoxalmente a usamos contra nós mesmos, como muito facilmente se vê pelos políticos que em vez de servir os interesses dos seus, servem os da máquina que lhes dá ordens...

7 comentários:

  1. As tuas imagens são sempre muito boas, Charlie.

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  2. Nada como um bom boneco para ilustrar uma ideia,né?
    Por isso mesmo anseio pelo Raim....sniff.... o que será feito dele???
    RAIM!!! PRECISO DE TI, MÉNI...:C

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  3. Por acaso não me referia à foto... e sim às imagens (metáforas,...) que tu usas nos teus textos.

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  4. e não é o mesmo....???
    A foto é apenas uma iconografia de uma ideia, uma espécie de chave para descompactar uma cadeia de pensamentos...

    POR ISSO.... TOU A PRECISAR DO RAIM... Nem que para isso tenha que ir fazer o SACRIFÍCIO de ir ai ao centro (do meio) para comer, (eu disse "comer" e não "cu-mer" Nelo melhér) um leitão ou dois com ele.
    (enquanto o bardo fica de boca atada e preso a um carvalho)
    Eu disse C-A-R-V-A-L-H-O, Nelo....)

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  5. Bem esgalhado, Charlie. Curiosamente li este texto apenas depois do outro, posterior, da Ana Andrade - o inferno não são os outros - e verifico que está tudo muito bem ligadinho.

    Les beaux esprits se rencontrent, já lá dizia o outro.

    E quanto a culpas, a este nível, todos as temos, de facto.

    E, afinal, quanto valem os bons dias no café do bairro? E a atenção do sr. Manel da Mercearia ao guardar-nos o pãozinho do dia? E a modista que acarinha a evolução das banhitas que o tempo nos agarra à pele?

    E trocámos isso tudo pelas catedrais alienadas do consumo, onde adquirimos sempre o que queremos e tudo quanto não quereríamos, se pensássemos duas vezes.

    E foi de quem a tal culpa?

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  6. Os patos somos nós.
    Os burros somos nós.
    ...

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