março 06, 2014

Eu não consigo - tu desconsegues - ela inconsegue...

No fundo, Assunção Esteves tem razão e reflecte, porventura através de reminiscências de alguma sua cultura germanófila, o que de mais hiperbólico (des)grassa em Portugal: o inconseguimento frustracional derivado da crise, articulado com o espasmódico facto da Europa não projectar para o mundo o seu soft-power sagrado.

O Miguel do fugaz e metafísico empreendedorismo, aliás, não se expressaria melhor, quiçá alicerçado no hard-power, ainda que não menos sagrado, que um outro Miguel, mas mais Relvas, lhe conferia, ao nível da protecção lombar.

No fundo e para além das grandes metafísicas, como sempre tudo se resume a sabermos quem detém o dinheiro e, assim, o poder. E, munido de tais virtudes, consegue, mais coisa, menos coisa, o que quiser.

Já a outra malta, com fundos de maneio ao nível de subcave húmida e bafienta de prédio manhoso, quando intenta perseguir algum objectivo, não consegue. Por vezes, até, apura que desconseguiu. E outras vezes, ainda, padece de inevitável inconseguimento.

Ontem mesmo tive oportunidade de assistir a um outro inconseguimento performativo de Assunção Esteves no momento luminoso do debate, com o Passos Coelho a fazer que amuava porque Catarina Martins afirmou, em preâmbulo às questões colocadas ao senhor primeiro ministro, que ninguém acreditava na palavra dele – coisa com que eu estou tentado a concordar.

Dúbia jogada, no entanto, apesar de eu ter apreciado sobremaneira a restante diatribe da dirigente do BE, a que Passos Coelho, embirrento e embirrado, decidiu fazer orelhas moucas. É que deu oportunidade ao homem para fugir com o rabo à seringa alegando o amuo. Eis aqui um outro caso típico de inconseguimento, pois o senhor primeiro agarrou-se a esta bóia argumentativa e pulou para fora da resposta que lhe era devida à Assembleia, aliás, como a toda a nação.

Assunção Esteves conseguiu, entretanto, inconseguir numa série sequencial de atitudes frustracionais, ao divagar por aquela tormenta espumosa, sem mão nem jeito, mormente para quem esperasse dela um magistério eficaz próprio de lugar de tal relevância. Que Diabo, afinal, sempre é um dos superiores quadros da nação...

E rematou a deriva, a modos que em tércio de bandarilhas, salerosa, com uma recusa – que bons são todos os nossos governantes na recusa… –, recusando ao BE a conferência de líderes extraordinária, por eles solicitada, face a tal gritante deficiência democrática.

Em boa verdade, esta ditadura do pêessedêriado – um presidente eleito, um governo não eleito, uma maioria de conveniência e circunstância, no fundo também não eleita, uma presidente da Assembleia eleita pelos seus pares e precocemente reformada, muitos analistas televisivos e ainda mais jornalistas da cor, também nenhum deles eleitos, nem sequer pela paróquia de cada um… – está a tornar Portugal tão idêntico ao pré-25 de Abril que eu já nem sei se esta gente quer comemorar os 40 anos de Abril ou… os 40 anos e mais alguns mesitos.

Se houvesse pão em todas as mesas e – vá lá, para empurrar… – um vinhozinho à maneira, todo este inconseguimento até seria, para o país que assiste a tal cavalgada do seu futuro em lastimável Rocinante, risível, ridículo, anedótico, larachoso, até. Assim – e lá tenho eu de dar razão à senhora presidente da Assembleia da Repúbica –, é tão-só mais um inconseguimento frustracional a acabrunhar ainda mais o nosso fulgor lusitano.

«Afinal» o nosso primeiro quer manter como definitivo o que cortou «provisoriamente» em salários e pensões, argumento com que torneou os tíbios escrúpulos do Tribunal Constitucional. Tudo a bem da «estabilidade orçamental», espécie de país das maravilhas onde apenas a seita, a seitinha e a seitona se governam, desde o empregozinho de conveniência até ao grande hipermercado..

O resto da malta, que se lixe, nas suas doutas e preclaras palavras.

Quando alguém o alerta para que, assim, essas suas palavras (dele) nada valem, o homem amua. E amarra o burrinho, como dizia a minha avó. Vá lá que ainda não fez uma perrice. Mas há-de fazer.

Os «seguros» – do Partido dos Seguros, claro – oficial e oficiosamente, aos costumes dizem nada. Aliás, solidariedade «à esquerda», não ocorrerá nem com algum milagre de Fátima.

E lá vamos, de inconseguimento em inconseguimento até ao soft power sagrado final, que deve ser a modos que um paraíso intermitente que só abre portas, de quatro em quatro anos, em período pré-eleitoral.

Pessoalmente já levo mais de 60 anos disto... Vejam lá bem: ainda nem tinha arrebentado o 25 de Abril, como diria, também, a minha avozinha, esse poço de sabedoria! Arre, porra que é demais, digo eu, para parafrasear um desabafo dos tempos da negra ditadura… O que uma pessoa atura!

24 comentários:

  1. "Vá lá que ainda não fez uma perrice. Mas há-de fazer". E ele conseguirá, acredite!

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  2. Pseudoreconheço que me omniescapam muitos desdetalhes para me metapronunciar...

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  3. Eu acho que deviam meter um pouco mais de tabaco naquelas coisas que andam por lá a fumar....

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  4. Ou se calhar, o que a gente deveria fazer era pedir uma passa naquilo....
    A ver se a gente fica ao mesmo nível do entendimento....
    ( porque na verdade, este nosso inconseguimento, dá -nos uma sensação de perda do soft-power sagrado e toda a gente sabe que não passamos sem o soft-power sagrado.. né??)

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  5. Não tentando não usar uma não linguagem não jurídica, não posso não dizer que não conseguiste não explicar e não expor o que de um não modo não claro e não explicito não querias afirmar! Os meus não parabéns!

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  6. Nota explicativa para os menos atentos acerca do comentário anterior: Se bem se lembram dos rudimentos matemáticos, "menos por menos dá mais", ou "duas negativas anulam-se e dão positiva"...

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  7. Eu quase inconseguia. Mas fazendo alguma força no soft power lá consegui desfrustracionalizar-me.

    Abençoada língua, que já foi má-, da sogra, de vaca, pátria pessoana... e, agora, sendo copulada por prefixos, sufixos, prenúncios e abrenúncios, acordos pancrácios e erráticos, ainda assim, em boca mimosa e de encantador sotaque transmontano nos permite aceder a novos enlaces, outros enredos, novas copulações, sei lá...

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    1. Ineu inestou inmuito infrustrado, imporque inas inminhas inafirmações innão inforam inentendidas... infogo!!!

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  8. "...copulada por prefixos, sufixos, prenúncios e abrenúncios, acordos pancrácios e erráticos, ..."
    Hahahaha

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  9. Certa altura, durante uma aula do Curso de Direito, o professor de Direito do Trabalho mencionou que quando tinha em mãos uma petição com texto rebuscado, sobremaneira, mas sem nenhum rumo, deixava de lado e pegava outra para analisar, que tivesse uma escrita mais simples, porém com clareza e objetividade. E dizia, ainda, qual é causa que terá mais êxito, inicialmente? O menos,por vezes, é mais.
    Advogados - mais comum nessa profissão -, inundam uma petição com palavras complexas e rebuscadas, para causar "boa" impressão. Ora, valha-me Deus! Se o direito é líquido e certo bastando, apenas, citar os fundamentos da legislação, que di per si já se torna incompreensível o não entendimento da compreensão, para que encher linguiça com vocabulário confuso? Políticos é que adoram injetar esses "charmes" em discurso, e o povo aplaude efusivamente sem nem saber o significado. Tal como acontece na efervescente troca troca de "elogios" entre eles.
    Confesso que estava digitando aqui meu comentário e fui reler o texto acima, mais uma vez, e agora bem centrada no que EU QUERIA, de fato, entender. E entendi (creio que entendi). Até entendi que o OrCa vislumbra, com a língua, copular. (vou ser riscada daqui, breve, breve rsss).

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  10. Ora, copular também significa acasalar, ter relações carnais. Se o link da entrevista foi para mim, desisto. Já me bastam as enrolações dos nossos, por aqui. Mas ainda a lerei - a entrevista - até mesmo para fazer um estudo comparativo. rss

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    1. Deslê. Não vais inconseguir.

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    2. Desde que não lhe falte um mínimo de softpower sagrado....
      Mas copular, que emerge precisamente da relação carnal, cresce e ramifica no nosso universo imaginário para outros significados...sem que a cópula deixe de estar efectivamente ali ao colher da mão. Como quem diz, ali a jeito....

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  11. O tal poder brando, ou soft power, como disse o Professor Nye, até pode manipular aqueles carentes de cultura, de pão, de educação... de amor próprio. Mas quando ainda existirem gotinhas sedentas de igualdade social, pelo menos, pelo mundo...vamos fazendo de conta que eles estão enganando muitos. No fundo, ledo engano de quem tenta enganar.
    Enquanto isso... vamos copular, e, se der, em todos os sentidos.

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    1. Copular ser bom é relativo. Como eu digo há muito, "nem tudo o que nos fode é erótico".
      E o Jorge Castro até fez um poema em que incluiu essa minha frase:

      http://sete-mares.blogspot.pt/2004/11/fundano.html

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  12. De fato, é relativo.E concordo: nem tudo.

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  13. E como nunca é demais enfatizar o belo e dar o seu ao seu dono, permito-me, apresentando desculpas pelo abuso, de colocar ao vivo e a cores o magnifico poema do ORCA a que se faz com grande oportunidade, referência nestes comentários.



    Aqui estamos uma vez mais reunidos
    Alguns mecos que dão corpo ao manifesto
    Talvez poucos, porventura, mas unidos
    Que dos outros nem reza a História, de resto...

    E embora sendo poucos, somos tantos
    Quantos somos e que ninguém se apoquente
    Que, afinal, nós seremos tantos quantos
    Os que formos a vogar nesta corrente

    Ao leitão, outra vez, à cabidela
    Ao vinho branco e fresco, e ao marisco
    E àqueles que não alcancem a gamela
    Mandaremos, por email, ar do petisco

    Esta é, companheiros, a Funda São
    Que só dá subsídios p’rò remanso
    E fundidos, refundados - porque não?...
    Nós cá estamos, p’lo Simões, no afundanço

    Celebremos, pois, amigos, a amizade
    Neste mundo a um passo do caótico
    Onde, por nosso grande mal, mas na verdade
    “Nem tudo o que nos fode é erótico!”

    Vai de erguer, com fervor a nossa taça
    Ao deus Baco e também à deusa Vénus
    À Afrodite, a Marte e à populaça...
    Nem tem jeito que o brinde seja por menos!


    Pois se é certo que esta vida são dois dias
    E que até um se perdeu já neste enredo
    Deixemo-nos de merdas e agonias
    E bebamos desta vida sem ter medo!


    ********
    Ergo a taça e espero pelas vossas, o brinde está certo.

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  14. Eu li o tal do inconseguimento, no blog do Katano.Putz! ainda bem que lá foi traduzido.
    Cacete! Que "dialeto" é aquele?"enrolês"?

    Entendo mais a língua falada pelos índios Kaxinawás, Yawanawás, Poyanawás, Jaminawás, Nukuinis, Araras e Kaxararistribo, do que mesmo da Excelentíssima.
    Perdão, deve ser o fato de que sou muito ignorante a respeitos de assuntos da Europa.

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    1. E tu achas que alguém, no seu juízo perfeito, entende os assuntos da Europa?!...

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