41,1% do universo eleitoral português considera que, porventura, a vida rupestre pode ser um desígnio de futuro a considerar. Dito de outra maneira, três milhões oitocentos e setenta e cinco mil e vinte e dois portugueses não sabem (ou não querem saber) que o são. Mais do que aqueles que votaram nos dois partidos com maior número de votos (PSD e PS).
Enquanto, em metade do mundo, pessoas (como nós) dão a vida para poderem alcançar esse direito/obrigação de exercício de cidadania, 41,1% dos portugueses eleitores consideram que o mais indicado é estarem-se nas tintas e amanharem a vidinha… ou deixarem-se emaranhar por ela, que vai quase dar ao mesmo.
A verdade é que esta malta não vota. Ou porque o seu sentido de nação se encontra diluído numa miríade de deformações filosóficas ou por mera incapacidade de estabelecerem meia-dúzia de ligações neuronais que provem, a si e aos outros, que ainda vivem, ainda mexem, ainda respiram e que o ser humano – qualificação ou epíteto em que eles ainda se integram, é um ser eminentemente social.
Ora, ao não querer assumi-lo, está voluntariamente a ostracizar-se, de onde decorrerá, por elementar evidência, que não andará cá a fazer nada, pelo que o seu suicídio poderá ser não mais do que a confirmação factual de uma realidade que de há muito os vitimou e sempre «desamparam a loja» para quem ainda busque oportunidades.
Confesso, por estas eventualmente duras palavras, que não consigo compreender esta atitude de demissão. Nem a aceito.
Poderei condescender, em exercício de cidadania, que o abstencionismo o seja por razões de saúde, de sanidade mental, de idade, até. Mas, nos dias que vão correndo, nem as razões profissionais podem ser invocadas.
Porque, em boa verdade, como pode o abstencionista – para quem é irrelevante ou indiferente quem presida aos destinos do SEU país – esperar que o carro-patrulha da PSP vigie a sua área de residência, ou pretender qualidade no ensino que é transmitido aos seus filhos, ou esperar o aconchego que lhe deve ser garantido na doença, por parte da sociedade em que se integra… se ele se demite e abdica dessa sociedade e, a fazer alguma coisa – como seja o pagamento de impostos – apenas o faz por obrigação e com constrangimento?
Como poderá esse presumível eremita – ainda que mantendo, tantas vezes, um notável sentido das conveniências, mormente as que lhe são convenientes… – esperar algo do Estado, quando abre, assim, mão desse derradeiro exercício da sua cidadania?
Esta é, para mim, uma manifestação de puro egoísmo exacerbado, uma «vingança» idiota porque vitima os que já são vítimas, a que só mentes tortuosas podem atribuir adjectivação de «rebeldia» ou «descontentamento».
A rebeldia ou descontentamento consubstanciam-se em actos. Ora, o que estas almas fazem é não-actos, se assim podemos chamar-lhes.
E amanhã? Mantêm a coerência e pespegam-se no meio da vida com algum estandarte que lhes confira dignidade de atitude e coerência e razão de ser de postura ou, muito ao contrário, correm ao postigo da primeira repartição pública em busca de algum ansiado subsídio, pelo qual estendem a mão bajuladora?
Rebeldes sem causa ou «não-me-comprometa» militantes, que querem eles da vida e dos outros?
Por estas e por outras é que eu considero que o voto deveria ser obrigatório ou, no mínimo, que fosse tornada pública, em cada freguesia, a lista de nomes dos não votantes e que alguma medida (ou conjunto delas) coerciva fosse assumida e contemplasse estes «rabos-enterrados-no-sofá».
«- Ah, nem sei em quem hei-de votar… Eles são todos iguais…». Mas, ó criatura, tu votas é em ti, na tua consciência, na expectativa de que, em determinado momento, tenhas de um mundo melhor, para ti, para os teus, mesmo que o «resto» não te interesse. E, nessa expectativa, o teu voto traduzirá o teu sentir.
E até poderá ser o voto branco ou anulado – houve 148.050 dos primeiros e 75.280 dos segundos, nestas eleições; como vês não estás sozinho… –, ou nos defensores dos cães ou nos perseguidores dos gatos, mas vota, porra!
Agora, que irredutivelmente não votaste, diz-me cá uma coisa, assim do fundo do coração: esse teu não-gesto serviu ou vai servir para quê?
Quando sairem os resultados definitivos, faço as minhas continhas para saber quantos lugares deveriam ficar vazios no parlamento.
ResponderEliminarÉ o maior sapo que tenho de engolir, desde que me lembro: a constatação de que vivo entre gente que não quer saber. Ainda não recuperei da supresa (juro que pensei que era desta que a abstenção seria vencida).
ResponderEliminarTu vives em Portutopiagal?!
ResponderEliminarAinda agorinha mesmo falei com alguém que me disse que não foi capaz de votar, porque «só vota esquerda» e não se revê em nenhuma desta «esquerda»...
ResponderEliminarNão encontrei melhor argumento do que perguntar-lhe: «- Então e se até nem concorresse nenhum partido 'oficialmente' de esquerda, nunca mais votavas? O exercício do direito de voto não é algo intrínseco ao cidadão democrata, independentemente de quem se apresente a sufrágio? E o seu não-exercício não abre caminho a que façam de nós o que quiserem, avalizados pela nossa demissão...? Eh, pá, isso não me parece nada de 'esquerda'.»
Ficou a olhar para mim... Mas lá conseguimos acabar o almoço, por entre perplexidades.
Deixa estar. Eu ouvi duas senhoras a dizerem que votaram no «Partido dos Animais e da Natureza» porque viram lá isso no boletim de voto e acharam muito fofinho...
ResponderEliminarEste "Tema" infelizmente não me dá pica nenhuma para tentar fazer textos irónico/satiricos...
ResponderEliminarEu tinha escolhido a "Teoria do Mal Menor" para votar, porque não descortinava a "Teoria do Bem Maior", mas às tantas até o do "Mal Menor" se baralhou, e olha... apesar de tudo penso ter contribuido para eleger algum deputado... não digo é de que partido...
Ah é verdade: Acho que não contribuí para a eleição do Presidente da Assembleia...
Eduardo Martins
Completamente de acordo, Eduardo. Este tema não é nada erótico!
ResponderEliminarProvavelmente, Sao...
ResponderEliminarProvavelmente, somos?
ResponderEliminarTambém eu engoli o Sapo, mas depois saiu-me um cUelho.... :(
ResponderEliminarOh... às tantas a abstenção é de 0,0%... e a malta que não vota está é toda morta.
ResponderEliminarEu estou morto. De vontade para emigrar.
ResponderEliminarEstás morto mas votaste?! Afinal, a abstenção real até foi negativa!
ResponderEliminarÉ issso! Shark, amigo, estás numa de emigrar? Carago, que eu estou contigo! Com a minha proveta (isto ainda leva «c» ou nunca levou...?) idade, só te peço que dês um amparo aqui ao velhote, não vá dar-se o caso de tropeçar no «salto». Mas que o dava, dava...
ResponderEliminarJá o Stau Monteiro dizia: «- Viver a crise...? O melhor é num país rico...».
Aprovêta...
ResponderEliminarPorque Votar, para políticos que no parlamento usar a abstenção como meio de não se responsabilizar na votação dos primeiros PEC, pois isso e que era cidadania!!!!!!!!! Pois o Povo e que e o mau quando não vota, e a cidadania dos políticos rufias mentiroso ladroes bandidos............nem todo o povo e a elite da nação, e nem tem que haver quem se acha o direito de julgar quem vota o não vota......
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