setembro 21, 2012

Alguma coisa está podre no reino dos Farilhões

Em Portugal, pelas mãos de sucessivas hordas de vândalos, suevos, alanos, visigodos, ostrogodos, americanos, chineses, abissínios, bosquímanos, trogloditas e outros especialistas em economia e finanças, enveredámos, manifestamente, pelo caminho do surrealismo sofismático, do «tromp-oeil» político, para dar assim uma de francó-culto, em pavilhão de espelhos deformantes, onde já ninguém sabe como é, como foi ou, até, se a verdade foi para o penico, como diria a minha avozinha transmontana, que a terra tem.

Se me quisesse aventurar pelo psicodrama do equilíbrio da balança externa, por exemplo, rapidamente concluiria, em termos de bom senso, que o que Passos Coelho preconiza e de que se vangloria – a diminuição drástica das importações com uma espécie de lógico desenvolvimento comparado das exportações -, mais não reflecte, afinal, do que a contracção violenta a que empresas e particulares se estão a sujeitar pela falta elementar e primordial daquela componente com que se compram os melões.

Ora, de cavadela, em cavadela, que é como quem diz de retracção em retracção, haveremos de chegar ao nirvana em que Portugal não importa nada… mas, se calhar, também já não existe e ninguém se importa com isso. Estaremos, talvez, na fase primordial de cada um plantar a sua couvita – coisa que tenho vindo a preconizar há já algum tempo, aliás – e regressaremos, todos, alegremente, ao estadio do bom selvagem, da aurea mediocritas de que falavam os antigos.

Porque a retracção do tal tecido produtivo que ocorrerá bastando-nos dois ou três anos de «não-importações», no que respeita a matérias-primas e outras minudências, deixará decerto este barco encalhado no lodo do cais, se não me levarem a mal a metáfora.

Entretanto, com a excelência de gestores a que temos direito, como poderemos estranhar a mera sugestão, lançada ontem mesmo para o etéreo azul pelo presidente da EDP, referindo-se à mal-afamada TSU? Pois, a TSU que deixa de ser paga pela empresa, mas que é garantida pelos trabalhadores, se for avante a proposta escabrosa do actual elenco governamental, e que no que à EDP respeita parece rondar os 10 milhões de euros anuais de poupança, poderá ser utilizado para atenuar o tarifário junto do consumidor!!!

Veja-se bem: no limite, menos de dois euros por consumidor, por ano. Eis aqui, seguramente, o Olimpo do neo-liberalismo, já alcandorado ao nível supremo do nonsense.   

É a aplicação do princípio preconizado por Passos Coelho junto de Belmiro de Azevedo para aproveitar os mesmos lucros potenciados pela mesma TSU para baixar o preço dos produtos alimentares na sua rede de supermercados, sugestão que eleva Passos Coelho ao nível de Soviete Supremo desta União das Repúblicas sem Segurança Social (URSS de novo tipo, claro).

Talvez a sugestão nunca veja a luz do dia, como tantos dislates que se avançam sem tento nem bola. Mas o simples e elementar facto de ela ter sido ventilada provoca-me um arrepio pelo espinhaço acima, que todo eu estremeço!   

E – vá lá saber-se porquê… – lá me ocorre aquela conclusão temível e inexorável de um velho de patriarcais barbas segundo a qual o capitalismo evoluiria, necessariamente, para o seu estadio supremo: o capitalismo monopolista de estado, que pressupõe ser o estado não uma emanação de nação e dos cidadãos que a constituem, mas antes o representante dos grandes interesses instalados.

Quanto aos Coelhos e Gaspares e Sócrates e Cavacos, dir-se-á, então, que estão todos no bom caminho para se alcançar esse patamar civilizacional. O que virá depois, eles não o verão. O que mais me chateia é que eu também não…

2 comentários:

  1. Esta malta faz-me sentir como se tivesse estudado Economia para nada. Trocam as tintas todas!

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  2. Um excelente texto como é apanágio do Jorge!

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