setembro 05, 2012

E se os CTT acabassem com o monopólio do Multibanco?

"Proposta manhosa" de Luís Miguel Sequeira no seu blog (alguns excertos, pois o texto completo é bastante extenso):

SIBS: Como lidar com o monopólio

"Como é sabido, a SIBS está a alterar as comissões sobre os processamentos das transacções via Multibanco. Ou seja: ao fim de duas décadas de confortável crescimento, em plena crise financeira (e social!), acharam por bem aumentar ainda mais os seus lucros — agora. Se a estupidez congénita dos banqueiros fosse tangível, poderíamos exportá-la e pagar à Troika o que devemos num instantinho. Assim sendo, tal como o nosso Governo com os impostos, a SIBS está a dar tiros no próprio pé com uma caçadeira de canos serrados.
As reacções não se fizeram esperar. Desde petições públicas a reacções da DECO e análises da Autoridade da Concorrência, a verdade é que a resposta do comércio é deixar de aceitar pagamentos por Multibanco. Isto, evidentemente, vai levar a SIBS a aumentar ainda mais as comissões para compensar a perda de dinheiro ou a inventar novos cartões para ganhar mais sem os utilizadores saberem.
Mas a verdade é que duvido que qualquer uma destas medidas surta efeito. Afinal de contas, não nos podemos esquecer que a SIBS é uma empresa privada num mercado livre: dificilmente vejo a possibilidade de se «legislar» contra uma empresa privada que não está a fazer nada de ilegal, está apenas a querer aumentar o lucro.
Bom, aqui é que a porca torce o rabo. É que é verdade que a SIBS é uma empresa privada, mas age em regime de monopólio. Não foi um monopólio concedido pelo Estado. Foram eles que inventaram um mercado novo que dantes não existia. É certo que muito no início, quando se deu a liberalização da banca, surgiram algumas redes concorrentes, como a Caixa 24 — que depois foi absorvida pelo Multibanco. Durante décadas, a Unicre, que tinha a representação dos cartões Visa em Portugal, operava a sua própria rede, e era assim uma «alternativa» — mas já há anos que tudo se «fundiu» na mesma rede.
Aquilo a que chamamos «Multibanco» não é apenas um conjunto de terminais ligados a uns servidores centrais da SIBS, sejam os ATMs, sejam os terminais de pagamento dos comerciantes. Vai mais longe do que isso: assegura todas as transacções electrónicas entre o sistema bancário português. E também interliga com o sistema de recebimento de dinheiro dos contribuintes por parte do Estado. É um sistema muito mais abrangente do que parece. Por isso obviamente que dificilmente terá concorrência.
Ora bem, quando uma empresa não tem concorrência… age em regime de monopólio. Em teoria, este tipo de empresas tem de ser muito mais regulamentada quanto às coisas que pode ou não fazer. Por exemplo, nos Estados Unidos, que tem uma das atitudes mais laissez-faire do mundo em termos económicos, permite quase tudo — excepto os monopólios! (...) Os monopólios são o cancro da economia de mercado livre… porque criam mercados onde a economia não é livre. Por isso, normalmente, são fortemente regulamentados. Em países menos liberais que os EUA, acaba por ser o Estado — seja directamente, seja por concessão — que «absorve» o monopólio para justamente impedir que os consumidores sofram do excesso da ganância dos donos do mesmo.
Idealmente, claro, não existiriam monopólios. Mas este não é um mundo ideal. Idealmente também, claro, a Autoridade da Concorrência limitaria a capacidade da SIBS em abusar do seu monopólio (como limita outras entidades), mas a SIBS é especial: é que todos os seus accionistas são bancos. E contra estes ninguém tem coragem para agir.
Num mercado mais livre, este tipo de anúncios — aumento de taxas e comissões com clientes como as grandes superfícies a prejudicar toda a gente — traria imediatamente o surgimento de produtos concorrentes. (...)
Ora como se pode então resolver este problema da falta de concorrência credível, sem intervenção legislativa que seria de dúbia legalidade num mercado livre? (...) Eu se fosse ao Vítor Gaspar convidava os banqueiros accionistas da SIBS para uma conversinha particular. E apresentava-lhes o seguinte problema: o Estado é um utilizador do serviço Multibanco. Milhares de milhões passam todos os dias pela SIBS, tanto para fazer pagamentos de salários, pensões e bolsas, como para receber praticamente a totalidade das receitas de impostos, segurança social, taxas, multas e coimas. Sobre tudo isto o Estado português paga toneladas de comissões — de certeza que muito mais que os cinco milhões anuais do Grupo Jerónimo Martins! Ora, no interesse em fazer contenção da despesa, o Estado português iria deixar de usar o Multibanco… passando a usar um sistema próprio.
Incrédulos, os banqueiros rir-se-iam na cara de Vítor Gaspar, pois o investimento numa estrutura paralela à do Multibanco custaria milhares de milhões e levaria anos, senão décadas, a implementar. E confiariam os portugueses num «ATM do Estado Português»?
Mas a verdade é que Vítor Gaspar não precisa de investir nada. É que o Estado português já tem um sistema paralelo em funcionamento. Na realidade, já o tem há alguns séculos: chama-se CTT.
(...) Ironicamente, os CTT não usam Multibanco, excepto em algumas (muito raras!) estações de correio. Uma vez perguntei porquê. Eles responderam que não conseguiam chegar a acordo com a SIBS àcerca das comissões. E para vender uns selos não compensava…
E, recentemente, também passaram a ser operador de email privilegiado do Estado para receber as notificações electrónicas.
Ora bem. Olhemos bem para isto. Uma entidade que já é do Estado, que está presente em todas as terriolas do país (Continente e Ilhas) — mas que estende a sua rede para fora dos seus balcões via PayShop. Todos os balcões, próprios e de terceiros, estão interligados informaticamente. Tem um operador móvel. Gere uma quantidade estupidificante de dinheiro que passa pela sua rede de balcões, e, além disso, emite «produtos bancários». Na realidade, muito antes de haver computadores nos bancos portugueses, já se podia enviar dinheiro pelos CTT: o vale postal existe há eternidades. Não são, pois, uns «novatos» a transferir dinheiro entre pontos remotos: já o faziam muito antes dos bancos saberem como. Ironicamente, no século XIX, os bancos usavam os CTT para transferir dinheiro via telégrafo instantaneamente: os CTT foram a primeira rede Multibanco do país para transferências bancárias
(...) Agora, humm, há apenas um pequeno probleminha. É que os CTT teriam de emitir cartões de pagamento e instalar terminais no Pingo Doce. Bem, nada mais fácil do que isso: o sistema PayShop (...).
A única coisa que lhes falta é um alvará bancário. Tal como acontece em montes de outros países da Europa, onde os correios são quase sempre um banco. É natural que assim seja: movimentam balúrdios e estão sob a alçada do Estado.
Por cá isso nunca aconteceu porque… os bancos não deixam. Se os bancos conseguissem acabar com os certificados de aforro, já tinham desaparecido há muito. Houve uma altura em que os CTT tentaram lançar alguns fundos de investimento, e a banca portuguesa caiu em cima e veio choramingar ao Governo a protestar pela «concorrência desleal». Os governos sucessivos sempre respeitaram essa choradeira e nunca fizeram mais nada. Os certificados de aforro só não desapareceram porque há centenas de milhares de portugueses que dependem deles para as suas poupanças. (...)
De notar que nada do que disse acima é ficção científica O Vítor Gaspar pode fazer isso; tem toda a tecnologia para substituir a rede Multibanco em pouco tempo. E se calhar nem precisa sequer de dar um alvará bancário aos CTT. O mais divertido de tudo é que nem sequer precisa de meter isto em prática: nesta altura do campeonato, um anúncio na imprensa de que o Governo português está a estudar montar a sua própria rede de pagamento de serviços, concorrente ao Multibanco, e baseada na infra-estrutura dos CTT, seria mais que suficiente para lhe dar a alavanca negocial de que precisa. É que não se pode «lutar» contra os bancos, nem se pode legislar contra empresas privadas a agirem num mercado livre, mas pode-se assustar os monopólios ameaçando concorrer contra eles…"
Luís Miguel Sequeira
Um blog idiota do Luís Miguel Sequeira

9 comentários:

  1. Pois.... só que os Bancos não são estúpidos; são ladrões sôfregos, insaciáveis até e tal como os parasitas, sacam tanto da sua presa que acabam por acabar com ela. (olha....será por esta via que são estupidos?)
    Ora bem, quem é estúpido de certeza é o nosso executivo. Estúpido e teimoso, Passos já repetiu veementemente que "nem mais tempo, nem mais dinheiro" que se deve traduzir por "mais porrada nos cornos dos contribuintes. Nesta medida, até concorrem com os Bancos em matéria de asfixia das presas.
    Quanto aos CTT, já sabemos que estes tontos estão a pensar em vender aos chineses, ou aos angolanos, ou aos colombianos, aí pela mesma pechincha com que tem despachado as outras jóias da coroa. Tudo em nome da agilização da economia, que coitada é tão estúpida que não percebe nada e está cada vez mais molenga e tristonha. Falta de insistência pensam o Passos e Gaspar:isto só la vai com uma boa dose cavalar. Toca a lançar a bomba atómica e privatizar de uma assentada todas as empresas públicas que restam, Tap por dois euros, as águas por três, as estradas, estradões, e veredas, tudo com portagens cada cento e cinquenta metros, cedidas a privados, cujas concessões saem por cinquenta cêntimos cada cem quilómetros. O ar, o ar puro é um bem, toca a privatizar e autorizar a empresa vencedora a lançar uma cobrança.
    Depois aí, passaremos de um país pobre e cheio de dívidas a país próspero, lançado que ficaria no pináculo da iniciativa privada.
    Ah... já me esquecia... o tema era o SIBS e o dinheiro que o Estado paga aos ditos pelas transacções. Pois ...os CTT seriam uma boa alternativa, mas entre os Xau-xau ou a cachupa fica pouco espaço para vales postais.
    Mas....Ai ai...como são estúpidos com esta coisa do SIBS e a sua prepotência...
    Este Estado...bastar-lhe ia cobrar-lhes uma verba de imposto sobre cada comissão cobrada.... no mesmo valor desta...fora o IVA. Isto resolveria tudo...não acham?

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  2. Mas os CTT vão ser privatizados, pelo menos parte, a que dá lucro.
    A banca quase conseguiu acabar com os certificados de aforro, pois os ministros das finanças vinham dos Bancos.O que ía dando a machadada final foi o Teixeira dos Santos.
    Agora e a partir de 1 de Setembro os certificados vão tentar a ter preponderância que já tiveram(ou quase), até que um próximo Ministro das Finanças venha novamente de um Banco!

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    1. E assim cá vamos nós, cantando e rindo...

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    2. ...em vez de ir berrando e atirando pedras aos cornos dos desavergonhados.
      A postura dos portugueses que já não acreditam nos politicos ajuda em muito a que estes façam toda a sorte de sacanices, ninguém liga, é tudo a mesma merda.
      A propósito, o que é feito da pedrada no charco? Jaime Ramos, where are you, man? We need something else and different, just for a change....

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    3. Charlie, quem sou eu para dizer algo, se passei várias vezes a poucos metros do PM na Mantarrota e... nada?!

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    4. Nem ao menos um "vai-timbora, malandro...!"?
      Ou uma passagem em tangente com um balde de areia cheio de peixes aranha acompanhado de um tropeção e interjeição competente a emoldurar o "porra, que já deixei cair um ..."?
      São Rosas, és tão púdica às vezes....
      Cacete, que se fosse o PM, sabes, o Paulo Moura, o PM na Manta iria ouvir das boas.
      Oó ó+ó se iria...

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    5. Quem me dera ser uma pessoa matulona...

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  3. tecnologia open source existe, legislação também (directiva serviços pagamento), falta capacidade de organização

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    1. Eu acho que faltam é tomates para a decisão de avançar.

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