outubro 01, 2013

A divinização do poder e a queda dos deuses.


...Não queremos ser obrigados a aceitar o que achamos inaceitável. E se nos obrigarem, a centelha de Deus que há em cada um de nós, é capaz de não gostar…
 

 


Surgiu-me muito a propósito deste post, colocado com toda a propriedade e sentido do oportuno, os considerandos que a seguir explano.

A ilustração que é repetida à direita no contexto da mensagem sobreposta, constitui mais do que um escape brejeiro; é um afloramento natural do mais profundo que existe no indivíduo perante a necessidade absoluta do viver em comunidade. A pulsão da afirmação tendencialmente infinita do “eu” versus a pressão de todos os outros “eus” que o rodeiam e que fazem parte do seu grupo leva naturalmente à limitação da afirmação individual colectivamente imposta.

Esta imposição colectiva não é porém equitativa, ou seja, os direitos de afirmação não são iguais para todos e obedecem a escalas, a hierarquias.

Nos tempos primitivos essas escalas eram impostas pela força pura e simples, e progressivamente com o evoluir das sociedades, mais e mais pela astúcia, pela sabedoria e pela experiência: um grande chefe guerreiro, já idoso era capaz de impor-se aos mais jovens e por extensão a toda a comunidade, pelas muitas batalhas vitoriosas ou caçadas proveitosas que se conseguiam sob as suas ordens. O velho chefe não caçava, não lutava, mas a sua palavra era determinante para o sucesso das operações e por isso, mais do que aceite pelos seus, vista como vindo de algo superior e tendencialmente sobrenatural. O património da memória de factos vividos em face aos que dessa memória não tem experiência, conduz facilmente à efabulação. Sem que o velho guerreiro fizesse fisicamente coisa alguma, a afirmação do seu Ser era positiva para toda a sociedade. As oferendas e víveres em sinal de respeito, agradecimento ou preventivamente como inspiradoras de bons augúrios estavam-lhe assim asseguradas. Estava-se no início da divinização do poder.

Vemos em todas as culturas como isso aconteceu mais ou menos de forma recorrente. Dos Faraós ao Rei-Sol das cortes Francesas pouca diferença prática existe. A evolução a partir da tribo no sentido da complexidade social necessária ao domínio de um grande território conduz a prazo à estrutura piramidal do poder e quanto mais junto ao topo, mais perto dos deuses e mais longe da base, do povo, se fica. 

No antigo Egipto, a divinização dos Faraós era determinante para a sua própria segurança. Tal como no feudalismo da Idade Média, o topo da pirâmide era constantemente ameaçada pela cintura imediata das estruturas do poder adjacentes. Se a distância de um poderoso em relação ao seu povo conduz com alguma facilidade à mitificação, por outro lado, só o isolamento imposto a partir do topo dá alguma segurança quanto à avidez dos que lhe estão mais próximos. Os faraós eram deuses e a partir daí tudo era possível. As grandes obras, certamente feitas com enormes sacrifícios individuais resultaram também da entrega do individuo, da base, ao seu faraó, ao seu deus, que todos os anos fazia a riqueza do vale do Nilo. O suporte mais poderoso na segurança dos Faraós, sendo eles Deuses, era assim o imaginário do seu povo.

Mas o que acontecia quando os tempos corriam a desfavor? A existência do chefe que já não aceita os víveres e oferendas, mas que as exige independentemente do volume das caçadas  ou das campanhas agrícolas? Um chefe que perde a maior parte dos seus na estratégia de uma batalha? Um chefe que conduz o seu povo, não à redenção mas à desgraça?

A História está repleta da essência da ilustração acima. Um chefe pode não prestar para nada e muito naturalmente deixa de ser aceite pelos seus. Mas o que acontece quando o chefe não tem qualidades de chefia e apesar disso se quer impor ? O que se passa com o individuo que se endeusa aquando do exercício do poder?

Muito naturalmente, a falta de astúcia conduz à regressão e é o velho e eterno destronar violento que emerge. Faraós foram destronados e assassinados. O mesmo aconteceu a Reis, Imperadores e em todas as eras. Na corte Francesa rolaram literalmente cabeças. Nas sociedades modernas civilizadas o derrube continua a ser violento o que não significa que tenha de ir ao limite da violência primitiva e física, embora o poder assente precisamente na imposição pela força física do acordo social.

Emerge assim a mensagem. Não queremos ser chefiados por quem não nos dá benefícios através da sua chefia. Não queremos ser obrigados a aceitar o que achamos inaceitável. E se nos obrigarem, a centelha de Deus que há em cada um de nós, é capaz de não gostar…

6 comentários:

  1. Parece-me que estás arreliadito, Charlie...

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  2. E se tu estiveres contentesãozinha, és sádica...

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  3. Sim, sim, Masoquices é contigo <:O)

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    1. Tu lá sabes, menina... tu lá sabes ;(calhava bem um bonequinho do diabo agora, ou do anjo, que no fim é o mesmo)

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