Tenho-me deparado amiúde com uma nova (creio que apenas para mim, pelo
menos em quantidade) estirpe de gente que se satisfaz com palavras. E não me
entendam mal, eu adoro palavras que constroem frases e dão voz a raciocínios e
adjectivam e se vestem de figuras de estilo. Adoro.
Mas não gosto de
gente que se basta com palavras, como se o que dissesse fosse maior do que o que
faz efectivamente (e o substituisse). Nesta categoria entram tanto
os-que-fazem-e-acontecem mas não passam disso mesmo (do dizer que farão e
acontecerão) como os que se convencem que o que lhes é dito ou que eles próprios
proferem é maior do que a realidade que vêem (aqui, os que, por exemplo,
engordaram dois quilos mas fazem de conta que não, se ninguém lho apontar, os
que passam fome mas dizem comer que nem bestas ou, pelo contrário, os que dizem
engordar "com o ar que respiram").
Entram igualmente os falinhas-mansas que
se transformam em cobras, convencidos de que os alvos do veneno não reparam na
metamorfose, bem como os que primam pela forma em detrimento do conteúdo.
E,
finalmente, os mais difíceis de identificar, porque estão por todo o lado:
aqueles que acreditam tão piamente no que dizem que só isso lhes chega - como os
que vão deixar de fumar ou fazer a tal pós-graduação ou deixar de comprar
roupa/sapatos/discos ou declarar-se ao vizinho ou saltar de pára-quedas ou os
que chegam a convencer-se de que são (ou foram) excelentes alunos e só não tiram
(ou tiraram) notas de excelência porque não se dedicaram. Estes nunca farão nada
do que afirmam mas comprazem-se na audição da sua própria voz e sentem-se o
máximo com as proposições (o que não é mau, porque dá pouco trabalho e ainda
menos chatice).*
Kant não dormia quando afirmou que "pensamentos sem
conteúdo são vazios e intuições sem conceitos são cegas": na integração do
binómio está a idealidade; na sua ausência, a manifestação de algo que
se situa ali entre a verborreia pura e a cobardia travestida de
armanço.
*todos nós já dissemos que faríamos algo que
nunca chegámos a fazer, seja por que motivo for; mas fazer da atitude uma
constante há-de prejudicar, em última análise, uma só pessoa: o próprio.
Não
temos pena.
Tu hás-de escrever um livro com estas lições de vida.
ResponderEliminarOs livros sobre senso comum (ou bom senso) nunca venderão, estamos todos convencidos de que já o possuímos em farta dose. :)
EliminarQuem te disse isso?!
EliminarÉ o que observo. Não o posso provar evidentemente.
EliminarO que queria dizer é que não entendo o que escrevo como "lições de vida", são apenas o resultado do meu olhar sobre a realidade e não passam de senso comum (tipo de conhecimento demasiado desprezado, porque achamos que nascemos todos com ele; e talvez nasçamos, em potência, mas nem todos fazemos uso dele).
Pronto. Chama-lhe... um livro de ajuda para pessoas em que a auto-ajuda não basta :O)
EliminarPois pois...
ResponderEliminarOs animais são todos iguais, mas há animais mais iguais do que os outros...