fevereiro 10, 2014

«A justiça será cega?» - António Pimpão

Antigamente – com isto quero dizer de há 40 anos para trás – o perigo para a democracia vinha dos quartéis, das casernas, havia o receio das fardas e das baionetas.
Hoje em dia, o perigo para a democracia está a crescer vindo dos palácios da justiça, das togas, dos agentes da justiça.
Ao menos, os militares assumiam-se, davam a cara, criavam ditaduras explícitas, governavam. Os agentes da justiça, pelo contrário, são mais suaves, limitam-se a empatar, a obstaculizar, a criar o ambiente.
A semelhança está em que não elegemos nem uns nem outros. Estão ambos acima de qualquer escrutínio popular ou outras formas de controlo.
Em reforço do que afirmo sobre a justiça, veja-se o caso das decisões judiciais tomadas ultimamente e que constituem clara invasão da esfera própria do governo, que nada têm a ver com a violação de preceitos legais, de que são exemplos mais recentes, citando de memória, o caso da estrada de Beja que o juiz mandou reativar ou a sanha da PGR a respeito dos quadros de Miró.
Além disso, a justiça funciona a ritmo de caracol, prolongando afrontosamente a tomada de decisões. E ai de quem a acuse disto: logo virão os seus agentes em defesa própria afirmando que a justiça tem o seu ritmo – o que até será verdade -, assim escamoteando que esse ritmo é sempre lento, sem o dever ou poder ser. E o pior é que, apesar do ritmo lento, as decisões, sobretudo dos casos mediáticos, têm sido sempre frustrantes: arquivamento por insuficiência de provas, por acusação mal formulada, por erros formais ou por prescrição. Isto depois de encherem as páginas dos jornais, de se terem feito julgamentos na praça pública e de se terem esturrado rios de dinheiro, além de se fazer perder tempo às inúmeras pessoas inquiridas.
Acresce que a justiça mantém sempre em mãos, sem os concluir, processos em que são referidos, suspeitos ou indiciados membros do governo, seja este qual for, a quem vão cozendo em fogo lento.
Não custa adivinhar que lá mais para a frente, para mais perto das eleições, virão a lume notícias sobre o andamento dos processos envolvendo Passos Coelho (Tecnoforma) ou Paulo Portas (submarinos), pelo menos. Claro que estes processos vão dar em nada, como habitualmente, mas funcionam como técnica de desgaste.
Da justiça se pode dizer, com toda a justiça, que é forte para os fracos e é fraca perante os fortes (apesar das ameaças).

António Pimpão

1 comentário:

  1. A Justiça até pode ser cega, meu caro.Mas tem um faro muito bom para "julgar" processos de quem tem recursos financeiros.
    Faço esse comentário no blog em "A Luta Pelo Direito", e a quem tu dar-me-ias imenso prazer em deixar lá seu ponto de vista.

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