março 17, 2011

Carta aberta aos que já não são

As certezas absolutas alimentam-se de caminhos, de palavras, de histórias, de vidas.

As certezas absolutas devoram-nos, sempre esfomeadas, - o estômago é infinito em incontáveis gavetas e capaz de um ruminar eterno de gaveta em gaveta - e deixam-nos paralisados, impenetráveis no nosso imbecil fascínio que blinda o que julgamos grande sabedoria das vozes dos ignorantes - esses loucos personagens menores em forma de ponto de interrogação - que podem tentar virar-nos os olhos noutra direcção.

As certezas absolutas são uma enorme redoma opaca engaiolada. Tão opaca que entramos e imediatamente surge o mais opaco e mecânico reflexo: fechamos a porta. Tão opaca que nem se vê mais mundo, portanto mais mundo nem existe. Tão opaca que nem vemos as grades da gaiola da redoma opaca engaiolada. Tão opaca que nem o som passa e eu não vou gritar por ti aqui fora se nunca te vejo entreabrir a porta.

As certezas absolutas alimentam-se de ti; agora, do que foste só sobram armaduras que protegem o que serias tu se tu ainda fosses. Falei com o homem. Respondeu-me a armadura. Pedi à armadura que me deixasse entrar. Respondeu-me que não havia para onde. Não falo com armaduras.

As certezas absolutas alimentaram-se de caminhos, de palavras, de histórias, de vidas; em troca deram-te armaduras que defendem vazios.

10 comentários:

  1. A única certeza absoluta que eu tenho - e desde criança - é que a matemática não é uma batata.
    De resto, "só sei que nada sei".

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  2. E quanto mais o tempo passa menos certezas tenho! E dessas, absolutas, que nos fecham em redomas opacas e nos privam de luz... não obrigada! Antes me quero despida e desassossegada!

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  3. As certezas absolutas são armaduras sem gente dentro... Vísceras, ossos, algum pêlo e muita massa muscular. Mas até os olhos são baços...

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  4. Cuidado Casimiro, cuidado...
    Parafraseava o nosso colega cobloguista recentemente.
    Eu, que não me chamo Casimiro, e se os houver por aqui, são benvindos, chateia-me mesmo deveras os tais detentores de verdades absolutas. E regresso ainda a mais um post onde as paredes de vidro eram a antítese da fortaleza rochosa e onde os sabedores de tudo chamaram de louco ao que saído da caverna tinha visto o mundo lá fora, a que os cavernícolas cheios de certezas chamavam de "lá dentro".
    A sabedoria dos que sabem tudo é mesmo uma caverna de estupidez voltada para o seu umbigo.
    E todos conhecemos essas pessoas. No fundo, cercam o Universo de certezas pois tem medo, muito medo da existência do infinito

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  5. Paulo, mas a matemática é a maravilha, é a palavra tão perfeita, tão exacta que sai número. :)

    Laura, despida e desassossegada emanas muito calor. :)

    Jorge, são olhos como os da minha Azul: "O brilho dos olhos era estranho, como se fosse assombrado pelo tom muito amarelo dos candeeiros que iluminam, em vão, estradas desertas há eternidades." :)

    Charlie, segundo me lembro, o que saiu da Caverna e ousou dizer o que viu, acabou morto. Cada ponto de interrogação será alvo de cacetada. :)


    Beijos

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  6. Miss, todos acabamos mortos... mas deves estar a referir-te ao Sócrates, que foi condenado à morte bebendo veneno (cicuta). Há quem diga que não, que foi atropelado por uma scooter.

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  7. Latu sensu! Eheheheh Queria dizer assassinado. Eu pensava que todos morremos mas nem todos acabamos. Kkkkkkkkkkk Uma scooter? Isso deve ter sido o nosso Socras. Kkkkkkkkkk


    Beijos

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  8. O único receio que tenho agora é possa algum dia vir a ter saudades do Sócras... :(
    (Cuidado Casimiro)

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  9. Charlie - Essa é que é essa!! :S

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