outubro 30, 2012

O compromisso das primeiras impressões

O que acontece é que, as mais das vezes, conhecemos as pessoas por meio de outras pessoas que, voluntariamente ou não, nos fazem saber como sentir em relação a elas: "fulano X é um porreiro, vais gostar dele", "sicrana Y é tão a tua onda, vão-se dar lindamente" ou, pelo contrário, "tem cuidado com W, não é de confiança", "Z é boa miúda mas, coitadinha, não deve nada à inteligência".
E nós alinhamos e fazemos coincidir as primeiras impressões reais que temos das pessoas com a imagem apriorística que nos ajudaram a construir, porque o ser humano é bicho de consensos e se puder concordar com as pessoas de quem decidiu gostar, bestial. E continuamos a jogar o jogo, durante tanto tempo quanto nos for possível, apreciando qualidades onde nos disseram havê-las, encontrando defeitos exactamente onde nos garantiram que existiam.
Até o dia em que já não aguentamos desculpar as idiotices de quem resolvemos que era boa pessoa porque escolhemos não pensar pela nossa própria cabeça (às vezes, um descansozinho cai bem). Ou até ao momento em que descobrimos que alguém de quem nunca permitimos aproximar-nos afinal é boa gente.
É por estas e por outras que perfiro formular as minhas próprias opiniões, consciente da formatação inerente ao facto de conhecer pessoas por meio de outras pessoas: tendemos a aplicar àquelas o juízo de valor que temos destas. Assim: se A namora com B e eu gosto de A, então tenho de gostar de B; se C fez mal a D e eu aprecio D, então C deve ser uma besta - e todas as derivações possíveis, a partir daqui.
Porque se trata de pessoas, não há linearidade. A minha amiga A, que eu adoro, pode namorar com B, que é um anormal (e não faz mal que eu não goste dele, não sou eu quem tem de gostar), e C tratou da saúde a D porque D mereceu (e D pode continuar a ser um porreiro ou, pelo contrário, D, de quem eu gostava, pode ser um perfeito idiota - há que aferi-lo absoluta e não relativamente).
Habituemo-nos a esta falta de sentido, porque o ser humano deve ser das coisas mais ilógicas que para aí andam.

5 comentários:

  1. Eu não sei se algum dia me habituarei...

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  2. A vida dos relacionamentos é como as carruagens dum comboio: embora na mesma viagem não podem ir todas junto à locomotiva

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    1. Com essa deste-me um nó...

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    2. eu em matéria de comboios já sabem, carruagem vassoura...

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    3. Depende do bilhete. Há lugares reservados...

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