outubro 31, 2012

Mudança de hora - o que fazer a seguir?

Recapitulando:
Em 2 de Abril de 2012, a Assembleia da República indeferiu liminarmente a nossa petição «Não à mudança de hora». Motivo: "a regulação da Hora Legal é feita a nível europeu, limitando-se Portugal a cumprir as Directivas sobre a matéria".
Apresentei ao Parlamento Europeu uma petição em tudo idêntica à que apresentei à Assembleia da República..
A resposta deles veio em forma de carta.
Pedi esclarecimentos e enviaram-me ligações para documentação diversa sobre este assunto.

Ora bem...
Estudando aquilo, constatei que houve em 2000 a «Proposta de
Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à hora de Verão (apresentada pela Comissão)
», refª 2000/0140 (COD). Alguns excertos:
"Foi realizado um amplo estudo por um consultor independente, seleccionado por concurso público (...) O consultor escolhido, Research voor Beleid International (RvB), teve por missão tomar em conta os diferentes estudos e conclusões dos relatórios existentes sobre a matéria, tanto no plano comunitário como nacional, inquirir especialistas dos diferentes domínios envolvidos e, por último, apresentar conclusões e formular recomendações, com base nas análises e exames realizados. (...) O estudo foi dedicado, portanto, a procurar, identificar e avaliar as implicações económicas e sociais positivas e negativas do regime da hora de Verão no conjunto dos principais sectores económicos envolvidos, tais como a agricultura, a indústria, o comércio, a banca, a saúde pública, os transportes, a segurança rodoviária e, ainda, o turismo e a ocupação de tempos livres."
Na área da agricultura, achei uma graça especial ao diferente comportamento das vacas, até de países vizinhos: "na Áustria, ter-se-ia constatado que a mudança da hora era susceptível de provocar infecções nas vacas leiteiras, devido ao atraso da ordenha, e que se traduziam numa diminuição da produção leiteira. Pelo contrário, na Alemanha, a maioria dos organismos consultados considerara que uma ordenha mais tardia não tinha qualquer impacto na saúde dos animais, mas apenas na vida dos trabalhadores, obrigados a levantar-se mais cedo para respeitar o biorritmo dos animais."
Mais lá para a frente, é abordado o tópico da saúde:
"A saúde constitui, sem dúvida alguma, um dos domínios em que a hora de Verão suscitou e continua a suscitar vivas discussões entre os apoiantes e os opositores do sistema".
"Biorritmo e sono - Acusa-se tradicionalmente a hora de Verão de alterar o biorritmo e de afectar o sono, especialmente o das crianças, dos adolescentes e das pessoas idosas. A literatura sobre este tema é abundante.
O estudo Beauvais, realizado por conta da Comissão em 1990, registara, por um lado, o aumento do número de consultas médicas nas duas a três semanas seguintes à mudança da hora e, por outro lado, constatara que a mudança era melhor tolerada no Outono. Por outro lado, o estudo observara uma pequena percentagem de aumento do consumo de tranquilizantes ou soníferos, enquanto a curva de consumo de outros medicamentos tendia para a baixa. O estudo concluía pela ausência de consequências sérias para a saúde e pelo carácter temporário e totalmente reversível das perturbações sentidas pelas pessoas. Outros estudos ou trabalhos, tais como o de Reinberg, cronobiólogo do CNRS, ou do Dr. Valtax, para a Academia de Lyon, em França, e o estudo de Hasselkuss, na Alemanha, chegaram a conclusões semelhantes às do estudo de Beauvais. Assim, são precisos entre um e sete dias para que a hora de despertar, a temperatura, o despertar e a qualidade do sono se adaptem à nova hora. As perturbações desaparecem, geralmente, ao fim de uma ou duas semanas."
"O Dr. Kerkhof, cronobiólogo na Universidade de Leyde, nos Países Baixos, dedicou-se a estudar a importância do sono nos acidentes, entre 1989 e 1995 (..): se é possível alterar facilmente a hora de acordar e de levantar, já o mesmo não acontece com o adormecer. Este é regulado por aquilo a que correntemente se chama o nosso relógio biológico interno, a saber, os ritmos circadianos. Este relógio impõe um horário para todas as espécies de processos internos e o seu ciclo é de cerca de 25 horas, o que significa que deve recuperar uma hora por dia. Assim, na segunda-feira, após o fim-de-semana, é preciso recuperar mais do que uma hora, porque a hora de adormecer e a de despertar foram atrasadas durante o fim-de-semana; Kerkhof defende que, quando a relação mútua entre os diferentes sinais (luz, trabalho, refeições, etc.) é alterada, o relógio interno é perturbado e leva vários dias a adaptar-se à nova situação, o que pode ter um impacto negativo momentâneo sobre a atenção e o humor. Esta teoria não pôde ser verificada pela análise."
"Por último, em matéria de sono, investigadores alemães observaram que são as pessoas com trabalho sedentário que se queixam de sentir mais fadiga de manhã. O grupo que devia aproveitar melhor a hora extra de Verão, graças aos fins de tarde mais luminosos, ou seja, a equipa da manhã, parece conhecer as maiores dificuldades."
"Influência na formação da melatonina - Recentemente, surgiram novos estudos, que trouxeram à luz o papel essencial da melatonina na função do sono. Esta hormona regula o sono, permitindo-nos levantar de manhã e adormecer à noite. Reage à alternância dia/noite. À noite, a quantidade de melatonina é 5 a 10 vezes maior do que de dia. A secreção da hormona começa cerca das 21h30, no Inverno, e das 23h30, no Verão ("hora solar"), atingindo o seu nível máximo às 2 ou 3 horas da manhã, para voltar a descer para o seu nível normal diurno cerca das 7 horas. Com o regime da hora de Verão, este processo tem início uma hora mais tarde, ou mesmo duas horas, em países como a Espanha, a França e os Países Baixos, que estão desfasados uma hora em relação ao fuso horário natural. Esta situação explicaria as dificuldades em adormecer, no Verão. Não sendo alterada a hora do despertar, o nível de melatonina é ainda elevado às 7 horas da manhã (5, pela hora solar, nos países citados), o que produz uma certa sonolência e uma falta de concentração susceptíveis de ter consequências no plano do desempenho intelectual, tanto no trabalho como na escola, bem como em matéria de segurança rodoviária. Esta tese é vivamente apoiada pela ACHE e a Associação belga contra a hora de Verão."
"Consultas médicas e consumo de medicamentos - O estudo Beauvais analisara, por seu turno, o número de consultas médicas durante as semanas próximas da mudança da hora, na Primavera e no Outono. Fora registado nas duas a três semanas seguintes à mudança da hora um pico de 10,9% acima da média da Primavera, e de 8,5% no Outono (...)"
"Saúde mental e humor - Alguns relatórios dão conta de uma «desordem afectiva sazonal» (DAS), de que sofreria uma parte da população durante os meses de Inverno. Esta desordem seria causada por um insuficiente estímulo luminoso do hipotálamo, que poderia conduzir a perturbações do sono, a sintomas de depressão e a uma alteração significativa dos níveis de secreção da melatonina. Recentemente, alguns trabalhos salientaram a importância da luz na saúde e no bem-estar. Foram realizadas pesquisas no hospital de Frederiksberg sobre o DAS e os tratamentos por meio de substitutos da luz do dia (...)"
"Saúde física - Especialistas recordam que o Sol favorece a assimilação da vitamina D, bem como a cura de determinadas doenças de pele. Chamam também a atenção para a incidência positiva da hora de Verão, ao oferecer a possibilidade de uma exposição mais longa ao Sol e à luminosidade do fim do dia. Por outro lado, o estudo ADAS havia já citado vários trabalhos que salientavam um aumento da prática de desportos de ar livre durante o período da hora de Verão. Essa prática é particularmente benéfica para lutar contra os efeitos negativos do stress e do sedentarismo e para prevenir, nomeadamente, a obesidade dos adultos e das crianças, bem como os problemas cardio-vasculares. Esta argumentação é partilhada por especialistas dos países nórdicos, que insistem na importância da hora suplementar de claridade para a prática de actividades ao ar livre, nos países onde as condições climáticas a tornam impossível durante uma grande parte do ano." [nota minha - é fácil: fixem a hora de Verão]
A proposta conclui, neste ponto:
"Embora constatem a multiplicidade de efeitos possíveis da hora de Verão, a maior parte deles ligados às dificuldades de adaptação do corpo humano, os especialistas reconhecem que, no estado actual da investigação e dos conhecimentos sobre a matéria, as perturbações sentidas são de curta duração e não colocam a saúde em perigo, devido à sua perfeita reversibilidade."

A Directiva 2000/84/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de Janeiro de 2001, respeitante às disposições relativas à hora de Verão, estabelece que "a Comissão publicará, no Jornal Oficial das Comunidades Europeias (...) todos os cinco anos, uma comunicação incluindo o calendário das datas de início e termo do período da hora de Verão para os cinco anos seguintes." E "a Comissão apresentará, até 31 de Dezembro de 2007, um relatório (...) sobre a incidência das disposições da presente directiva nos sectores envolvidos. O referido relatório deve ser estabelecido com base nas informações comunicadas por cada Estado-Membro até 30 de Abril de 2007. A Comissão apresentará, se necessário e na sequência das conclusões do relatório, propostas adequadas."

Em 23.11.2007, a Comissão Europeia publicou a COM(2007) 739 - «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social Europeu, em conformidade com o artigo 5.º da Directiva (CE) n.º 84/2000 respeitante às disposições relativas à hora de Verão». Nesta comunicação, além de resumirem o que já tinha sido dito na Directiva, apresentaram uma recolha de indicações dos estados-membros. Realço este ponto: "Nenhum Estado-Membro solicitou a modificação do actual regime. A maioria dos Estados-Membros sublinha a importância da harmonização do calendário da hora de Verão na UE, nomeadamente em relação aos transportes. A Bélgica pronunciou-se a favor da manutenção do actual regime ou, alternativamente, de uma aplicação da hora de Verão durante todo o ano." [nota minha - neste tema, sou Belga!]
Acrescentam também novos estudos em diversas áreas. No que diz respeito à saúde, apresentam... um arremedo de «estudo» que deveria merecer, no mínimo, um arremesso de uma tarte à cara de quem o fez, outra à cara de quem o enviou e uma terceira tarte a quem teve a lata de o publicar. Apreciem:
"Na Finlândia, em 2003 e 2004 dois estudos analisaram o impacto no corpo humano da mudança horária em Março, com base numa amostragem de 10 pessoas. Os estudos observaram determinados impactos no sono e no ritmo natural do corpo durante os quatro dias que se seguem à mudança horária. No entanto, os autores sublinham que os estudos não permitem tirar conclusões para o conjunto da população devido à pequena dimensão da amostra."
Divulgam ainda estudos de opinião enviados pelos Estados-membros:
"Na Estónia, uma sondagem efectuada em 2001 mostrou que o número de defensores e de opositores da hora de Verão era quase idêntico.
Na Lituânia, uma sondagem realizada em 2006 mostrou que 55% estão contra a hora de Verão e 32% a favor.
Na Letónia, foram organizadas duas consultas pela Internet em 2006, que revelaram uma oposição à hora de Verão de cerca de 60% dos participantes na consulta. Convém contudo sublinhar que este resultado não foi obtido com base numa amostra representativa da população, mas sim com base em pessoas que escolheram participar na consulta.
Segundo uma sondagem realizada em França pelo Instituto CREDOC em 2005, cerca de 2/3 dos franceses são favoráveis ou indiferentes à hora de Verão, ou seja, desde 1993 as opiniões favoráveis aumentaram 12 pontos, enquanto as opiniões desfavoráveis diminuíram de 13 pontos. No entanto, numa sondagem realizada pela SOFRES em 2002, 45% exprimiram-se em favor da hora de Verão durante todo o ano, 31,4% eram indiferentes e 26,3% opunham-se à hora de Verão.
Em conclusão, não se pode deixar de constatar que o número muito limitado de sondagens recentes sobre o assunto não permite tirar conclusões válidas, tanto mais que o grau de representatividade e os resultados destas sondagens variam consoante o país"
E ainda apresentam dados do Eurobarómetro:
"O Eurobarómetro de 1990 concluiu que o índice de satisfação era de cerca de 57,4% para o conjunto da Comunidade Europeia.
O Eurobarómetro de 1993 sobre a data de termo da hora de Verão indicou uma preferência do conjunto da população da Comunidade dos 12 Estados-Membros pelo fim de Outubro (54,5%), em lugar do fim de Setembro (38,4%), por conseguinte o regime actual."

Experimentem perguntar aos cidadãos da Europa se preferem o regime actual de mudança de hora ou que se aplique a hora de Verão durante todo o ano!

6 comentários:

  1. A mudança da hora não faz qualquer sentido. As coisas, os argumentos, em que se apoia são frágeis e inconsistentes.
    De positivo nada traz, e de negativo bastante, mas não o suficiente para deixar os ponteiros do relógio acompanhar lentamente os ciclos do sol.
    Ao saltar ora para a frente, ora para trás, não é o sol que se deixa enganar e não é a hora que muda. Somos nós que vamos no engano de acordar quando o corpo dorme e dormir quando os olhos ainda estão abertos. Os estudos peca por algo de fundamental quando dizem que o corpo se adapta: nada de mais falso. Na verdade um ponto fundamental que nos vem desde os primórdios da existência, é a noção inconsciente mas visceral do equilíbrio dos grandes espaços de tempo. Os equinócios, os solstícios, a noção de meio dia, são desde sempre momentos determinantes nas posturas comportamentais. O período antes do almoço e o depois do almoço tem como fulcro o meio dia. A modificação forçada desse momento é ainda mais grave para o organísmo do que propriamente o despertar forçado e o dormir adiado. Estes factos sabidos desde milénios são ignorados, minorizados em função de uma teoria de poupança que no fundo nada poupa antes pelo contrário, e que por isso urge dar andamento a todos os processos para que acabe e acabe quanto antes...

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    1. Acho que de pouco valem os nossos esforços dirigidos assim a eles, os que mandam. No fundo refletem a mesma postura que têm em relação a outros assuntos, nomeadamente a crise tremenda e sem fim pacífico à vista, deus Falo me perdoe que vejo um espectro de guerra a pairar de novo sobre esta velha Europa.
      De novo vem ao cimo a máxima de que o poder não se ganha mas se conquista. Quem tem o poder não o deixa facilmente e esta coisa de manter a mundança do horário é mais uma teimosia, a expressão de "quem manda somos nós". E mesmo que esteja provado que somos nos comportamentos muito mais dependentes das hormonas que o corpo produz em consonância com o ciclos do sol, do que propriamente da inteligência, nada faz estes gajos mudar a não ser que seja pela força. E como somos fraquinhos podemos é começar por fazer da fraqueza força e divulgar de forma intensa, sei lá , facebooks, mailings etc, mensagens curtas e bem estruturadas de forma a produzir uma inquietação, uma chamada de atenção: por exemplo o aumento de acidentes, o aumento de ataques cardíacos, o aumento de abortos espontâneos, o aumento da indicência de cancro etc. Alguém da Comissão Europeia já se interrogou por exemplo porque é que temos mais escorrências nasais pela parte da manhã? E de que forma a sincronia dessa função é importante para combater de forma natural as infecções respiratórias, virais ou não, gripes e constipações? O levantar e deitar a horas em que as funções do corpo não estão adequadas provoca doenças. Não custam milhões e milhões em horas de trabalho e desconforto? Ou serão os lobbies que sabem disto e à pala vendem à fartazana os anti-gripais e quejandos? As funções nasais não se acertam com a mudança de horário, mas isso é apenas um dos pormenores quanto à não adaptação do corpo ao relógio quando este depende sim, tal como em todo o mundo natural, do sol, do seu nascer, do seu zenite e do seu ocaso.
      Se um argumentário extenso e bem fundado com o que expuseste não faz efeito, nada fará. O caminho assim não é esse. Passa por aí, pelo fundamento científico, mas não irá trazer qualquer mudança se se limitar a o universo estreito dos que dominam o conhecimento e os que dominam tudo pelo poder. Temos que trazer então o poder à rua, à consciência de cada um para que assim a pressão seja visível e faça mexer os que mandam.

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    2. Pois... mas "a rua", viste a adesão que teve? A petição, ao fim de mais de 2 anos online, não atingiu as 300 assinaturas.
      E os meus amigos e colegas gozam comigo, por "andar a perder tempo com isto, quando há coisas importantes".

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    3. Pois, é verdade e tens razão ao afirmares isso, mas eles não sabem que quem tem razão és tu.
      No fundo, tudo isto tem a ver com a progressiva alienação e afastamento do Homem do seu meio-ambiente e de todo um conjunto de valores que na verdade são os que suportam todo uma arquitectura relacional de que o homem moderno se arroga estar liberto. Desconhecem que não é a mesma coisa tomar uma decisão às nove, ou às onze da manhã. Não só por si mesmo, de quem decide, mas também por quem fica a montante e a jusante da expressão da vontade do indivíduo dentro de todo um contexto de variáveis, entre as quais as mais importantes é precisamente a hora do dia.
      As velhas religiões conheciam bem todos os segredos das estações do ano, das fases da lua, das horas do dia.
      Assim sendo, mal acabe esta tarefa (tu sabes) que me tem consumido todas as horas livres e têm sido tão poucas... vou assumir a obrigação de encetar uma quantidade de textos devidamente fundamentados de forma a dar a minha modesta contribuição a esta causa, e divulga-los por todos os meios.
      A ver se a rua a pouco e pouco acorda do marasmo e do deixa-andar....

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